“Vou ter que ser o coordenador de mim mesmo.”
Lula, segundo assessor da presidência
De tanto desperdiçar o presente negando o passado, Antonio Palocci tornou-se mais um petista sem futuro.
Josias de Souza
Karl Leite
Cruz da Bica
MULHER DE LOT
Nossas bocas se tocaram
Assim de repente
Que gosto tinham?
De tudo um pouco
Agonia
Arrependimento
Audácia
Curiosidade
Delírio
Distância
Saudade
Tranqüilidade
Sabendo do perigo
Mas assim mesmo
Olhei para trás
Petrifiquei
Deborah Milgram
BABUSKA
Sua fonte inesgotável
Alimenta prazerosamente
os vencidos
os cansados
os orgulhosos
os perigosos
os inocentes
os mal amados
os egoístas
os socialistas
os patéticos
os poéticos
os estrangeiros
os potiguares
os antiquados
os modernistas
os sonhadores
os trovadores
os organizadores
os sistemáticos
os decadentes
os paparazzi
os violentos
os ganhadores
os bobos
os ninguém
os todos
amém!
Deborah Milgram
BRINCADEIRINHA
Sem motivo AMOR daçada
Sem aviso AMOR tecida
Puramente AMOR talhada
Sem razão AMOR rinhada
Sem argumento AMOR nada
Seriamente met AMOR foseada
Deborah Milgram
TUDO NADA
O dois que ora divide, ora duplica.
O fogo ainda arde e é já fumaça.
O amargo a mesma língua dulcifica.
Nem sempre o sempre é muito — tudo passa.
O último leitor se chama traça.
O tempo doutros tempos se edifica.
A boca que diz fez dizia faça.
O sempre morre o sempre — nada fica.
Somente quando tudo se erradica
e faz-se do vazio a argamassa,
o sempre se diz sempre — tudo fica.
E aos olhos tudo o mais será mordaça.
E à fala nada mais se clarifica.
E ao sempre sempre o sempre — nada passa.
Antoniel Campos
QUANDO SE ACABA O TEZÃO
Nem ostra, nem catuaba,
nem caldo de tubarão,
culhão de touro ou pirão,
nem mesmo, uma caldeirada;
vai levantar a "finada",
que vive olhando p'ro chão.
Nem pentelho de barrão,
lhe digo, na minha verve;
isso de nada lhe serve,
QUANDO SE ACABA O TEZÃO...
Bob Motta
REMÉDIO PRA SUBIR PAU
Seu dotô, aqui no mato
Tem remédio perparado
Para pau amolecido
Pra pinto véi arriado
Pra mulé num se queixá
Pra madeira levantá
E resultado tem dado
A mulé de Zé Tomaz
Só anda agora se rindo
Pois o Zé tomou um gole
Pois o pau tava caindo
E ela foi quem me disse
- Eu queria que tu visse
Zé agora anda tinindo
Vou ensinar pro sinhô
Cuma é que o cabra faz
Pro pau não esmorecer
Pro véio ficar rapaz
Pro pau nunca mais cair
Anote pois eu não vou repetir
O cabra pega Jurema,
raiz de Urtiga Branca,
Quebra-pedra, Vassourinha
Xanana, Flor de Jucá
Babosa, Pereiro Branco
Quina-Quina, Mulungu
Velame, Casca de Ameixa
Resina de Catingueira
E a casca do Cumaru
Xique-xique, Macambira,
Oiticica, Juazeiro
Flor de Sabugo, Amargoso
Preto Angico, Baraúna
O sumo da Craviúna
a raiz da Cerejeira
Pau de mastruz, Umbuzeiro
Três de folha de Gameleira,
Semente de Trapiá
Uma Cabeça de Frade
Leite do Aveloz e raiz de Jatobá
Pila tudo piladinho
Cuma se fosse Cominho
Numa bacia de barro
E pra ficar mais sacana
Bote mei copo de cana
E pode empurrar o carro
Toma três gole e tá bom
A bicha fica no tom
Todo mundo que tomou
Ficou bom e aprovou
A bicha fica de pé
É tiro e queda
Se não der certo cum tu
O jeito é tu dá o c...
Fazer papé de mulé
Paulo Varela
COIMBRA EM JUNHO
“Matei a saudade que tu perdeste.”
Coimbra consegue viver no presente. Agostinho já enunciava, antes das obras manuelinas que hoje enchem-nos a vista, sobre a fusão entre as esperanças e as lembranças no tempo em que o eu vive.
Nisso, Portugal parece apreender e conseguir, didaticamente, nas suas calçadas, paredes e detalhes, mostrar, numa perfeita fusão arquitetônica, esse ideal, construído num passado desta terra de navegantes, que se perpetua e permite a escolha de cada um pelas lembranças ou pelas esperanças.
Diz-se que às primeiras pertence o fado conimbrincence, repositório da saudade que não cala naqueles que a busca de si, da verdade que somos, distanciou daqueles que não somos, daqueles onde nos vemos, daqueles onde nos distinguimos e que apenas neles nos conhecemos. Então, longe de si. Então, a inexplicável partida para longe em busca do que está perto. Então, a perplexidade. Daí a saudade.
Seguindo do Largo da Portagem em direção à praça 8 de maio, um rápido suspiro guia o olhar para o arco da Almedina, antiga porta medieva das muralhas de uma cidade que mesmo desaparecida ainda existe. O largo a seguir se descortina em cada esquina, como se estivesse a se desdobrar e curvar o olhar do transeunte incauto. Para o alto, muralhas parcialmente enterradas mostram sua presença e as pedras cuidadosamente chantadas no chão mostram o caminho para uma seqüência de ruelas que culmina com o esplendor opaco da Sé Velha.
Mas o som guia os passos de quem, sem fôlego, tem os sentidos cegados pelo recorte que as torres da Almedina fazem na cartolina escura do céu.
No caminho, crianças singram o frio vento noturno, jogando bola entre as barras de um andaime.
À frente, um coral entoa fados e antigas canções para menos de duas centenas de privilegiados espectadores no adro da Santa Cruz. Sob o arco de sua entrada, canções e sentimentos são desfiados para exultação geral. A fonte central do largo, providencialmente desligada e impedida de competir em seu espetáculo de movimentos, serve de arquibancada para os que excedem à quantidade de cadeiras disponibilizadas.
Ao final, um rápido percurso em sentido inverso, por sobre a ponte de Santa Clara, leva até uma visão ímpar da cidade, onde, no dia seguinte, uma apresentação de ranchos folclóricos vai mostrar a origem de tudo. Levas de portugueses, cada um a seu turno e trajando roupas representativas de diversos tipos e estratos sociais de épocas passadas, executam o “changê”, passeio na roça, túnel, “balancê”, “x” a galope, rodas e passos outros, que, com perfeição, representam nossas quadrilhas juninas, neste mês de santos populares.
Numa bem executada contradança e em italianas quadrilhas, o ritmo, por vezes nordestinamente brasileiro, é executado por sanfona, triângulo e caixa. Não faltam guitarras acústicas dos mais variados tipos e instrumentos típicos.
A noite conclui sua visita guiada com uma suave taça de vinho verde.
Fabiano Mendonça
“É reduzir-se em demasia a inteligência dos brasileiros imaginar que será bastante dizer que os milhões não foram distribuídos a parlamentares, mas sim corresponderiam a caixa dois de campanhas.”
Do relatório da CPI dos Correios
"A continuar como estamos, corremos o risco de estabelecer uma cultura da corrupção. Enquanto a impunidade reinar, a corrupção crescerá."
Do relatório da CPI dos Correios
Orf
Esse Deus
Essa grande invenção
Tão confortante
De ancestrais
Leva além
Traz aquém
De todo limite!
É implosão
Explosão
Buraco negro
Pulsar...
Eduardo Alexandre
O livro perdido de Silva Mello
Em fevereiro de 1972, no auge da ditadura militar brasileira, o médico e escritor mineiro Antonio da Silva Mello era o membro mais velho da Academia Brasileira de Letras, quarto ocupante da cadeira 19 fundada por Alcindo Guanabara, tendo como patrono Joaquim Caetano e hoje ocupada pelo carioca, outro Antonio, Carlos Secchin.
Sem medo da censura ou de pressões eclesiásticas, Silva Mello cavou naquele tempo alguns poucos espaços na mídia para reivindicar o direito de publicar um livro, na verdade um estudo, sobre a mania da raça humana em inventar deuses e religiões como ilusória proteção à sua própria insignificância e solidão no contexto do Universo.
Autor de grandes obras científicas, referência mundial nos seus estudos sobre a medicina, o filho de Juiz de Fora foi boicotado naquele ano por editoras como a José Olympio, que não queria entrar numa enrascada de negar a existência do deus cristão, da Civilização Brasileira, que diante da conjuntura negativa argumentou não estar editando muita coisa mesmo.
O autor procurou também a Melhoramentos, que achou o subterfúgio de só viabilizar a publicação com a ajuda do Instituto Nacional do Livro, àquela altura dominado pela vigilância militar. Amigo da diretora, Silva Mello preferiu não constrange-la numa possível situação de protesto dos agentes da repressão.
O escritor morreria no ano seguinte, 1973, aos 87 anos, sem conseguir oferecer ao País sua tese oriunda de reflexões filosóficas, físicas e biológicas. Se chamaria "Eu no Universo", um título aparentemente pretensioso mas que o mineiro explicava ser de "uma humildade sem nome", afinal o eu em questão era o homem, a raça terrena.
Soprando poeira durante o final de semana nas estantes da minha coleção de quadrinhos, dei de cara com uma página de jornal, sem identificação, dobrada no interior de um "Almanaque 1972 do Batman". Como naquele ano minhas atenções só estavam voltadas para a "Mini Copa" da ditadura em homenagem ao sesquicentenário da independência, suponho ter sido meu pai ou meu irmão que arquivou o material.
Um dos pouquíssimos brasileiros que gozou da amizade com Albert Einstein, Antonio da Silva Mello foi um dos maiores médicos do País e destacado professor, ensaísta, gastrônomo e filósofo. Guardo dele uma obra de 1953, comprada em 1985 no Sebo de Elite, de São Paulo, chamada "Nordeste brasileiro - estudos e impressões". Quem leu identifica que ele bebeu nas fontes de Câmara Cascudo e Gilberto Freire.
No livro perdido citado naquela quase perdida entrevista de 1972, ele comenta sobre a obra: "nós estamos completamente perdidos dentro do mundo. Não entendemos nada de nada". E fazia uma analogia entre o homem no Universo e um gato numa biblioteca: "o gato conhece a biblioteca a fundo, todos os seus recantos, mas não tem a menor idéia do que seja uma biblioteca, nem para que ela serve".
Sempre comunguei com a tese de que há uma cultura enviesada quanto ao sentido da criação em se falando de filosofia e religião. O homem não foi criado por deus, mas sim criou deus como um salvo-conduto prévio e ao mesmo tempo uma carta de seguro ao incerto futuro. Silva Mello diz "para nos sentirmos importantes, acabamos criando deus e as religiões", e acrescenta "a religião tem causado prejuízos horrorosos, veja aí a Bíblia, um livro escrito por homens mas adotado como modelo divino".
Quando assumiu a Academia Brasileira de Letras em 12 de abril de 1960, sucedendo Gustavo Barroso, Silva Mello galgava o olimpo dos imortais respaldado por uma vasta obra de grande referência nacional e internacional. Pesquisou e escreveu sobre nutrição, metabolismo, epidemiologia, nefrologia, gastroenterologia, psicologia e psicanálise. Um livro sobre efeitos biológicos da radioatividade teve repercussão em todo o mundo científico.
Foi o fundador da Revista Brasileira de Medicina em 1944, durante a Segunda Guerra, e permaneceu seu diretor científico até o dia da sua morte, em 19 de setembro de 1973. Ainda sobre aquele livro que parece nunca ter sido editado, o escritor dizia na entrevista que "o homem é um animal com todos os instintos animais: o de conservação e o de procriação, mas tem complexo de superioridade, quer ser importante no contexto universal, e isso já é o trabalho da razão, a razão que está nos arrasando".
Se alguém por acaso tiver notícias que o livro "Eu no Universo" chegou a ser resgatado após a morte de Antonio da Silva Mello, por favor avise. Mas antes faça a leitura do mesmo, antes que ditadores e pastores modernos lancem mão dos novos métodos de censura e evitem mais uma vez que um pensador filosofe a respeito da inexistência de deus e da pequenez do homem, seu criador.
Alex Medeiros
"Se for necessário para as investigações, podemos pedir que o ex-ministro seja proibido de sair do país."
Benedito Antônio Valencise, delegado titular da Delegacia Seccional de Ribeirão Preto
"O caseiro Francenildo dos Santos Costa está longe de ser a única vítima de violação criminosa de dados sigilosos sob proteção do Estado. A Corregedoria da Receita Federal investiga um caso envolvendo o acesso irregular aos dados fiscais de cerca de 6.000 pessoas físicas e jurídicas. A lista de vítimas inclui juízes, desembargadores, jornalistas, empresários e autoridades do governo."
Josias de Souza, nos Bastidores do Poder - Folha Online
Hugo Macedo
Sol por trás de Lua negra
Cá embaixo, a estrela dos Reis
Branca
Em Pedra e Cal
Entre a imensidão do mar
E o infinito do firmamento
A grandeza de um astro rei engolido pela Lua
Logo ela, solitária fêmea
pequenina e bela:
Negra
Sem luz
O dia que já era claro
fez-se quase noite
E as estrelas voltaram ao céu.
Eduardo Alexandre
Lacerdinha em tour pela cidade
Outro dia, resolvi sair do meu galho, ainda cheio de confetes jogados por Dunga, na Praça André de Albuquerque. Estava sem graça de ir para o Beco. Queria ver novos horizontes e resolvi descer para a Ribeira "velha de guerra". Resolvi que iria tomar umas três cervejas lá na Peixada Potengi, e pensei: "é capaz de eu encontrar o cineasta Lula Augusto, para, "além do Beco", colocarmos a conversa em dia. Quem sabe, falar de Palocci, da política econômica de Mantega, do caseiro, etc.
Acontece, que quando eu comecei a descer a ladeira da Avenida Câmara Cascudo, veio uma ventania de arrepiar. Me levantou alto e somente por milagre eu não caí nas águas sujas do Potengi amado de Newton Navarro. Subi tão alto, que entrei pela janela da Prefeitura, que estava aberta - justo no gabinete do prefeito -, que, em meio a um redemoinho de papéis, olhava para o nada, com aquele jeito distante que ele tem, sorriso de campanha no rosto, pensamento distante, a cabeça torta para a direita.
Aí, eu gritei:
- E aí, Táta?
E não é que ele respondeu? Sem olhar para mim, foi logo dizendo:
- Aquelas pesquisas estão erradas. Eu sou é popular! Muito!
Mas nem deu tempo de bater um papo com ele, porque o vento me levou em direção à Capitania das Artes. Era um vento tão forte que eu emburaquei pela janela e fui bater num pátio onde tinha uma ruma de menino aprendendo a dizer "brurrarrá".
Uma mulher gritava:
- "Brurrarrá"!
E a turma respondia:
- "Brurrarrá"
Uma beleza! Quando passei por cima – no meu vôo acidental –, provoquei:
- "Tá melhor! Tá melhor! O Rio Grande do Norte tá melhor!" - bem alto.
E sabe o que aconteceu? Todo mundo estirou o dedo para mim.
Bom, eu queria ir para a Ribeira, mas o vento me deixou lá nas Rocas. E, aí, eu pensei: como é que eu vou voltar? Do tamanho que eu sou, vou levar um mês!
Mas como sou sortudo, peguei carona num vira-lata que estava indo para a cidade. Ele nem notou e a única parada foi para comer um cadela sem-vergonha que estava fazendo ponto na esquina da Tavares de Lyra. Aí, fiquei enjoado com aquele fuque-fuque e com os músculos doídos porque tive que fazer força para me agarrar nas costas daquele tarado, que sentiu prazer bem umas três vezes.
Quando cheguei em Nazaré, só tinha Alex Gurgel conversando com Seu Milton. Falavam sobre o amor e Milton estava dizendo que ía comprar um buquê para Naza e escrever um bilhete.
Com os olhos revirando em direção ao ventilador, ele disse:
- Vai começar assim, com o título: "Uma fulora do mato para uma dama linda".
Aí, Alex não se agüentou e corrigiu:
- Fulora não, seu Milton. Flor, que fica mais bonito...
Humilde, ele concordou na hora, completando:
- Você veja o que é a natureza... Ultimamente, o povo anda errando é muito nos títulos, mas não tem nada não, que eu ia levar para aquele menino careca, corretor de imóveis, que mora lá no Tirol. Ele sabe um português danado!
Alex ficou confuso:
- O careca que mora no Tirol é Dunga. E ele também vende imóveis?
- Foi você quem disse na Internet – retrucou o apaixonado Milton, com olhar de quem não está entendendo mais nada.
Fícus Lacertae,
Do Galho da Imprensa
ACHADOS E PERDIDOS
Leve-me daqui
Seja no tempo
Seja no sonho
Seja no sono
Seja no outono
Deixe-me aqui
Seja sozinha
Seja perdida
Seja contida
Seja esquecida
Beije-me
Seja na cara
Seja na praia
Seja na cama
Seja na boca
Diga-me
Sua verdade
Sua mentira
Mesclados ao verso
Que de todo me fascina
Deborah Milgram
VIDE-BULA
Natural
Essa sede de pertencer
Natural
Essa fome de entregar
Natural
Esse prazer de conhecer
Natural
Essa sabedoria de amar
Matem a sede
Saciem a fome
Deliciem o prazer
Aprendam a amar
Deborah Milgram
AVIDEZ
E eu que imaginava
estar chegando ao fim,
tu vens e inauguras
outra vida em mim.
Francisco Alves Sobrinho
PÁSSARA
Uma fêmea
de hímem-fogo
aninhando-se no ventre
da noite.
Francisco Alves Sobrinho
SAMBA
Inscrições de Chapas só até amanhã
As inscrições para a eleição da Diretoria Executiva da SAMBA – Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências, triênio 2006/2009, encerram-se amanhã, 30 de março, até às 20 horas, improrrogavelmente.
Os interessados podem deixar envelope lacrado contendo a formação da chapa concorrente “aos cuidados da Pré-comissão Eleitoral”, no Bar de Nazaré, à rua Cel. Cascudo, 130, Cidade Alta ou diretamente com os integrantes da Comissão: Oswaldo Ribeiro Filho, Plínio Sanderson Saldanha Monte ou Leonardo Sodré de Siqueira.
No documento, a chapa deverá indicar um membro para compor a Comissão Eleitoral que presidirá o pleito e que será formada no dia seguinte ao término do período de inscrições de chapas, ou seja, a 31 de Março do corrente mês. A Comissão Eleitoral, composta pelos membros indicados pelas chapas concorrentes e um membro indicado pela Direção Executiva da entidade, será formalizada no dia 31 de Março, no Bar de Nazaré, para redigir e tornar pública a Convocatória da Eleição, estabelecida para o sábado, dia 29 de Abril, entre as 10:00h e 17:00h.
Paixão silenciosa
Meu filho Pedro me confidenciou que está apaixonado por N..., ora, que tolice a minha, eu estava prestes a revelar o nome de sua amada e ele me pediu segredo... Sei que sou um privilegiado por ter tal informação, afinal, este amor é um segredo de estado, como, aliás, o são todos os amores na infância. Perguntei a Pedro se N... sabe de sua paixão. No alto de seus nove anos Pedro arregalou os olhos e respondeu indignado: “Claro que não! Ela jamais poderá saber disso!”.
Antes que eu questionasse a razão de uma paixão na qual o objeto do sentimento não poderia saber de sua existência, lembrei da minha infância, das paixões igualmente secretas e silenciosas que cultivei. Por quantas meninas não me apaixonei no primário nos idos anos oitenta, quando estudava no Colégio Maria Auxiliadora nos bons tempos das irmãs Brígida e Reuzuyta? Lembro pelo menos de três cujas imagens me acompanharam ao longo dos anos e cujos nomes omitirei por discrição e cautela, que, como caldo de galinha, mal não faz a ninguém.
Ah, aquelas paixões... eu me contentava em ficar na sala de aula olhando para as amadas... Quando alguma delas vinha falar comigo eu tremia, balbuciava frases desconexas, para usar de um termo popular, chulo e exato, a verdade é que eu me cagava todo! Na época eu não sabia quem era Platão, mas minhas paixões eram todas platônicas. Pelo menos Pedro é mais extrovertido e despachado do que eu era. Ele brinca com as meninas, conversa, só não quer que elas saibam que ele está apaixonado. Ainda questionei com Pedro se era possível se apaixonar aos nove anos...Ele me respondeu com um olhar enviesado e um meio sorriso como se dizendo “Como se você não soubesse, pai, que é possível se apaixonar em qualquer idade...”. Continuem a matutar sobre a paixão...talvez as crianças estejam certas em não desejarem que o alvo da paixão saiba o que se passa conosco. Paixão não é amor, paixão passa rápido, vai embora. Conheço pessoas que estão loucamente apaixonadas por alguém em um determinado dia e na semana seguinte já estão se apaixonando por outra pessoa.
Talvez o grande barato da paixão seja justamente esse, curtir o sentimento sem que o alvo da paixão saiba. Vai ver é por adotar esta filosofia que Pedro, como a maioria das crianças, são mais tranqüilas, relaxadas, felizes, enfim. Apaixonar-se é bom, mas revelar a paixão pode ser maravilhoso ou problemático. Boa parte dos amigos e amigas perde noites de sono e dias de alegria por paixões, sejam elas não correspondidas ou correspondidas de forma inadequada. Mas, pela sua própria essência, a paixão jamais permitiria tranqüilidade, calma... A paixão pede sangue e lágrimas. Pelo menos se a revelarmos para a pessoa por quem nos apaixonamos.
Talvez o melhor da paixão seja a paixão silenciosa.
Cefas Carvalho
“A implosão da mentira”
Manchete do JB
"Palocci, venha aqui!"
Lula, ao telefone
"Houve quebra de confiança. Com o depoimento de Mattoso, não tem mais como Palocci ficar. A situação ficou insustentável. Houve uma quebra ilegal de sigilo. Não posso mais sustentar um suspeito."
Lula, segundo assessores palacianos
“O núcleo duro do primeiro ano da Era Lula desmoronou.”
Ana Maria Tahan , Editora-chefe do Jornal do Brasil
“Assessores próximos ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva alertaram para o risco de o agravamento dessa crise evoluir de tal forma que acabaria comprometendo o presidente e deixaria portas abertas para a retomada dos discursos de impeachment pela oposição.”
Sheila D´Amorim, Folha de S. Paulo
"Consideramos inaceitável que uma irregularidade como essa e a conseqüente saída do ministro da Fazenda continue sendo usada como combustível de uma insidiosa, oportunista e hipócrita campanha da oposição, com a ajuda de setores da mídia, para desestabilizar o governo federal."
Nota da CUT
"Temos testemunhas que dizem que Lula estava a par de tudo. Mas não temos mecanismos que estabeleçam que tipo de informação foi passada a ele."
Deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), relator da CPI dos Correios, ao Financial Times
Orf
Meladinha dá o tom
No Beco
Violões juntam-se a vozes
Nas tardes de sábados
Noites de qualquer segunda-feira
Para o Beco vão os pedintes
Em busca da sopa
De um cigarro
De algo qualquer
Jornalistas, poetas, doutores
Caminho de deserdados
O Beco foi a lama da cidade
Hoje é alma e cana
Paraíso etílico
Recanto de comida gorda:
Costela, rabada
Buchada
Charque na fava
Pirão no cozido de peixe
No Beco
As vozes se soltam
As que cantam
As que falam mal
da vida alheia
Exposição diária de vida
E de vida difícil também
Onde explode o riso
Soltam-se almas fechadas
Em duros corações
A meladinha,
No Beco
Dá o tom do discurso
Na batuta do maestro
Eduardo Alexandre
PROSTITUTA
Essa-uma era
em-si um não-ser,
um não-sendo.
Em-si um não-ser,
essa-uma era
um não-sendo.
Um não-sendo,
em-si um não-ser,
essa-uma era.
Francisco Alves Sobrinho
SEM MAIS CIÚMES
Tangidas pela brisa de depois da tempestade ou pela razão posterior à cegueira vêm uma bruta ressaca nas vagas da consciência, a espinha envergada pelo chumbo do juízo e a angústia ante a impossibilidade de se devolver à boca do passado, de onde jamais deveriam haver saído, palavras que vomitadas ao vento ganharam anatomia mortal de adaga feita do aço da desconfiança e a cuja lâmina enfeitam pepitas de orgulho.
Terrível abrir as vistas no fim da crise, com a coluna freqüentada por calafrios e o refluxo arrastando sucos gástricos até a porta da garganta. Dá vontade de chorar, de sair gritando, de cometer suicídio, de se enforcar nos trapos da vergonha, de se envenenar vestindo essa fantasia macabra, suja e falsa, esse sentimento que não se confessa mentira, embora falseie a verdade, nem se declara doidice, mesmo afetando o bom-senso.
Trago na memória Tom Jobim cantando que "o ciúme é o perfume do amor". Antes fosse! A não ser que o maestro refira-se àqueles perfumes doces, fortes, insuportáveis, que provocam enxaqueca, porque o ciúme é coisa dos seiscentos diabos inventada pelo ser humano. Senti-lo é correr de peito aberto em vereda estreita no meio da caatinga, lançando-se de corpo e alma contra espinhos de jurema, cardeiro e chique-chique.
"Quem amar deste modo antes prefira/ morrer...", adverte Martins Fontes no soneto Otelo, referência ao Otelo de Shakespeare, onde está escrito: "Meu Senhor, livrai-me do ciúme! É um monstro de olhos verdes, que escarnece do próprio pasto que o alimenta. Quão felizardo é o enganado que, cônscio de o ser, não ama a sua infiel! Mas que torturas infernais padece o homem que, amando, duvida, e, suspeitando, adora".
Ninguém forjado em carne está livre dessa praga, dessa maldição que contamina o sangue transformando veias e artérias em córregos de amargura. Alguns, porém, convivem melhor com o bicho do que outros. Infelizmente sou da laia dos outros, dos que se devoram a partir dos pés. Por vezes, fragilizado na auto-estima, passo a crer na legião de fantasmas do caos que invento e à qual me incorporo rumo ao Vale das Sombras.
Afogado em treva, desespero-me. Toda criatura ciumenta sofre, e sofre muito fazendo da neurose vala comum para enterrar paixões sob toneladas de cal virgem. Mas não se pode perder as esperanças, o sonho de liberdade. Assim, quando o mundo se abre ao novo amor, sussurro versos de Vinícius de Morais, desejando alto:
"Ah, quem me dera amar-te
Sem mais ciúmes
De alguém em algum lugar
Que nem presumes".
Cid Augusto
Tá Liberado!
A mais nova do nosso turismo chinfrim: querem, os que lucram com o setor, criar uma zona livre de prostituição em Natal. Certamente imitar o que fazem cidades como Amsterdam, na Holanda, que criou o bairro da Luz Vermelha, onde as pessoas freqüentam, muito mais por curiosidade, como turistas - como eu mesma já fiz uma vez - do que para consumir as mulheres expostas em vitrines.
E sentada em um banquinho de uma daquelas ruas estreitas, onde é proibido até mesmo fotografar, deu pra sentir a diferença cultural das mulheres da vida, que apesar da pouca roupa que vestiam - a maioria usava uma lingerie sensual - se exibiam com a fineza de uma mulher que estava ali apenas trabalhando.
Ao contrário do que a gente passou a ver em nossas praias. Mulheres e meninas - às vezes meninos também - desfilam uma sensualidade forçada que cheira a sexo barato, apesar de cobrado em euro. Em Ponta Negra elas esperneiam feito cobra em areia quente, e atraem cada vez mais o perigo que Natal passou a conviver com a chegada dos operários de outras plagas, sem origem nem classe, que juntam os trocados da moeda européia para trocar, como se fossem ricos, pela nossa moeda cada vez mais desvalorizada.
E aqui eles compram de tudo. Mulheres e meninas, serviços que o turismo oferece, e muitas vezes até caráter. Porque já são muitos os que acabaram se envolvendo com as delícias do lucro fácil.
Vamos ser bem claros. Quem disse que uma zona livre de prostituição vai tirar as "moças" de Ponta Negra? Quem vai poder levar pra cadeia uma prostituta, apenas por estar caminhando na frente de bares e hotéis, negociando o corpo para ser entregue num lugar próximo com a ajuda dos taxistas colaboradores? Quem vai poder prender uma prostituta, mesmo que esteja mal vestida e seja feia, apenas por freqüentar um restaurante chique da cidade na companhia de um gringo endinheirado? Inocente quem pensa que, criando uma zona livre, vai tirar a prostituição de Ponta Negra.
A tal zona livre, que não se enganem seus defensores, só vai triplicar o problema, hoje aliadíssimo do tráfico de drogas e da lavagem de dinheiro. Porque os gringos vão descobrir que "agora tá liberado", e vão chegar de ruma em vôos charters. E no aeroporto, ninguém nem pense em mandar de volta aqueles vôos lotados de homens... porque agora tá liberado! E em vez de dois vôos por dia, serão seis... oito... E nas nossas praias, os casais suspeitos vão continuar circulando... e poucos vão baixar na tal zona do baixo meretrício que estão querendo criar.
Sujeita a se tornar um antro de doenças sexualmente transmissíveis, a tal zona do baixo meretrício, se instituída em Natal, no mínimo terá que ter algumas regras. Como garantia de saúde pública para as prostitutas que atraem o dinheiro perigoso para o Estado.
Mas se por aqui, trabalhador honesto, que não se droga nem contribui para a criminalidade, morre à míngua por falta de saúde pública...imagine as mulheres e meninas que vendem o corpo... a alma... a vida!
Thaisa Galvão
“Não, não quero isso. Reluto em perder a fé nos meus semelhantes. Porém, sou obrigado a sucumbir perante a malfadada dança da deputada Ângela Guadagnin e, mesmo com o coração sangrando, confessar que aquele ato nos diminuiu como pessoas, mitigando a grandeza dos seres humanos, amiudando sua nobreza e, por fim, exaurindo a mínima dignidade que ainda se possa extrair das suas entranhas. (...)
A Ângela, nem as batatas...”
Luiz Lopes de O. Filho, Procurador de Justiça
“A posição de Palocci se tornou insustentável desde que ficou claro, ao longo das últimas duas semanas, que ele mentiu para uma comissão parlamentar de inquérito."
Financial Times, jornal inglês
Hugo Macedo
A dança de Ângela
Definida etimologicamente como a atitude ou manifestação ostensiva de desdém, de menosprezo, de ironia ou sarcasmo, ainda que por vezes causando indignação às pessoas, o escárnio é uma das atitudes de maior desrespeito de um ser humano em relação a outro. É quando alguém se acha acima da condição dos demais humanos. É quando se olha de cima para baixo e se anula qualquer sentimento de respeito e de consideração para com seu semelhante. É quando, mesmo tacitamente, há a postura de completo desapreço em relação aos outros, e como se as opiniões desses outros fossem fúteis e desqualificadas, quando não inexistentes.
O escarnimento traduz a completa falta de sentimento e de consideração de uma pessoa em relação às outras ou mesmo de alguém em relação à opinião e ao pensar de um grupo social em referência a si mesmo.
Em outras palavras é o completo desprezo. Mais ainda: É a total repulsa e preterição em detrimento do conceito de terceiro sobre atos que o desdenhador tenha, por ventura, praticado.
No entanto, se o escárnio se acompanha da zombaria e da ridicularização de tudo que se possa achar sobre a postura do zombador, forma-se, então, a dualidade da arrogância, caminho que desembocará, lastimavelmente, no desplante da soberba e da empáfia.
Os últimos atos do Poder Legislativo Federal têm se mostrado como um grande escárnio daquela instituição para com o povo brasileiro. Não há nada similar, quando se cuida do compromisso dos membros daquele poder para com o povo.
Há algum tempo tenho acompanhado a atitude de alguns parlamentares brasileiros e confesso que já estou começando a me indignar com uns tantos.
Tomo como exemplo aquela deputada federal pelo Estado de São Paulo que, numa posição sempre preconcebida de tumultuar os processos do conselho de ética, do qual faz parte, já alardeava bem antes que iria pedir vistas nos julgamentos que tentavam cassar os parlamentares do PT. Agora, achando pouco, resolve "dançar" no plenário da Câmara Federal e desdenhar do povo, tudo isto por causa da absolvição de um deputado que confessou haver recebido aproximadamente R$ 450.000,00 do "valerioduto". Não abomino a absolvição, embora discorde dela. Execro, sim, o deboche da deputada para com a opinião pública, e indago: Precisava mesmo dançar?
Quero deixar bem claro que não generalizo a postura de tal deputada. Sei – e não poderia deixar de ser assim – que existem muitos parlamentares sérios no PT, assim como no PMDB, PFL, PSD, etc... Não quero aqui, nem muito menos acolá, perder a ternura da crença no ser humano. Não, não quero! Ao contrário, quero crer nos homens, apesar dos pesares, até porque também sou da raça humana. Se deixasse de acreditar nos meus semelhantes, como eu ficaria sentindo-me parte de uma estirpe degradada da mínima credibilidade? Não, não quero isso. Reluto em perder a fé nos meus semelhantes.
Porém, sou obrigado a sucumbir perante a malfadada dança da deputada Ângela Guadagnin e, mesmo com o coração sangrando, confessar que aquele ato nos diminuiu como pessoas, mitigando a grandeza dos seres humanos, amiudando sua nobreza e, por fim, exaurindo a mínima dignidade que ainda se possa extrair das suas entranhas.
Ângela e sua dança, para mim, foram o epílogo da decência. Não há mais palavras a serem ditas e, talvez, nem o silêncio sirva como resposta.
A Ângela, nem as batatas...
Luiz Lopes de O. Filho
Procurador de Justiça (luizlopes.rn@uol.com.br)
Beto Barata/AE
MEA CULPA
Encontro ocasional, espontâneo
Quase emocional
Um bem assim me faz
Seja em Paris, virtual ou em Natal
Na areia meu delírio
Perco a noção do tempo
Bebo vinho, café
Quero tanto dizer
No entanto
Calada decido permanecer
Derrubo barreiras
Do tempo, do som, da probabilidade
Mais uma vez desafiando
Minha própria insanidade
Escutei versos
Refresquei a memória
O resto, o resto meu amigo fica sendo
Pura absoluta indiscutível
Longínqua história
Deborah Milgram
Escrava
Teu poema, inclemente, me encarcera,
umedecendo, de gozo, os meus versos.
Espancando, com a pena, as minhas rimas,
se assanha, feito bicho, entre meus seios.
Teus dedos em tuas mãos; ágeis tentáculos,
aprisionam de vez minhas vontades,
deixando-me à mercê dos teus domínios,
amarrando-me os pulsos, como escrava.
O ar que me vem é da tua boca.
Meus gemidos, quem sufoca é tua língua.
Teu verbo, desconexo aos meus ouvidos,
me faz louvar - indecente - o teu nome.
Em minha barriga, passeia impune, o teu falo.
Sob teu corpo, o meu, é prazer e desgoverno.
Entre minhas coxas, tu desenhas a tua fúria,
em teu pescoço, cravo dentes de poesia..
Mariza Lourenço
Se não se disse o que pensado
Se não se disse o que pensado
— cego.
Se não se vê o percebido
— mudo.
Se não se sente o que ouvido
— ego.
Sabe-se o ponto não tocado
— tudo.
É como ser o que não tido
— nudo.
Ter como sina o não chegado
— lego.
E cada toque ser riscado
— rudo.
E ao fim e ao cabo resumido
— nego.
(Se cego e mudo, o ego e tudo nego.
Se nudo, lego o rudo, o ego e tudo.
Se nego tudo, o ego é mudo e cego.)
Ser tido um não pensado ou percebido,
sem ter chegado a ouvido ou ser tocado,
tal sido não riscado: resumido.
Antoniel Campos
Registro
Como havia um Beco no meio do caminho, fiz dele o beco que passou em minha vida.
Do beco, por ser viço, fez-se vício que, como droga, contagia e arregimenta, multiplica-se.
Como na sarjeta do vício havia um corpo, no beco, o bolero entoado em desafino juntou-se a um violão que juntou-se a uma caixa de fósforos, que se fez percussão. Alimento.
Do bolero nasceu a banda e da banda fez-se espetáculo.
E vieram festas e vieram vozes e veio o coro no meio da noite em serenata.
A menina, linda menina, fez-se encantada praieira ao som da flauta, que fez-se harmônica, que fez-se sinfônica, que um dia chegará ao Beco que desnuda-se em todas as madrugadas.
No meio da cidade, da minha cidade, havia um beco. Um beco tão grande que tinha nome de rua e era pai de todos os becos. Não os da cidade, mas pai de todos os becos do mundo, abençoado Beco.
Sua cidade decerto tem um beco como a minha. Um beco da lama como o meu.
Se não tiver, deve ser triste a sua cidade.
E deve ser triste porque na sarjeta do vício feito beco não haverá um bêbado cantando a volta do boêmio. Volta ao beco, ao álcool, ao vício maior que é o próprio beco.
Não por ser o Beco pelo Beco, mas pelo que ele guarda em suas canções tristes ou baladas alegres, beco que se desfaz em sorrisos e tem pernas de apaixonada amante, sempre aberta a amar por amar. Como vício.
Vício de ser e querer ser sempre beco. Ou beco ser enquanto ente: vivo, pulsante, feito ribombares de zés-pereiras em sábados de carnaval.
Nesse Beco, rio de minha vida, por sorte ou ventura, havia um tamborete e havia uma mesa que pedia uma cerveja que pedia companhia.
Da companhia, o beco fez-se confraria e a confraria tomou a cidade por não se bastar a si mesma. .
E foram tantos os becos, tantos os bêbados trôpegos que não se pode mais: de beco da cidade, a cidade tornou-se beco de seu próprio beco, pois dele encantou-se para poder ser, com nome, identidade e todas as digitais guardadas - registro de antigamente em cartórios de saudade: poesia.
Eduardo Alexandre
"Com uma mão a gente lava a outra e com as duas toma banho."
Presidente Lula
"’Palocci está comprando horas’, disse à Folha um integrante da cúpula do governo.”
Kennedy Alencar na Folha de S.Paulo
"A dança da deputada é o mais imoral dos emblemas da degradação política brasileira. Talvez a perplexidade foi que impediu o presidente da Câmara, Aldo Rebelo, de exigir o devido respeito da deputada em pleno velório da Casa.”
Jorge Bastos Moreno
ELEMENTOS
Sou ar
Sou fogo
Sou água
Sou terra
Sopro mentiras
Queimo paixões
Molho lábios
Estremeço corações
Propago rumores
Aqueço corpos
Batizo inocentes
Cultivo indecentes
Poluindo pulmões
Apagando impressões
Estagnando tesões
Devastando ilusões
Homem
Eterno equilíbrio
Deborah Milgram
Num Debate Sobre Poesia
Por via das dúvidas, diga não e sim.
Ao "como assim?", responda: "é o que penso.",
assim, peremptório e o mais denso
possível (vale um certo ar de fim).
Ao "Forma e Conteúdo", vá por mim:
não queira acordo. Nada de Consenso.
Com certo enfado, encerre: "É tema extenso
por demais pra ser discutido assim..."
(isso mesmo: bem reticencioso.)
Na mesa, aparente o mais cioso
dentre os demais — "seus irmãos, seus iguais".
Seu timbre, o da mais fina melopéia.
Pós aplausos, acene pra platéia
com a tez do mais humilde entre os mortais.
Antoniel Campos
Natal há cem anos
Como se comportava Natal há um século atrás, quando o poeta Ferreira Itajubá chamava-a vale ameno e de branca Jericó? A começar pelo próprio Itajubá, figura admirável, talvez o maior talento poético que já possuímos, sem nenhuma formação cultural, sem sequer ter terminado o curso primário, mas, ao mesmo tempo, o primeiro poeta que fugiu da poesia candoreira de um Segundo Wanderley - prolixa e grandiloqüente e dos ativos formalistas dos parnasianos - para incorporar a luz, o chão, a paisagem, as cores tropicais, o quotidiano à sua poesia. E que se não chegou a ser uma poesia revolucionária, pelo menos dava um toque único, intransferível, de um talento singular, usando, por exemplo, palavras proparoxítonas, muito antes de Augusto dos Anjos e aí está o verso "a solidão tristíssima dos morros".
Natal, há cem anos, era uma festa. A professora Isabel Gondim, poetisa algumas vezes, realizava salões literários à maneira dos célebres salões da belle époque de Paris, quando ela recebia convidados, sentada sozinha em seu sofá, com elegância e pompa característica, como se fora uma nova Madame Récamier. Sabem onde? Na rua Chile, ali na Ribeira, e para onde certa vez, caminhou o juiz de direito, Costa Pinto, de maneira escandalosa, com típico humor natalense: chegou ao elegantíssimo sarau de dona Isabel, acompanhado de toda família, mais o papagaio e o cachorro vira-lata de estimação. Dona Isabel, que nasceu em 1838, morreu na década de 20, aos 94 anos, sempre falando mal de sua conterrânea Nísia Floresta, a quem chamava literalmente de mulher de vida livre.
Natal tinha no fim do século passado mais de cem jornais - de todo tipo: diários, semanários, mensais, pasquins. Há cem anos, Pedro Velho, na casa dos 40, comandava a Oposição - era republicano feroz, tocando Chopin para os amigos, na boca da noite, lendo os clássicos e sofrendo uma campanha jornalística imperiosa de Elias Souto, que o detratava de toda maneira. A polícia era radicalíssima. Centenas de boletins cruzavam a pequena cidade de sete mil habitantes e atingiam as honras e a paz provinciana.
Proclamada a República, Pedro Velho é chamado pelos militares; e o governo lhe é entregue. Não respondeu aos insultos e manteve uma atitude olímpica, até que a Junta Revolucionária, lá no Rio, enviou Adolfo Gordo, que nunca tinha vindo ao Rio Grande do Norte, para governar o Estado. Pedro Velho teve uma decepção profunda. O novo governador só agüentou um ano - renunciou, e Pedro Velho assumiu o poder, instituindo o que foi chamado de oligarquia Maranhão. Até morrer, aos 51 anos, num camarote de navio, no porto de Recife, ouvindo um amigo ler-lhe a "Gioconda", de Gabriele D'annumzio, mandou no Rio Grande do Norte como senhor absoluto.
Se Jorge Fernandes depois anunciava em verso que "a luz elétrica do meu tempo vinha com a lua cheia", Natal era dominada realmente pelas serenatas. Os presidentes de província que aqui aportavam, nomeados por Dom Pedro II, caíram na gozação popular: mal passados dos 20 anos, elegiam a Redinha para ouvir modinheiros famosos como Lourival Açucena, comendo tapioca e peixe frito; a administração estadual que se deteriorava. Venham para gozar as delícias do poder - "o governo do Rio Grande do Norte é um piquenique eterno" - dizem os jornais da oposição da época. O mais famoso aqueles presidentes foi o dr. Parrudo, que além dos banhos no mar da Redinha, e na lagoa de Extremoz, fugindo do expediente do Palácio, ainda possuía uma casa no Barro Vermelho, para encontros amorosos que soavam como escândalo impertinente, pelo pai de suas namoradas.
A cidade era um sítio. As ruas principais, a da Conceição e Santo Antônio, serviam de palco para sucessivos pastoris e lapinhas, onde os poetas Ferreira Itajubá e Gotardo Neto dominavam a cena, na luta entre os cordões azuis e encarnado. Por essa época, Ponciano Barbosa desfilava na cidade de fraque e cartola, mais uma rosa enfiada em cima do peixe, verdadeiro dândi, fazendo inveja a Oscar Wilde.
Padre João Maria avultava como um santo. Dia e noite, era de vê-lo, montado em seu burrinho, visitando os casebres e pensando as feridas dos pobres doentes. Auta de Souza, lutando contra a tuberculose, fazia versos místicos que eram entoados como hinos pelo povo. Elói de Souza despontava para a política e Augusto Severo subia morros e dunas para olhar mais detidamente os pássaros em seus vôos equilibrados, na brisa vindo do mar.
Já no finalzinho do século, nascia Luís da Câmara Cascudo, na rua das Virgens. Batizado na Catedral pelo padre João Maria. Quem o calentou nos braços, como madrinha excepcional, foi Auta de Souza.
A política fervia num fogo cruzado de acusações, destemperos e desavenças. Muito mais dura e impiedosa do que a de hoje. E o velho sinaleiro, lá da torre da Catedral, usava sinais semafóricos para sonolentos navios que navegam à barra do rio".
Sanderson Negreiros
O Poti, Setembro de 1988
“Diante do que está acontecendo, suspeito que ninguém mais no país tem qualquer privacidade.”
Senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT)
“Estamos entrando numa campanha eleitoral complicadíssima, campanha contaminada por uma crise que insiste em não terminar.”
Lucia Hippolito, na CBN
"Sou presidente e não posso responder a cada baixo nível que fazem contra mim".
Presidente Lula
Orf
Anatomia
Sua voz
Ecoa no silêncio
Sereno vibrante
Ensurdecedor
Acalma inspira
Me enche de torpor
Seus olhos
Brilham no escuro
Aguçados faceiros
Escondem inocentes
Uma chispa de amor
Seus braços
Cansados abertos
Recolhem acolhem
Indistintamente
A todos que lhe escolhem
Sua alma
Incógnita indefinida
Amada maltratada
Desconhecida permanece
Decifra-me ou te devoro
Deborah Milgram
Processo sucessório da SAMBA foi deflagrado
O processo de sucessão da atual diretoria da Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências - SAMBA foi deflagrado hoje, com a afixação de editais convocando inscrições de chapas em pontos estratégicos do Beco da Lama (Rua Dr.José Ivo – Cidade Alta) e adjacências. As inscrições de chapas ocorrerão até o próximo dia 30, às 20 horas, improrrogavelmente, no Bar de Nazaré, à rua Cel. Cascudo, 130 – Cidade Alta ou junto a um dos membros (Oswaldo Ribeiro Filho, Plínio Sanderson Saldanha Monte ou Leonardo Sodré) da Pré-comissão Eleitoral, escolhida em assembléia da entidade, realizada a 3 do corrente.
As chapas concorrentes disporão de trinta dias corridos para suas campanhas. A eleição se dará a 29 de abril, entre as 10 e 17 horas, em urna a ser instalada no Bar de Nazaré. No próximo dia 31, será formada a Comissão Eleitoral que presidirá o pleito. Esta será formada por membros indicados pelas chapas concorrentes e um membro indicado pela atual direção executiva. A chapa vencedora será empossada a 6 de maio, para um período de 3 anos de gestão.
Abaixo, a convocação de inscrição de chapas:
SOCIEDADE DOS AMIGOS DO BECO DA LAMA E ADJACÊNCIAS
SAMBA
ELEIÇÃO - INSCRIÇÕES DE CHAPAS
Pela presente, ficam convocados os sócios da Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências interessados, a inscreverem chapas concorrentes à sucessão da Diretoria da entidade, no período entre 21 e 30 do corrente, até às 20 horas do último.
As inscrições deverão ser feitas por escrito, contendo os nomes dos candidatos, na seguinte ordem:
DIRETORIA EXECUTIVA:
a) Diretor Executivo:
b) Diretor Adjunto:
c) Diretor Cultural:
d) Diretor de Eventos:
e) Diretor de Políticas Sociais:
f) Diretor para Assuntos de Juventude:
g) Diretor de Imprensa:
h) 1º Tesoureiro:
2º Tesoureiro:
i) 1º Secretário:
2º Secretário:
3º Secretário:
CONSELHO FISCAL:
Membros Efetivos:
1.
2.
3.
Suplentes do Conselho Fiscal:
1.
2.
3.
A estes nomes, podem vir somados, opcionalmente, os nomes de 10 (dez) a 20 (vinte) membros que comporão o CONSELHO CONSULTIVO.
As inscrições deverão vir em envelope lacrado e entregues no Bar de Nazaré, Rua Cel. Cascudo, Nº 130, Cidade Alta - Natal/RN, aos cuidados da Pré-comissão Eleitoral ou diretamente a algum membro desta.
No documento, a chapa deverá indicar um membro para compor a Comissão Eleitoral que encaminhará o pleito e será formada no dia seguinte ao término do período de inscrições de chapas, ou seja, a 31 de Março do corrente mês.
A Comissão Eleitoral, composta pelos membros indicados pelas chapas concorrentes e um membro indicado pela Direção Executiva da entidade, será formalizada no dia 31 de Março, no Bar de Nazaré, para redigir e tornar pública a Convocatória da Eleição, estabelecida para o sábado, dia 29 de Abril, entre as 10h00minh e 17h00minh.
Em Natal/RN, 20 de março de 2006.
Pré-comissão Eleitoral:
Oswaldo Ribeiro Filho
Plínio Sanderson Saldanha Monte
Leonardo Sodré de Siqueira
"Auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) num dos contratos da Petrobrás com a GDK aponta superfaturamento de US$ 23 milhões (aproximadamente R$ 48 milhões) e fortes indícios de favorecimento na licitação vencida pela empresa.”
De Diego Escosteguy em O Estado de S.Paulo, hoje.
Orf
ARRUMAÇÃO
Na gaveta
Guardada ficou a memória
Intacta, limpa, melancólica
Na gaveta
Amassada ficou a saudade
Latente, incoerente, irreverente
Na gaveta
Sumida ficou a loucura
Temporária, tímida, experiente
Na gaveta
Lacrada ficou a promessa
Balbuciada, proferida, escrita
Na gaveta
Armazenada ficou a paixão
Proibida, indecisa, impregnada
Na gaveta
Arrumada ficou a vida
Sem cheiro, sem pulso
Com muita naftalina
Deborah Milgram
A ISTÓRA DA FÉ
Poema Matuto
Há dois mil anos atráis,
cumeça a istóra da fé.
A istóra de Jesus,
de Maria e de José.
José era caipintêro;
e Maria, cumpanhêro,
a virge de Nazaré.
Maria era sortêra,
quando Deus Pai lhe iscuiêu,
mode sê mãe de seu fíi,
e um anjo lhe aparicêu.
Quando ela tava resando,
o anjo foi se achegando,
e a boa nova, lhe deu.
Maria, cheia de graça,
essa visita me induz,
a dizê, bindito é o fruito,
do vosso ventre de luz.
Falô num facho de brio:
Tu vai dá luz a um fío,
qui vai chamá de Jesus.
Maria lhe arrespostô,
bem alí, na aparição:
Cumo vai acuntecê ?
Eu juro qui num sei não.
Pruquê já me decidí,
sô virge, cumo nascí,
e num me intrego a varão.
Gabrié lhe dixe, intão,
abrindo o seu belo manto:
É um milagre Divino,
Maria, eu lhe agaranto.
Ela dixe: In mim se faça,
quero arrecebê a graça,
do Divino Ispríto Santo.
E alí, Maria, amostrando,
sua grandeza de amô.
Do arcanjo Gabrié,
aquele anúnço acatô.
Tornô-se Mãe, de verdade,
de tôda ahumanidade,
e de Jesus, Saivadô.
Gabrié inda ordenô,
alí, na anunciação:
Percure Zé Caipintêro,
abrindo o seu coraçaão.
Deve cum êle, casá,
pru mode legalizá,
a sua situação.
Maria casô cum Zé,
dispôi da anunciação.
Zé, normamente na lida,
ela in sua gestação.
E alí, dento de Maria,
tava aquêle qui siria,
para o mundo, a redenção.
E bem pertíin de chegá,
o isperado momento,
Zé acumodô Maria,
amuntada num jumento.
Uis anjo dissero amém,
e êles fôro prá Belém,
mode o resenciamento.
Quando chegaro in Belém,
já num tinha mais hoté.
Nem um quarto de pensão,
ninhum abrigo se qué.
Nem um pôco angustiada,
Maria, resiguinada,
dixe: E agora, José ?
Vamo dá o nosso jeito,
dixe êle prá Maria.
Adispôi de munto andá,
longe do qui êles quiria,
finamente se arrancharo,
num lugá qui incrontaro,
dento de uma istribaria.
Quando foi tarde da noite,
Maria pariu sem dô.
Recebeu duis animá,
solidariedade e amô.
Prá nossa felicidade,
na maió simpricidade,
nasceu Jesus Saivadô.
Cum seu instinto materno,
Maria, quage dotôra,
do seu fiín inucente,
cumpetente zeladôra,
pegô Jesus bem nôvíin,
e acumodô cum caríin,
no capim da mangedôra.
Meus irmão, foi nêsse hoté,
qui num tem era uma vêiz,
de uma istrêla, sòmente;
a de Belém, digo a vocêis,
qui nasceu o mais amoroso,
tombém o mais poderoso,
o Reis de Todos Uis Reis...
Bob Motta
“Devo muito, mas muito de tudo que nós fizemos a um homem chamado Antonio Palocci.”
Presidente Lula
Hugo Macedo
Isaque Galvão no Carnaval do Centro Histórico
Abracadabra
Havia um bruxo
De dia só falava
De tarde apenas declamava
Virava fantasma
Nos versos se deleitava
De noite fazia orgia
Convidava duendes, magos e trolles
Bebia, sorria idealizava
Cansado, magoado, assumido
Acordava pronto pra mais uma magia
Deborah Milgram
VISITANTES MATINAIS
Poema Matuto
Moro bem pertíin do morro,
onde a fáuna, livrimente,
inda é feliz e contente,
e vê a vida passá.
E eu, poeta apaixonado,
amante da natureza,
me integrando a essa beleza,
resôiví participá.
Faiz aigum tempo, dotô,
qui eu boto in riba do muro,
fubá, xerém, míi maduro,
p'ruis passo se alimentá.
Tôdo dia de menhã,
êles se assenta cantando,
cuma quem diz: Tô chegando;
já é quage um rituá.
E cum êles e seu cantá,
eu tanto me acustumei,
qui de repente, pensei,
e fiz cum munto caríin,
duais casinha de madêra,
bem potregida e cuberta,
cum porta e jinela aberta,
mode êles fazê seu níin.
E quando eu vejo uis bichíin,
entrá e saí à vontade,
minha ritina, in verdade,
num sei cuma num discola.
Nem sei cuma um sê humano,
pode surrí sastisfeito,
vendo um passaríin sujeito,
prêso dento da gaiola.
Um cunvite mê istrãe,
eu faço e digo pruquê.
O cunvite é prá você,
qui tem passo in cativêro.
E se você aceitá,
eu duvido qui num pare,
prá pensá e num iscancare,
ais porta de seu vivêro.
Eu quero lhe cunvidá,
mode fazê uma visita,
qui num é nada bunita,
lá na colonha pená.
Mode vê hôme injaulado,
e seu sembrante qui ixprime,
qui êle tá pagando um crime,
eu acho inté naturá.
E o pobre do passaríin ?
Agora, pregunto, eu:
Quá crime êle cumeteu,
prá ficá incaicerado ?
Puracauso foi seu canto,
qui de menhã lhe acordô,
e você se alevantô,
mode êle, tão ressacado ?
Bom, meu recado tá dado;
num sô mió qui ninguém.
No meu poema, porém,
quiz chamá sua atenção.
Pois eu prifiro, seu môço,
vê uis bichíin livre assim,
cantando no meu jardim,
do que dento d'um açaprão...
Bob Motta
Poema do livro PÉ DE PAREDE-CORDEL DE CABO A RABO, edição da Fundação Vingt-Un Rosado, 2001, esgotada.
"Eu convoco os iraquianos a começarem a resistir aos invasores."
Saddam Hussein
Versos decididos
por Fernanda Garrafiel
Jornalista por formação, Marize Castro trabalha há muitos anos com edição de livros, jornais e revistas. Mas foi na poesia que a autora encontrou seu centro. “A poesia me escolheu. Ela confiou em mim e eu me abri para ela. Ensinou-me, acima de tudo, a extrair meus poderes de mim mesma.” Entre suas influências, as norte-americanas Emily Dickinson e Silvia Plath, a brasileira Ana Cristina César e a inglesa Virginia Woolf. “Estas autoras são as minhas estrelas guias. Mas ainda há Clarice, Whitman, Rosa, Pound, Drummond, Rimbaud, Rilke, Auden, Pessoa … “ Ao falar de suas influências, Marize aponta um de seus poemas, de em seu último livro, Esperado Ouro:
Néctar
A verdade aproxima-se.
Olha-me com os olhos
abismados da beleza.
Não sou a mulher
que corta os pulsos e se joga da janela
nem aquela que abre o gás
nem mesmo a loba que entra no rio
com os bolsos cheios de pedra.
Sou todas elas.
Escrever me fez suportar todo incêndio
– toda quimera.
A autora tem quatro livros publicados, todos de poesia. Em 1984, lançou seu primeiro livro, Marrons Crepons Marfins, premiado e editado pela Fundação José Augusto – a fundação de cultura do Rio Grande do Norte –, e aclamado pela crítica paulista. Isso não garantiu a distribuição nacional da edição, mas expoentes como o escritor Ignácio de Loyola Brandão, o poeta e crítico Moacir Amâncio e Haroldo de Campos leram e incentivaram Marize a prosseguir. Quase dez anos depois, Marize lançou o seu segundo livro, Rito. Editado pelo Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da UFRN, recebeu indicação de leitura da Folha de São Paulo e teve poemas traduzidos pelo professor e crítico literário norte-americano Steven White. O terceiro livro, poço. festim. mosaico., editado pela editora da UFRN, permanece quase inédito, pois a tiragem foi ínfima.
A guinada na carreira de Marize se deu em outubro de 2005. A autora lançou, em João Pessoa, seu quarto livro - Esperado Ouro - durante o projeto "Tome Poesia". “Espero que ele, com a sua claridade, possa chegar a várias almas neste país imenso, e reafirmar: o poema é linguagem erguida.” Desta vez, a autora decidiu ser a única responsável pela edição do livro e criou a UNA, uma pequena editora, bem articulada com as gráficas e instituições culturais de Natal. “Para o livro tornar-se realidade, procurei algumas pessoas e instituições e todas me responderam sim, as portas se abriram e todo ele foi patrocinado.” – conta Marize. Por enquanto, a poeta deu lugar à empresária e trabalha fazendo contatos, enviando o livro, recebendo livros de outros autores, agradecendo os livros enviados. “Poetas como Carlos Ávila, Guido Bilharinho, Luiz Edmundo (o incansável editor de Tanto), Ana Rüsche e tantos outros têm me enviado seus livros, tecendo uma rara teia. Na semana passada recebi Corpo Sutil, do poeta paranaense Ricardo Corona, que estou lendo com muita atenção e admiração. Na dedicatória, ele me alerta sobre nossas afinidades poéticas. É um trabalho que demanda tempo, gastos materiais, mas que é infinitamente prazeroso.”
Em maio, Marize Castro estará em Salvador, a convite do poeta José Inácio Vieira de Melo (autor de A Terceira Romaria), participando do projeto “Poesia na Boca da Noite” e lançando Esperado Ouro. Nos próximos meses, a autora vai iniciar um projeto intitulado “Flores do mais”, uma homenagem explícita a Ana Cristina César e Baudelaire, no mesmo tom do "Tome Poesia", no qual pretende ter sempre um poeta convidado de um outro estado do Brasil, para falar sobre a sua poesia ao lado de um poeta potiguar. “Tudo isto porque, a exemplo do poeta mexicano Octavio Paz, acredito que há uma característica comum a todos os poemas, sem a qual nunca seriam poesia: a participação.”
“Se a poesia nos escolhe, não há mais nada a fazer, o caminho é escrever.” E Marize Castro escreve com maestria, uma poesia curta e intensa, onde não há desperdício de palavras ou idéias. Parafraseando Haroldo de Campos: “Em seus versos há algo de fundamental, algo entre o belo e o verum, a verdade em beleza, um cuidade especial com a síntese, um encontro com a poesia.”
De veludo e sangue
Porque declino do seu amor, o véu das torres me invade.
Já engoli espermas. Já voei muito alto.
Aos santuários de meninos-lodos e meninas-ostras.
Neste hemisfério, o tempo é vermelho.
A fé: andrógina. A inocência: anônima.
O amante: cego e corcunda.
O meu leite rega a flor que o inimigo trouxe.
Aqui não há solidão
há bosques de lágrimas
unicórnios reunidos para falar de amor
aranhas flutuando num mar
de veludo e sangue.
Poema extraído do livro Esperado Ouro, de Marize Castro
Matéria publicada no
Café Literário – Jornal do Brasil
http://www.cafeliterario.jor.br/novos_autores/marizecastro.html
“Os tempos modernos informam que o Exército pode e deve neutralizar tumores urbanos. Mas antes precisa saber como se luta nessa nova forma de guerra.”
Augusto Nunes, Jornal do Brasil
Hugo Macedo
Natureza Viva Com Figura,
Televisão, E Nenhum Gato
Continuas a ver um programa de calouros e
Outro de entrevistas, apesar da hora avançada.
Na tela, um violinista exilado toca
Para um ditador aposentado residente em Brasília.
Bebes água mineral e tens muito medo de vermes.
Helena já não te beija mais,
Já não toca mais o teu corpo,
Ela já disse que teu hálito cheira a cemitério,
E não suporta a tua loção de barba,
Nem jamais leu teus escritos políticos.
Ela passa o dia cheirando coca e bebendo vodka,
Esperando a hora do rapaz que limpa a piscina chegar
Para levá-la ao incrível mundo dos prazeres adquiridos.
Por tua cabeça passam várias imagens:
Táticas de negociação com teus colegas de bancada,
Inventários e sindicâncias que te deixam apavorado,
Freiras cancerosas que te deixam amargurado.
Vais ao banheiro, sentas no bidê e te masturbas
Pensando em Sharon Stone.
Abres o livro de citações famosas que sempre
Usas quando escreves teus discursos enfadonhos.
Não conheces ninguém,
Nunca cativastes ninguém.
Marcilio Farias
O Cantão do Grande Ponto
Cascudo conta-nos a exata História: um ponto comercial, o Café Grande Ponto, do português Custódio de Almeida, situado hoje onde está erguido o edifício Amaro Mesquita, no cruzamento da avenida Rio Branco com a rua João Pessoa. É a origem do nome do logradouro.
Conta-nos Cascudo, que Amaro Mesquita era um caixeirinho que ali mesmo varria calçadas e dizia de si para si: "Nesse lugar vai ser o meu sobrado" ou "eu farei aqui o meu sobrado". De balconista, Amaro tornou-se próspero comerciante e construiu o seu sobrado no lugar onde era o Café: é o Edifício Amaro Mesquita.
Manoel Procópio de Moura Jr. nos informa que, em 1845, o presidente da Província, Casimiro de Morais Sarmento, determinou a ampliação da atual rua João Pessoa, derrubando a mata existente até a rua Princesa Isabel.
E nos diz ainda Procópio: “após esta derrubada, a atual Princesa Isabel passou a chamar-se Rua dos Tocos, enquanto a parte ampliada da atual rua João Pessoa, passava a se chamar Rua Sarmento.”
Diz ele que, “anos depois, quando a Rua Sarmento já atingia a atual Av. Deodoro, recebeu, em 13 de fevereiro de 1888, a denominação Rua Visconde de Inhomerim (Francisco Sales Torres Homem).”
E arremata: “Este nome se conservou até o início do Século XX, quando passou a chamar-se Rua Coronel Pedro Soares, para, finalmente, já na década de 1930, chamar-se Rua João Pessoa.”
Odilon de Amorim Garcia nos revela que, ali, “durante a II Grande Guerra, começou a funcionar o “Serviço de Alto Falante”, de Luiz Romão, cujas caixas de som eram fixadas em um poste, exatamente na esquina da João Pessoa com a avenida Rio Branco, defronte ao “Café Grande Ponto”.
Nos diz, que “todos os dias, às 19 horas, o Serviço transmitia músicas, e, às 21 horas, retransmitia o noticiário da BBC de Londres.” E que “Os freqüentadores do Grande Ponto se deslocavam para aquela esquina para ouvir as últimas notícias sobre a guerra.”
Odilon nos conta uma estória do popular Zé Herôncio, no carnaval, “vestido de mulher, tendo na mão um pinico cheio de salsichas, ostensivamente, com caretas como de nojo, fazia que comia o verdadeiro conteúdo que geralmente existe num pinico.”
Marcos Maranhão, filho de Djalma Maranhão, poeta-prefeito que mereceu, a partir de projeto de lei do vereador Antônio Júnior da Silva, do PT, a homenagem de ter o seu nome ligado ao Grande Ponto, traça um perfil político, humano e de realizações do pai.
E vem um desfile de grandes estrelas com seus textos que, somados, dão um panorama do que foi e é o Grande Ponto para a cidade do Natal. Senão, vejamos o que eles dizem do Grande Ponto:
Para Ubirajara Macedo, “o Grande Ponto era uma festa.”
Odilon, dos vivos, talvez o mais velho, ensina que “nunca se deve mexer em coisa antiga”, e pondera, “mas, às vezes, é bom trazer de volta um passado que alegrou a nossa mocidade.”
Marcos Maranhão lembra que “as cidades antigas tinham seu lugar sagrado no centro, na Ágora em Esparta, na Acrópole em Atenas, no Capitólio em Roma.” Que, “Ali, os cidadãos se reuniam e faziam discussões sobre os assuntos mais importantes, divertidos e esportivos da cidade.”
“Um dos costumes mais interessantes de uma parte da população natalense das últimas décadas do século passado e primeiros anos do presente foi a instituição do Cantão, local onde se reuniam grupos de intelectuais, funcionários públicos graduados, políticos e comerciantes.” Cantões. “ Na Cidade Alta, eram bastante concorridos os seguintes Cantões: da Gameleira, o mais antigo e temido pela crítica sempre ferina, situado à Praça da Alegria, atual praça Padre João Maria”, conta-nos João Gothardo Dantas Emerenciano.
“Em sua residência, o Vigário Bartolomeu costumava receber os amigos, à tardinha, na calçada, à sombra da própria casa, segundo hábito daqueles tempos em Natal, cidade provinciana. Ali, eram dispostas cadeiras constituindo as tradicionais ‘rodas’ para as ‘prosas’, hoje denominadas ‘bate-papos’, as quais se prolongavam até certas horas da noite. Essas ‘prosas’ eram comuns nas calçadas das principais residências da cidade, ou à sombra de frondosas árvores existentes nas praças, destacando-se a do “Cantão da Matriz”, sob majestosa gameleira da Praça da Alegria,” rememora Antônio Fagundes.
Lauro Pinto lembra que, “antigamente, essas reuniões em Natal, como nos diz o historiador General Pessoa de Melo em seu livro ‘Natal de Ontem’, tinha o nome de - Cantões - cerca de cem anos atrás.”
Para Joanilo de Paula Rêgo, o Grande Ponto “é o território encantado onde vive a alma errante, boêmia e lírica, curiosa e loquaz, da gente natalense.” Joanilo é do Cantão dos Pastoradores da Estrela da Manhã, ainda na ativa, depois das 23:00 horas.
“O Grande Ponto era tão importante que tinha lugar de destaque no mapa do Brasil. É. (...) Grande Ponto dos “coronéis” da política, que enfeitavam as noites daquele verdadeiro campus universitário com seus ternos de linho branco irlandês 120”, nos garante José Maria Guilherme.
Em versos, Nei Leandro sapeca que
“o cafezinho ao lado
às vezes queimava a língua
de quem falava demais.”
Aos oito anos, Clara de Góes foi a escolhida para “Ver o padrinho, o prefeito, levar-lhe um par de meias. Levar os recados, as recomendações de todos, se lembrar, não esquecer, trazer de volta, aos seus, um gesto dele, habitual... Eram os idos de 64 e Djalma estava na Embaixada do Uruguai, no Rio. Ou partia ou, na rua, seria preso, já amargando a saudade e a tristeza que viriam, longe do Grande Ponto.
Em Itamaracá, e pelo resto do Brasil, depois vários outros países da América Latina, presos políticos amargavam o chicote do pau-de-arara, o cacete, os choques elétricos, as unhas arrancadas, o terror, o medo, o poder dos quartéis sob ordens da inteligência norte-americana, a intervir no mundo, ferindo a autodeterminação de povos, com medo do comunismo.
Luciano de Almeida faz fragmentos do Grande Ponto, e diz que “Com o Ato 5, soa o dobre de finados para toda a atividade política no Grande Ponto. Ponto final.” Helmut Cândido tem parecer semelhante: “O Grande Ponto morreu. Não vive mais. Perdeu-se no tempo.”
Graco Medeiros, “filho de velho decano dos comerciários do centro da cidade, chamado Luiz Cleodon de Medeiros”, jura que “(...) ‘fechou o tempo’ na Cidade Alta para ver a movimentação de soldados do exército, com roupas de campanha e um baita caminhão verde-oliva toldado, ocupar o passeio público para retirar a parafernália de guerra das vitrinas de “O Novo Continente”. Ele lembra que era, justamente, a noite de 24 de agosto de 1961, e que, no dia seguinte, “Dia do Soldado”, Jânio da Silva Quadros comunicaria sua renúncia a um país perplexo.”
Em cima do Novo Continente, o Natal Clube, Cantão de festas no passado e carteado no fim de festa.
Grande Ponto de tantas boas e más línguas, que revoltam o poeta ítalo-natalense Franco Jasielo, há décadas aqui arraigado, que torna-se catastrófico e ferino: “os bares e os poetas foram demolidos. A fofoca legítima fugiu para os jornais.”
J. Charlier Fernandes também faz poesia:
“Grande Ponto
Grande porto
orbe liberto do tempo:
sendo um pouco o teu retrato
(com a minha alma fechada)
eco de tuas vivências
(com o meu sossego calado)
por que assim avassalas
no teu chão de confidências?”
E poesia também faz Celso da Silveira:
“Centro referencial
de política e cultura,
de oposição e governo;
a palavra ali falada
no palanque dos comícios
ganharam tal ressonância
que nos seus cantos ecoam.”
“Ali, a democracia participativa criava raízes, pois a discussão era permanente sobre as grandes questões nacionais e da cidade”, quem nos diz, de pés no chão, é Moacyr de Góes, que nos lembra que essa prática só muito depois começou a ser usada no Brasil, pelo PT. Fala-nos do Fórum de Debates. Era o Cantão da Praça da Imprensa.
Era um ponto xaria, habitado por todos os canguleiros da velha Ribeira, que começava a perder encantos e comércio, prostíbulos, bares e almas que subiam a ladeira para a conversa diária e amena de fim de tarde, com mortais que surgiam do Tirol, Petrópolis, Alecrim, Quintas, de onde mais?
“Nesta ‘Universidade’ popular, reuniam-se intelectuais, esportistas, políticos, jornalistas, estudantes e um sem número de prisiacas. Era uma fonte inesgotável de comentários, boatos e muita conversa fiada que invadiam a nossa pequena Natal”, tese de Manoel Procópio Jr.
Casciano Vidal nos confessa que “assumindo o Grande Ponto e sua genial humanidade”, ele percebeu “coisas que os olhos curiosos do menino chegado de Mossoró e Alexandria nunca tinham visto.”
Falves Silva historia e analisa, e afirma que “era naquele local onde os expoentes daquela geração, a das cocadas, resolviam os problemas do mundo.” Era o Cantão das Cocadas.
Eugênio Neto ainda afirma que “a ‘Calçada do Café São Luiz’ é, hoje, para nós, seus freqüentadores, verdadeiro estado de espírito. Não se entende começar o dia sem uma chegada até lá. Outro cantão, gabado pelo padre José Luiz: “O Grande Ponto existe? Existe o Café São Luiz”!
O Grande Ponto, que, para Leonardo Sodré “já foi moderno, hoje tem história e melhor do que grande diante do crescimento da cidade, virou um ponto que foi grande fisicamente e se tornou maior ainda pela memória que guarda e preserva.”
Talvani Guedes da Fonseca afirma que “havia um pedaço do Grande Ponto que não dormia.” E Protásio Melo, como se a sentir a nossa sede, começou a ver que “não havia mais um lugar para sentar, conversar, beber ou comentar a vida alheia.” Para depois comemorar: “é quando aparecem os irmãos Rossini, Múcio e Aldemar Miranda, inaugurando a Confeitaria Cisne.” Aí surge o Cantão do Canto do Cisne.
Manoel Onofre Jr. registrou ser o Grande Ponto “sala de visitas, centro de convivência, ágora, universidade popular. Tudo isto e algo mais.” Cantão.
Para não fugir ao risco do vou, não vou citar, Inácio Magalhães Sena escorrega: “eu não devia mencionar nomes, por acabar esquecendo algum. Mas como esquecer”...
“O Grande Ponto não somente situa uma espécie de centro geográfico da capital, como assume o centro afetivo de encontro e relacionamento de um permanente potencial de sua população”, defende sociologicamente Raimundo Nunes.
Na visão geográfica de Franklin Serrão, “a história da construção deste nosso espaço geográfico afetivo se confunde com tradição e todos os elementos sociais que produzem modificações através do tempo.” Modificações essas que não querem calar na indagação de Cristina Tinôco: “a quem importam as feridas expostas do velho centro? Quem as cuidará?”
Filho do grande grandepontense Alexis Gurgel, Alexandro chega trazendo-nos poesia em prosa: “o badalar do sino da Igreja do Galo continua preciso e atento às mudanças da Cidade Alta.”
“Lembra-me o Montmartre de Paris, de minha juventude de estudante”, diz padre Agustin, enquanto Raquel Alves de Sousa, saudosa, faz poesia de pranto: “hoje, o Grande Ponto cresceu e o Cinema Rex é só memória.”
Grande Ponto do Cantão da Vesúvio, onde, “No meio da rua, um pierrot de branco parou em frente à porta. Tira do bolso um lança-perfume e ensopa um lenço que leva ao nariz. Logo seus braços pendem e o lenço se desprende. O pierrot hesita, vacila e começa a cair devagar. Flutua, como que paira, leve, descendo aos poucos até o chão.” Era Newton Navarro, em prosa/poesia de Cláudio Pinto Galvão.
Grande Ponto numa Natal que, para Petit da Virgens, era “uma grande Nova Iorque”, cidade que possuía um Grande Ponto que sediava uma Confeitaria Cisne, onde, “Numa dessas belas tardes festivas, reunidos ali em uma cervejada, Cascudo, Saturnino, Severino Nunes e eu, depois de simbolicamente ouvirmos “o canto do galo”, que ainda ressoava nas páginas da história, discutimos informalmente a possibilidade de mandarmos cunhar uma medalha de ouro com o número 13 encimado por um galo e que essa medalha servisse de insígnia aos iniciados” do Clube dos Inocentes, como lembra o professor Melquíades.
Todo esse saber, essa filosofia e esse testemunho são parte da cultura da cidade do Natal, que tem, no Grande Ponto, o seu coração safenado. Grande Ponto que foi o maior entre todos os cantões da cidade do Natal: a ágora, a Universidade do Grande Ponto, cujo reitor era, sem dúvidas, João Cláudio Machado.
É, ainda através desse Grande Ponto que a cidade respira, aspira, agiganta-se e não se retrai, porque o Grande Ponto é chão de luta e também história de amor a terra.
Tirol, 27 de novembro de 2002.
Eduardo Alexandre de Amorim Garcia
“É uma tentativa de golpe contra as bases do PMDB. Vejo a mão oculta do PT e do governo patrocinando este movimento dentro do PMDB, porque o PT sabe que está desgastado e teme um candidato que represente uma nova opção para o país.”
Anthony Garotinho, sobre o adiamento das prévias para escolher o candidato a presidente pelo PMDB
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O Livro Negro do Beco
Negro, um livro quase-esotérico
do Beco,
de folhas tecidas nas brumas,
capas sob a cera dos tempos.
Um mago de barbas grisalhas
oculta-o, portas cerradas.
Liberdade resta lá fora.
Ferrolhos e chaves,
oxidados pelos ares das marés
de um rio-testemunha, o Potengi,
a receber os sais do Atlântico mar.
Clamar? Bradar?
O grito é para quê?
Ora, os gritos todos,
que não reconheci,
já romperam gargantas
e o silêncio que se inaugurou
é o silêncio-cemitério,
silêncio-não-Beco.
Que medo se exibiu?
Do povo?
Do polvo?
De tentáculos?
De tentativas de alguns?
De poucos que querem falar?
De loucos que querem contar
sobre suas simples escolhas?
Os olhos russos,
agudos,
do mago barbado
não me permitem acreditar.
Oculta-o, o livro,
portas semi-sepulcrais,
lacradas.
A palavra-mágica
teima em não ser
"abre-te, pergaminho
do querer."
Calar,
Calabar?
Onde és, Calabar,
eu não sei.
Só sei que é onde
não quero estar.
Permitam-se as escolhas,
sejam quais forem,
antes que os escolhos
da vontade
façam dobrar
a história
que, lindamente,
com abertos olhos, ouvidos
e boca,
já foi contada
e escrita
pelo próprio mago-guardião.
Num livro, à época,
a cores,
cores vivas
que me trouxeram,
do mundo em que estive,
fazendo-me escorregar, navegando
no arco-íris
da ilusão?
Um livro livre,
liberto da escuridão.
Um livro livre
da poeira,
do fosso aberto
onde caiu a criança
que brincava no ar.
Jogue-se o livro
ao mar,
ou, até mesmo,
ao fogo,
fogo que aquece
os dias e as noites
do Beco Livre.
O Beco que o mago
transformou
no "maior do mundo".
Virtuoso Beco
que tem muitas veredas,
portas de entrada,
e de saída.
Nenhuma delas
fechada,
todas elas paridas
no livro multicolorido
(de um mago envelhecido pelo temor?)
Lívio Oliveira
Karl Leite
Hai-Kais para o Beco e sua Alma
I
Beco virtual?
Sonhei que era sincero
meu cartão postal.
II
Peço teu copo.
Vi teu batom pintado,
boca que toco.
III
Se bebes ao mar,
tens o rio esperando
só pra te afogar.
IV
Publicas livros.
Para ler só tem quatro:
os mais precisos.
V
O Beco solto.
Lá! Vê naquela mesa?
Mora um louco.
VI
És só famosa.
Se não há quem o prove,
foi tudo prosa.
VII
Mais um amigo
mergulha nas duas luas
de teu umbigo.
VIII
Posso penetrar?
Já não é libertário
esse teu lugar?
IX
Sinto exagero.
Não é dessa mocinha
esse mal cheiro.
X
Em muito assuntas.
Mas eu quero perguntar:
já és defunta?
Lívio Oliveira
BARCAROLA
Não te recordas, querida,
Da noite em que nos amamos,
Sob a frescura dos ramos
Da laranjeira florida?
Gemia a viola na aldeia,
A brisa um hino entoava
E a luz da lua inundava
A terra, de rosas cheia!
Lá na planície da serra,
junho alourava as espigas,
vinham de longe as cantigas
das moças de minha terra,
quando te vi, linda flor,
e da nolte à doce calma,
derramaste na minha alma
o eflúvio do teu calor!
Saudade! quanta saudade
da noite em que, ao céu sereno,
tu me abriste o seio, pleno
de aroma e de mocidade!
A' sombra da laranjeira,
por ti, visão da alegria,
do meu beijo a cotovia
cantou, pela vez primeira!
Tu esqueceste os ditosos
domingos embalsamados,
e os cantos apaixonados
dos jangadeiros saudosos
que, ao céu transparente e azul,
do estio nas tardes belas,
passavam, molhando as velas
abertas ao vento sul!
Tudo esqueceste, e mais nada
resta em tua alma enganosa,
dessa paixão desditosa,
dessa ilusão desfolhada,
que lembro todos os dias,
pensativo, a cada instante,
Ó lavandisca inconstante
das areias alvadias!
Talvez que esta alma não possa
acreditar, nunca mais,
nos teus beijos aromais,
nos teus sorrisos de moça!
Ai, meu doce malmequer,
que me deixaste em janeiro,
- como tudo é passageiro
no coração da mulher!
Ferreira Itajubá
DE NATAL AO PARÁ
Adeus! Vão-se acabar as noites claras,
As trovas ao violão, pelos telheiros !
-planta das minhas ultimas searas,
- corpo dos meus pecados derradeiros!
O tempo voa. A ceifa das espigas
Voltará , para dar-nos mais cuidados,
–terra das minhas últimas cantigas
-vale dos meus prazeres acabados!
Adeus –sejas feliz, entre as famílias
Que te cercam nas praias alvejadas ,
-carne das minhas ultimas vigílias
-urna das minhas crenças desfolhadas!
Mais um beijo dos teus que das alturas
São o momento! E atira-me o rosário,
-horto das minhas ultimas torturas!-
cruz em que subirei para o calvário!
Ferreira Itajubá
Viajado (epa!) Laélio,
Um gigante.
É desses a quem a gente diz: ler sem medo - sem medo de tropeçar no verso (na rima, na métrica, no ritmo..). O Rei, sem dúvidas. O maior da Taba. Othoniel é o Príncipe (li, como que rapidamente, sobre a efeméride do Bardo, hoje: Aleluia, sempre), porque o bam-bam-bam da poesia potiguar é esse aí que vc diz, com propriedade, que faz arrepiar (veja que solução magistral, em termo de métrica, ele arranjou para esse último verso..).
Mas Nilson Patriota, que é das bandas de Touros, no livro Itajubá Esquecido, joga farinha no ventilador acerca da origem do Canguleiro: ele diz que Ferreira nasceu por lá, que tem testumunha, que isso, que naquilo. A favor dele, o fato que, realmente, a Rua Chile, então Rua do Comércio, era o "point" de Natal naquela época, e que um pobretão como o Itajubá, "jamé" poderia ter nascido ali...
Mas é voz sozinha nesse ponto.
Quanto às poucas letras do bardo, tido como um quase analfabeto, tb há controvérsia.. diz-se que Castriciano corrigia a parte gramatical, que ajeitava a coisa...
Cá pra nós: pura sacanagem. Quem conhece poesia, sabe que o que Itajubá escreveu, já estava na cabeça dele. É muito completo, muito fechada a coisa, muito arrumado, para uma pessoa, ainda que com a altura de Castriciano - que foi um poeta sofrível, ajeitar alguma coisa...
Revisão, vá lá, isso acontece até hoje, mas daí a querer tirar algum mérito do que fez o Bardo, péra lá.
E essa aí, dos despojos, conforme lamentou Cascudo, é de "reiá"!
abçs,
Antoniel Campos
Bardim, rapidinho (que estou saindo):
Henrique não era não! Quiçá as pequenas jaças das jóias de Itajubá tenham sido buriladas por Gotardo Neto - amigo íntimo do boêmio (pois boêmio também era) e um poetaço do tamanho do bonde.
Abs.
Laélio