segunda-feira, julho 30, 2007

PARÁGRAFO FINAL

Marcus Ottoni


"Não existe em toda região espaço mais livre e democrático que o Beco da Lama e adjacências."
Cristina Tinôco


"É possível que os membros da diretoria atual não estejam com tempo suficiente para se dedicar às relevantes questões culturais do Beco da Lama e das Adjacências."

Ivan Júnior

Karl Leite (Pratodomundo 2005)

Aspirações


Bem quisera

Ser eu a resposta

Clara, direta,

Total, completa

Bem quisera

Não saber a pergunta

Irrelevante, intolerante

Estonteante, fascinante

Bem quisera

Ser eu apenas eu

Despreparada

Desconcertada

Despenteada

Desenfreada

Desnorteada

Sensibilizando

Você e eu…


Deborah Milgram



Manifesto

PROPONDO O DEBATE E A SOLUÇÃO DEMOCRÁTICA


Preocupo-me com a apatia da SAMBA. Por isso, gostaria que os amigos da lista tentassem, como eu tentei até agora, lembrar qual o evento, reunião ou qualquer outra atividade, que ocorreu durante o ano de 2007, por iniciativa da nossa sociedade. Lembrar o Carnaval não vale, porque foi uma iniciativa da Prefeitura Municipal de Natal. Não nos lembramos porque simplesmente não aconteceu nada.

A diretoria da SAMBA, precisa, no mínimo, fazer uma reflexão e promover um debate aberto em torno do assunto. E, se for o caso, antecipar (se possível for) as eleições, abrindo espaço para formação de uma nova diretoria. Porque é possível que os membros da diretoria atual não estejam com tempo suficiente para se dedicar às relevantes questões culturais do Beco da Lama e das Adjacências. Ora, acredito que existam bons companheiros dispostos a tocar a entidade. Poderemos entender os vários motivos que fizeram a SAMBA parar, é necessário apenas que eles sejam informados e isso não significará nenhum desgaste à diretoria atual, que no momento está ausente.

O Beco é criativo. Aí está o chorinho (voluntário) de Camilo & Cia, pegando legal. E a Samba, que tem diretoria específica nem divulga que essa atividade existe no Beco. Uma pena, não?

Tem muita gente de valor, pessoas boas, bem intencionadas e inteligentes na diretoria comandada pelo professor Bira. Cito Dorian Lima, Júlio Pimenta, Civone Medeiros, entre outros que não lembro agora. Infelizmente, e mesmo assim, a SAMBA não funciona.

Pelo debate, pelo diálogo e rápida solução.

Em favor da SAMBA,


Ivan Júnior



Gatos de becos

Sexta-feira, dez da noite. A cena urbana alternativa do velho centro da cidade atinge seu nível máximo de ebulição. O grupo de chorinho, depois de cumprir voluntariamente seu expediente, dá lugar ao samba e a moçada solta o quadril mostrando todo o molejo brasileiro. Casais trocam juras de amor pós-moderno sabendo que aquela emoção será tão breve e intensa quanto eterno possa parecer o momento; talvez exatamente longo o suficiente para ser gasto no balanço das horas de uma noite. Amigos de mesa e de bar discutem calorosamente os últimos acontecimentos políticos, tentando, com o poder das suas metralhadoras verborrágicas, inocentar seus partidos simpatizantes. Nas rodas de conversas os temas variavam entre as produções culturais da cidade e alhures, fatos do dia-a-dia e outros bem mais pessoais, cochichados baixinho, entre trocas de carinho.

A menina rica e a menina de rua são vistas freqüentando o mesmo território. Afinal, não existe em toda região espaço mais livre e democrático que o Beco da Lama e adjacências, mas, independentemente da vizinhança encontram motivos para divergências. Quem sabe o mesmo gato estava sendo cortejado pelas felinas, quer dizer, meninas? Não sabemos exatamente qual, mas as diferenças foram tantas que pareceram gritar insultando as carências da menina de rua. Ela, a seu turno, deixando-se vencer pelos apelos dos seus demônios interiores, lança mão das armas que dispõe naquele instante: seu rico acervo de palavras chulas e uma mísera garrafa quebrada. A cena começa a ficar emocionante. Por segundos imagino uma arena romana e gladiadores debatendo-se nela. A galera vai ao delírio com os avanços e recuos de cada parte. A turma do deixa pra lá entra em ação e uma negociação começa a ser desenvolvida. Paralelo ao evento os grupos começam a se dispersar. Os mais temerosos vão saindo de fininho, bem à francesa, para não chamar atenção.

Nossa conversa, que versava em torno da antiga e protelada revitalização do velho centro da cidade, aos poucos vai se configurando como parágrafo final. Antes, contudo, lembramos que, no entorno daqueles becos encontram-se edificações que abrigam organismos de poder tais como: a Prefeitura, a Assembléia Legislativa e o Palácio da Cultura, antigo palácio do Governo, agora órgão da Fundação José Augusto, principal entidade cultural do nosso Estado. Todas elas instituições que, de uma forma ou de outra, poderiam estar envolvidas em alguma iniciativa em prol da recuperação daquele espaço.


Despedi-me dos companheiros de conversas na calçada me sentindo quase uma vira-lata, pela proximidade com alguns sacos de lixo de odor indecifrável. Acompanhou meus passos o burburinho das conversas ainda exaltadas. Imaginei Chico Science, lá do céu dos músicos fazendo uma versão para a ocasião: "...da lama ao caos, do caos à lama, nos Becos do Centro tudo se inflama...", e os insultos da pobre menina de rua para a também pobre menina de família. Como fundo musical para o episódio da noite, depois de Chico ter concluído seu repente, entrou Vanessa da Mata ressuscitando outro Chico, desta feita o Buarque, com seu antigo sucesso "Os Saltibancos". E a musiqueta ecoava assim: "Nós gatos já nascemos pobres, porém já nascemos livres. Senhor, senhora, senhorinha...."


Ana Cristina Cavalcanti Tinoco



O natalense, este bicho esquisito...


Meu pai, o saudoso escritor e publicitário Padre Zé Luiz, costumava brincar dizendo que o natalense era um bicho esquisito. Talvez mais que o mossoroense, que, por viver em outro país (o País de Mossoró, tão mítico quanto Passárgada) tem reconhecidamente hábitos e idiossincrasias diferentes dos norte-riograndenses e brasileiros. Contudo, os nascidos e moradores da Cidade do Sol possuem características estranhas, dignas de serem estudadas pela antropologia.

Começa que, como sentenciava Zé Luiz, o natalense não gosta de ganhar dinheiro. Há inclusive uma frase famosa, atribuída ao jornalista Cassiano Arruda Câmara, que reza que "o natalense gasta 200 para o outro não ganhar 20". Recordo que na minha infância, lá pelo início dos anos 80, saíamos em família para almoçar fora aos domingos. Qual não foi nossa surpresa quando uma vez nos deparamos com um cartaz na porta de um restaurante: “Fechado para almoço”. Quantas outras vezes aos domingos não saíamos para jantar o os restaurantes fechavam às oito da noite.

Sobre essa vocação natalense, vivi história igualmente curiosa dia desses. Perto de minha casa há uma lanchonete que freqüento há cerca de um ano. Embora o dono – um senhor bigodudo com ares de português – não seja um exemplo de simpatia, resmungava um bom dia quando eu aparecia lá para degustar a especialidade da casa: salgado + suco por um real. Em um belo dia, desejoso de tomar um café preto, perguntei a ele se não poderia substituir o suco por um café. O homem respondeu que não, que o café custava 70 centavos e o salgado fora da promoção, 80, totalizando 1 real e 50. Argumentei que nem precisava ser um copo abarrotado de café. Bastava uma xicara pequena. Ele respondeu que o café pequeno custava 30 centavos. Com mais 80 do salgado, 1 real e 10. Tentei explicar que ele ganharia mais dinheiro comigo se eu bebesse uma xicrinha de café (mais um salgado) a um real do que bebendo um suco - em copo grande - de acerola ou cajá (mais o salgado) pelo mesmo um real. O homem se invocou e, me olhando como se eu quisesse enrola-lo, sentenciou que somente a promoção suco-salgado era um real. Se eu quisesse o café, que pagasse a mais. Não contei conversa. Atravessei a rua e fui para a lanchonete do outro lado, onde o café pequeno era 20 centavos e a coxinha saiu por 70 centavos, totalizando 90 centavos, claro. Achei curioso como o bigodudo perdia um cliente fiel por um café (ou uma diferença de dez centavos). Definitivamente, aquele comerciante não gosta de ganhar dinheiro.

O natalense também tem particularidades curiosas, como o fato de se enxergar com mais glamour que os demais nordestinos. Isso não quer dizer bairrismo. Cearenses e pernambucanos dão um banho em nós em se tratando de valorizar as coisas da terra onde se nasce. É que o natalense no fundo se considera um lorde inglês, mais ou menos como um argentino se sente em relação aos demais latino-americanos. O natalense médio (principalmente da famigerada classe média, claro) tem sempre que estar bem arrumado, endinheirado e automotivo. Natal é uma cidade onde não possuir um carro é quase um crime de lesa-capital.

Recordo, por exemplo, de um casal amigo meu que morava em Neópolis. Ambos trabalhavam no centro, um na Deodoro outro na Princesa Isabel, a quinze metros um do outro, e nos mesmos horários. Apesar disto, ambos iam para o trabalho cada qual em seu carro, afinal, acho que pensavam, o que os colegas de trabalho iriam imaginar se os vissem chegando no escritório a pé. Em São Paulo mesmo quem tem um carro zero do ano reza para pegar um carona com alguém que vá para um destino próximo. Além de economizar gasolina, desafoga o trânsito. Depois se reclama que o trânsito natalense está ficando caótico...

Mas, o senso de coletividade não é uma das características do natalense. Basta observar o número de veículos estacionados ocupando duas vagas. Em shoppings, estacionamentos privados, bares, restaurantes... é chique para o natalense impedir que outro motorista ocupe a vaga ao lado.

Um amigo que conhece bem outras capitais nordestina, tais como Recife e Fortaleza, jura de pés juntos que Natal é a recordista mundial em babacas que postam veículos em bares e lanchonetes e abrem o porta malas do carro para irradiar as novas pérolas de Calcinha Preta, Raparigueiros do Forró e Chibata Nela. E ai de quem se atrever a questionar o som alto. os próprios donos dos estabelecimentos parecem não gostar de quem critique este abuso.

Definitivamente, o natalense é um bicho estranho, que se arruma para andar na areia da praia, se orgulha de ter sua cultura influenciada por soldados norte-americanos e paga fortunas para cantores e cantoras de outros estados enquanto negligencia os artistas locais. E o natalense ainda faz piada dos bravos mossoroenses, que expulsaram Lampião de seus domínios e libertaram os escravos antes de todo o resto do país.

Cefas Carvalho

por Alma do Beco | 6:20 PM | | Ou aqui: 0




quarta-feira, julho 25, 2007

AMAR ABSURDOS

Marcus Ottoni


"Sobre a informação de um diretor da TAM acerca de um dos reversos da turbina, que foi divulgada pelo Jornal Nacional da TV Globo e que tanta polêmica gerou dando uma justificativa ao governo, posso afirmar – pois sou testemunha – que um alto personagem do governo contatou a alta direção da empresa (TAM) dizendo que ou eles davam uma boa saída ao governo, ou ele (alto personagem), garantia que baixada a poeira, o governo iria quebrar a TAM"

César Maia, prefeito da cidade do Rio de Janeiro



Vilmaci Viana



O DIA EM QUE UM ATOR RASGOU SHAKESPEARE

Um bêbado trajando luto me lembrou Carlitos. Inebriado por vinho barato e dando vida a poemas de Paulo Augusto e Cefas Carvalho, entrou em transe. E no transe se fez nu, e nu, se fez bicha.

No V Sarau da Aliança Francesa tivemos mais uma vez a presença do ator Rodrigo Bico, que encarnando as transformações dos poetas - a conversão gay de um e os estilhaços do outro – encantou a platéia que mais uma vez entrou nos versos embalada por sua expressão corporal violenta e sua voz poderosa. E como se não bastasse, foi dirigido por ninguém mais ninguém menos que Cláudia Magalhães.

Uma esfera nostálgica miscigenando os tesões do amor homossexual e do amor heterossexual dos que entregam a alma, amparada por uma vitrola, cigarros, álcool, vinis e ... livros premiou a noite. Livros obsessivamente organizados lado a lado, enfileirados, protegidos pelo tapete vermelho, pela boca vermelha, pela língua vermelha.

E a bicha se vai e incorpora o macho, e o macho ama absurdos. Só quem ama absurdos sabe o que é amar absurdos. E só poetas escrevem o amor absurdo. E só atores traduzem o amor absurdo. E só uma poesia de quem ama absurdos, revelada por um ator que ama absurdos que foi dirigida por uma atriz que ama absurdos pode falar de amor com propriedade.

E nos ‘Estilhaços’ de Cefas Carvalho, Rodrigo Bico mergulha, seus espíritos se trocam e num rompante, um livro é escolhido e amassado, rasgado, jogado longe, numa despedida do passado que só quem ama absurdos consegue fazer.

E o livro, pertencente a Cefas, era uma edição bilíngüe impressa em Portugal de Romeu e Julieta, de Shakespeare. E isso não estava no script. Mas entre tantos outros, o destino escolheu esse. O mais belo, o mais raro, o predileto, o irrecuperável. Tinha que ser esse, tinha que ser Romeu e Julieta, tinha que ser Shakespeare.

Para viver um grande amor há que se pagar um alto preço.


Meire Gomes


Estilhaços

Rasguei o passado, rompi os tratados

Icei âncora e naveguei em mares nunca

Antes navegados

Rasguei os diários, os relatos

Destruí os sonetos

Lancei por terra papéis, porta-retratos

Projetos, sonhos mal feitos

Atirei pela janela as contas

As malas já prontas

Os manuais de instrução

Quebrei o interfone, o portão

As boas intenções

Queimei o livro dos sermões, os cordéis

Estilhacei cartas, papéis

Destruí minhas alianças, meus anéis

Investi contra moinhos, mapeei

Novos caminhos

Da lei, fiz só rascunhos

Destruí com os meus punhos

Meus totens tão mesquinhos

Amassei os versos, parti espelhos

Engoli os verbos, fiquei de joelhos

Abri mapas, fechei portas

Escrevi torto por linhas tortas

Por você…


Cefas Carvalho

por Alma do Beco | 9:37 AM | | Ou aqui: 0




segunda-feira, julho 16, 2007

CÂMERA LENTA

Marcus Ottoni


ÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚ !!!!!!!
90 mil pessoas no Maracanã, sempre que o nome de Lula era pronunciado na abertura do PAN, sexta-feira passada.

Alexandro Gurgel Nei Leandro e Civone Medeiros

em câmera lenta

o ar aquareliza-se em cinzentos
os verdes envelhecem de repente
o rubro do sobrado se anemiza
a tarde por inteiro empalidece

os pássaros mais cedo se recolhem
e um falso sossego prenuncia
o instante que desata a tempestade

Márcia Maia

Nem com muitos, nem comigo...


nem com muitos, nem comigo:

há dias de não me ser.

o mais feroz inimigo

bem dentro de mim trazer.

em nada sentir prazer,

ver na beleza castigo,

vou à luta e não consigo

eu esse que sou vencer.

nada diz o que me digo,

nem nada falta dizer.


Antoniel Campos

O baleiro do Cine Bangu

Escurinho do cinema, década de cinqüenta. Na tela o filme passava normalmente, na platéia ouvia-se um gritodiscreto quase sussurrando: baleiro..bala...baleiro...balas Ruth... olha a goma!Fazia-se então um silêncio por uns dez ou quinze minutos e de repente via-se o vulto do vendedor de balas passando devagar e voltava com seu pregão: baleiro...bala...balas Ruth...goma...olha a goma!

A maioria dos cinemas não tinha bar para vender pipoca ou doces, e a figura do vendedor de balas andando pela sala, era certa.

De vez enquanto, um pequeno tumulto: na tela um filme de suspense e na melhor cena onde o som era importante dentro da cena, ouvia-se aquele pregão: baleiro..balas Ruth!

-Cala a boca guri!

O vendedor de balas se calava e desaparecia na escuridão para voltar mais tarde com o seu pregão.

Um colega de escola era um desses vendedores de balas e me convidou para ser baleiro. Ele me convenceu com um argumento infalível: podia ver todos os filmes e seriados de graça.Não precisou falar duas vezes.

O grande problema era convencer minha mãe.

-Vender bala no cinema? Não. Não e não.Onde já se viu isso? Um menino de dez anos em vez de estudar vender bala no cinema?

-Mãe, eu vou ver todos os filmes de graça e é só final de semana.

Diante disso- de que era só no final de semana - e ela não precisava se preocupar com o dinheiro da entrada....

-Você jura que é só no final de semana?

-Juro.Pergunta ao Beto, foi ele quem me arranjou.

-Ora, logo quem? O Beto, com aquela cara de santinho barroco?

-Eu juro.Quem sabe o dono não deixa a senhora entrar de graça?

Peguei pesado.Grande chantagem com dona Belaniza, minha mãe.Ela pensou, titubeou, e não deu outra.

-Está bem. Você ganha algum dinheiro com isso?

-Ganho.

-Está bem pode ir, mas é só no final de semana.

Saí pulando de alegria.Já pensou? Ver filmes de graça? E o seriado: Ayooo... Silver! Lá ia o Zorro em cima de seu cavalo Silver, e o índio - Tonto - que era seu companheiro inseparável, O Homem Aranha, e os desenhos animados? E os filmes proibidos?

No dia marcado minha mãe me arrumou todo, roupa limpa e perfumado, estava mais perfumado do que filho de barbeiro.

Apresento-me ao dono do cinema que me apresenta um tabuleiro cheio de balas.

O tabuleiro era de vime, desses que se pendura no pescoço com uma alça de pano.

Era bem sortido, com vários tipos de balas, mas na época a mais famosa era as tais balas Ruth, as que vendiam mais, pois faziam muito "reclame" no rádio.

Lá vou eu. De inicio um pouco inibido, eu prestava mais atenção ao filme do que apregoava a venda das balas; na realidade eu passeava pela sala de projeção sem gritar até que um dado momento o lanterninha me disse que o dono queria falar comigo.

-Carlinhos , disse o gerente dirigindo-se a mim: você tem que anunciar que está vendendo balas, não é só passear pela sala, se você não gritar, ninguém vai saber o que você está fazendo ali. Grita Carlinhos.Grita, que você vende.

-Posso gritar?Pergunto.

-Pode. - responde, o dono.

Encostei-me atrás das últimas cadeiras, tomei coragem e fui em frente.

-Alô. Bala... baleiro... baleiro, bala! Tá docinha que tá danada.Vai de bala aí, senhor? E a senhora, vai de bala? Alô... baleiro, bala.

Desandei a falar pelos cotovelos.

Eu pensei: está tudo no escuro, ninguém sabe quem eu sou.Lá vou.

Inventei um pregão diferente achando que estava abafando, falava rápido, mas baixinho para não incomodar.

De vez enquanto alguém me chamava e comprava balas.

Isto durou dois fins de semana mais num belo sábado, durante a projeção de um filme de horror, eu todo compenetrado como o baleiro do cinema Bangu, realizando meus sonhos- ver filmes de graça e ver até filme proibido, quando...

-Baleiro, bala...baleiro...vai de Ruth, senhor?

E o filme lá no telão quadrado.Quando, de repente, alguém grita: ô guri chato pára com esta cantoria!!!

Houve aquele silencio.Aquilo para mim foi a maior vergonha ser chamado atenção quando estava trabalhando, vendendo minhas balas.

Fui de mansinho lá para os fundos do cinema, no escuro ninguém me via, mas a impressão que eu tinha era de que todos me olhavam.

Fiquei decepcionado com a platéia. Pensei: vou me vingar.

Em dado momento, no melhor do filme, na hora mais emocionante (eu conhecia o filme) enchi os pulmões e berrei com tudo que tinha dentro de mim:

BALEIIIIROOO!!! QUEM VAI DE BALA!! BALEIIIROOO!!!

Saí gritando pelo salão adentro e ainda parava na frente de todo mundo.

Foi um Deus nos acuda, nunca vi tanto palavrão como naquele dia, coitada da minha mãe, ainda bem que ela não soube.

Era assobio e neguinho gritando: cai fora guri, vai vender bala lá na rua, e aí é que eu gritava mais ainda; foi a maior guerra de berro.

O dono do cinema acendeu as luzes e lá estava eu, em frente a uma platéia de cinéfilos a gritar comigo, e eu com aquela cara de garoto de dez anos, espantado, mas não com medo.

-Tira este guri daqui, ô seu Manoel.

Seu Manoel, o dono do cinema, foi lá e me arrastou delicadamente para fora da sala de exibição. E a sessão continuou normalmente, mas sem o baleiro mor do cinema Bangu.

Carlos Tourinho

O quente banheiro do Bar de Nazaré

Leonardo Sodré
Leosodre1@yahoo. com.br

O banheiro do Bar de Nazaré já protagonizou várias histórias engraçadas. Houve um tempo em que um desenhista misterioso resolveu fazer um mapa de um Brasil Erótico – e olhe que naquele tempo ainda nem tinham tantos escândalos -, desenhando minúsculas figuras da genitália feminina na parede leste do banheiro. As figuras, superpostas ou bem juntinhas, eram compostas por apenas sete pentelhos, numa organização de fazer gosto a qualquer gestor. Mas, essa brincadeira quase provocou mortes, porque Nazaré andou uns tempos armadas com uma peixeira afiada dos dois lados em busca do “artista”, nunca descoberto nem no beco e tampouco nas adjacências.

Mas, o título tem a haver com o texto, porque o banheiro é “quente-pegando- fogo” e somente Tázia, a garçonete, consegue passar horas naquele forno, em demorados banhos “fazendo sei lá o quê”, como diria Dunga, agora um Cristão Novo nas hostes de Miguel Mossoró, a caminho da vereança e já com o saco do protetor do telefone celular devidamente grampeado.

O fato é que numa sexta-feira de chorinhos e muita conversa boa, que incluiu até charutos cubanos e outros comprados numa banca de macumba, diante de muitas cervejas, enquanto se falava em arte, poesia e na longevidade de certo Wolkswagen Santana 1989, que teima em permanecer vivo para deleite de alguns habitantes peçonhentos, alguns com mais de 20 anos de casa, como uma velha cobra papa-ovo, que mora por lá desde o tempo da reforma do muro do 16º Batalhão de Infantaria, fiquei adiando a vontade de verter água na sauna, digo, banheiro de Nazaré – que, diga-se de passagem, está sempre limpo – até não agüentar mais. Aí, fiz carreira em vão porque quando cheguei tinha alguém que estava demorando um bocado. Enquanto esperava na agonia pela abertura da porta, vendo a hora não conseguir me segurar, eis que chega o cineasta Lula Augusto, nas mesmas condições.

-Leo eu vou entrar primeiro porque estou que nem me agüento!

-De jeito nenhum! – retruquei – eu estou pior do que você. A mesa é testemunha.

Ele ficou calado coçando a barba e quando a porta se abriu, saiu uma moça de olhos arregalados pela nossa pressa, em passos de gueixa. Não teve esse negócio de entrar um primeiro do que o outro. Entramos os dois, lado a lado, ombro a ombro, como um atacante e um zagueiro em dia de jogo Brasil e Argentina. Nem nos lembramos de fechar a porta.

Quando estávamos em plena atividade de alívio, eis que entra de carreira o artista plástico e cronista Franklin Serrão, também no maior aperreio.

-O que é isso?

Respondi bem ligeiro para criar a confusão:

-Ora, Franklin, é um concurso...

Ele arregalou os olhos e disse:

-Deus me livre! – indo urinar tristemente no ralo onde escorre a água e o sabonete de Tázia, uma vez por dia.

Quando voltamos para a mesa, contamos, entre muitas gargalhadas, a história, e Sandrinha, muito séria, partiu em defesa de Serrão:

-... É, mas ele se garante!

Serrão tinha acabado de dar um trago no charuto cubano de Chagas Lourenço. Aliás, ele está viciado em fumar a “segunda” do charuto, que dá uma lombra danada, uns passamentos, umas tonturas, quando disse com um sorriso meio triste:

-É, né Sandrinha, é pequeno, mas funciona...



“Me tratam como um grande artista”

Fábio di Ojuara é um cara simples e querido por todos os artistas visuais do Rio Grande do Norte. Natural de Ceará-Mirim, já ousou em várias vertentes. Lançou um manual para cornos e criou o anárquico slogan ‘‘Toda merda agora é arte’’, que revirou o meio das artes plásticas natalenses recentemente. Há quatro meses está em Gmünd, a “cidade austríaca da arte”, participando de eventos internacionais como a feira Internacional Wassen Kraft. Nesse périplo rodou países do velho continente relizando performances inusitadas. Chamou particularmente a atenção dos visitantes da 52º Bienal Internacional de Veneza. Qundo voltar, não sabe ainda quando, tem vários projetos em mente. Um deles diz respeito a uma exposição com todo o material desta viagem. Pela Internet o Fábio relata ao Diário de Natal esta experiência como sendo ‘‘a mais importante da sua vida artística’’.

Diário de Natal - O que você está fazendo aí na Áustria?

Fábio di Ojuara - Estou aqui como artista internacional convidado da cidade de Gmünd, que é a cidade austríaca da arte, em 2007, para participar da feira internacional Wasser Kraft - Força da Água, que acontece anualmente no Estado da Caríntia (Karnten). Cheguei aqui no final de abril e vou ficar até julho. A minha vernissagem já está marcada para o dia 19 de julho e os convites já estão sendo enviados. O tema que escolhi foi voltado ao esqueleto do peixe e ao cavalo marinho, trabalhado dentro do contexto simbolico de ‘‘morte e vida’’.

Como surgiu este convite?

Um casal de amigos, que vão anualmente ao Brasil, Reinhard Schell (Engenheiro Civil) e Verônica Schell (Jornalista, formada pela UFRN, e atualmente minha Assessora de Comunicação na Europa) viram meus trabalhos, gostaram e me perguntaram se eu não teria interesse em participar de um evento internacional na Áustria. É claro que eu disse que sim. Depois disso, eles levaram o meu curriculum, e um catálogo com fotos das minhas obras, e entregaram à comissão organizadora do evento, para passar por uma avaliação. Pelo que me explicaram, a cidade de Gmünd, conhecida por suas constantes atividades artísticas, possui uma equipe de conselheiros, curadores, etc. E é essa equipe, notoriamente exigente, que escolhe os artistas que poderao participar das exposições. Fiquei esperando pela resposta e pensando se seria convidado, ou não, já que estaria concorrendo com artistas renomados do mundo inteiro, como por exemplo a artista Valerie Export, uma das participantes da Bienal Internacional de Veneza em 2007. Dois meses tive a alegria de receber um documento oficial da Secretaria de Cultura do Estado da Caríntia, convidando-me a morar por 3 meses em Gmünd, como artista internacional convidado. Tenho que dizer que estou tendo a honra de ser o primeiro artista brasileiro a participar da feira de arte Wasser Kraft da Áustria. Como sou um artista convidado, a cidade colocou à minha disposição um atelier, integrado a uma galeria, onde executo meus trabalhos, e um apartamento medieval super confortável, equipado com tudo o que eu preciso, e até com o que não preciso, como por exemplo máquina de lavar pratos (risos), com vista ao castelo da cidade, que é um dos mais visitados da Áustria. Quando acordo com o barulho do sino, olho pela janela e vejo o castelo, penso que estou num filme da idade média. Pela minha galeria passam em média 200 visitantes por dia. E, para minha felicidade, até agora só tenho recebido elogios pelo meu trabalho. Isso, vindo de pessoas que conhecem arte, é algo muito especial para mim e me gratifica muito.

Que tipos de trabalhos tem desenvolvido aí?

Estou participando da exposição com esculturas, pinturas e performances, que eu chamo de intervenções urbanas ou arte interativa. Mas, como sou um artista inquieto e provocante, não tenho me limitado a ficar só em Gmünd, tenho levado essas intervenções a cidades importantes. Abaixo, relato as duas intervencoes mais interessantes: Intervenção Urbana em Viena - Em Viena fiz uma itervenção urbana com o meu amigo Reihard Schell, na frente da catedral de São Estevão intitulada For Export. A obra teve duas vertentes: uma foi o problema dos estrangeiros ilegais, que a cada dia chegam à Áustria, e a outra foi a minha atividade como artista do Mail Art, pois nesse dia, acho que criei o primeiro Mail Art vivo da história. Por outro lado, geralmente os estrangeiros é que são mandados de volta aos seus países. No meu caso, eu empacotei um austríaco para exportação, coisa que ninguém nunca tinha imaginado. Essa arte interativa foi vista por centenas de transeuntes e gerou muitas indagações. No final, fomos muito aplaudidos. Em Veneza, realizei uma intervenção na 52º Bienal di Venezia, que considero bastante significativa: pintei uma tampa de vaso sanitário, com o slogan criado por mim ‘‘Now, every shit is art’’, conhecido em todo o mundo, e saí andando com ela na cabeça. Minha intenção não foi de maneira nenhuma criticar os artistas da exposição, mas sim levar o público a refletir sobre a crise de identidade que está ocorrendo no mundo da arte.
Creio que as pessoas entenderam minha mensagem, pois receberam essa ação com muito entusiasmo e simpatia. Até alguns funcionários da bienal me saudaram com ‘‘bravo’’ ou ‘‘ma che belo’’. Após o meu passeio pela bienal fomos a pé a praça São Marcos e de lá seguimos pelas principais ruas de Veneza. A reação do público foi incrível: todo mundo queria tirar uma foto comigo, até os famosos mascarados, que cobram para ser fotografados com os turistas, me chamavam para posar junto comigo. Foi uma loucuuuuura! !!! O pessoal que passava nas gôndolas e vaporetos (barcos coletivos) também não se continha: sacava as câmaras e me fotografava. Também vi algumas pessoas ligando pros amigos, só pra contar o que estavam vendo. Mais um mais engraçado foi quando um italiano passou correndo por nós (eu, Reinhard e Veronica) gritando com um sotaque engraçado: ‘‘Shuchesso, shuchesso!!’’ Registrei todos esses momentos, pois nunca tinha vivido algo tão tremendo.

Na abertura do Feira Internacional de Gmünd, Áustria apareci rolando uma bola, que representava a terra. O tema dessa intervenção foi ‘‘Buscando um lugar melhor para a terra’’ e quiz chamar a atenção para a destruição que o homem está causando ao nosso planeta. Fiz a bola totalmente irregular, de propósito, para mostar que a nossa terra não é mais a mesma. Todo mundo gostou da idéia, mas as crianças foram as mais entusiasmadas. Devido a essa intervenção, apareci em alguns jornais do Estado.

Qual a repercussão do meu trabalho junto ao público áustriaco

A repercussão tem sido a melhor possível. As pessoas aqui me tratam como um grande artista, mas principalmente com muito carinho e respeito. Até o Governador do Estado da Caríntia, Jorg Haider, que tem fama de não gostar de estrangeiro, quiz tirar foto com a minha primeira intervenção urbana aqui ‘‘Buscando um lugar melhor para a terra’’. Também estou vendendo bem as minhas obras e já tenho outros convites para voltar no próximo ano, para dar cursos de escultura em alumínio, participar de mais uma exposição e talvez até participar da Bienal da Áustria. Já recebi até convites para passar um período mais longo aqui, morar por algum tempo, mas isso é algo a se pensar com calma. No momento estou com o coração dividido entre o Brasil e a Áustria, esse país lindo, de pessoas que me receberam com muita hospitalidade. No geral as pessoas daqui não gostam muito de estrangeiros, mas em se tratando de Brasil, tudo é diferente. Eles adoram o nosso país e o nosso povo.

Como define essa experiência?

Como sendo uma experiência única e a mais importante da minha vida como artista. É como subir ao podium da arte internacional e eu estou, sem falsa modéstia, me sentindo um campeão, que tem a honra de representar o seu Estado, o seu país e a sua gente em outra terra. Quando me perguntam porque escolhi temas marinhos para a minha exposição, sempre falo da minha amada Natal, do meu querido Estado do Rio Grande do Norte e todos respondem dizendo que, sem dúvida, a arte brasileira está sendo muito bem representada na Feira Wasser Kraft, da Áustria. Na verdade essa minha proposta é algo conceitual e pode ser interpretada de diversas maneiras. O pessoal do Dadaísmo, por exemplo, já trabalhava essa lógica e muitos artistas utilizaram excrementos para compor trabalhos artísticos. O que eu fiz foi ressuscitar um conceito antigo e aplicar à situação atual. Ou seja: hoje em dia, qualquer pessoa pode fazer uns rabiscos na parede e dizer que é Arte. Ou então se jogar de um prédio, para pintar uma lona com o sangue do seu próprio corpo, dar um tiro no braço, etc., e afirmar que isso é Arte. É claro que isso tem um lado positivo, que é a liberdade de criação, mas por outro lado, alguns artistas fazem umas coisas sem sentido, até sem responsabilidade, vendem por milhões, e quase ninguém tem coragem de questionar o trabalho, por medo de ser visto como um ignorante cultural. Pra você ter uma idéia, já tem gente até afirmando que as artes plásticas só atestam sua própria condição de ‘‘a mais perdida e desnorteada de todas as artes”. Foi por isso que criei esse slogan, para fazer as pessoas pensarem, refletirem sobre a crise que a arte está vivendo atualmente e isso está surtindo efeito.

Qual a repercussão aí de ‘‘Toda Arte é Merda’’ na Europa ?

Aqui a repercussão tem sido das melhores. Hoje chegou uma holandesa, na minha galeria, viu a tampa do sanitário, que ocupa um lugar de honra lá, e disse: é verdade, a arte está perdendo sua identidade! Na Bienal de Veneza, a sensação que tive é que as pessoas estavam gritando junto comigo ‘‘Toda merda agora é arte’’. Até um doutor francês, colecionador de obras brasilieiras, me parou em frente do pavilhão brasileiro e pediu que eu lhe mandasse as fotos da minha intervenção (Dr. Dejacques). Creio que o sucesso de uma intervenção como essa se pode medir através da reação do público de rua e dos artistas. Aqui na Europa tenho tido a aprovação de ambos os lados. Tanto colegas, quanto pessoas não ligadas a arte, têm apoiado minha iniciativa. Enfim, estou recebendo um reconhecimento internacional, de pessoas que realmente entendem do que estao falando, pois convivem com o tema.

Quais seus planos quando voltar ao RN, se é que vais voltar?

A primeira coisa que quero fazer, quando voltar ao RN, é organizar uma amostra do meu material de viagem. Estou fotografando e filmando tudo o que acontece de interessante por aqui, e tenho certeza que muitas pessoas têm curiosidade de saber como é a vida na Europa, então não posso deixar de produzir essa pequena amostra. Os outros planos dizem respeito a arte potiguar, mas ainda estão sendo elaborados por mim e por outros parceiros aqui da Áustria. Tenho alguns projetos muito bons em mente, que beneficiaríam nosso Estado. Mas para que eles possam ser executados, preciso do apoio da iniciativa pública, iniciativa privada e de pessoas ligadas a arte. Como ainda não pude falar com ninguém daí, primeiro estou tentando firmar parcerias aqui, para depois levar as propostas ao Brasil. O que posso adiantar é que os projetos que estou elaborando deverão ter conexão direta com a Europa. No mais, vou continuar trabalhando, como sempre fiz, sem deixar de lado as experiências práticas que estou adquirindo aqui.

MOISÉS DE LIMA
DA EQUIPE DO DIÁRIO DE NATAL



DO PLURIPARTIDARISMO AO PODER
(O sonho que virou pesadelo)
(Um governo de Abutres Peculatários)

Estrela brasileira de norte a sul”...

Esta frase é o começo de um jingle de uma empresa de aviação aérea que eu ouvia quando criança no comecinho da década de setenta. Avião é hoje neste mundo globalizado não só um bicho de ferro que voa, mas é também o apelido de atravessadores, de pessoas que traficam drogas, que traficam cargos públicos, que traficam dinheiro público, e, mais do que nunca, é sinônimo de “apagão aéreo”.

O General Figueiredo, o “responsável” pela mudança do sistema militar para o sistema civil, gostava mais dos cavalos do que povo. Sarney, seu sucessor, chamava o povo da nação de “brasileiros e brasileiras”.

Contudo, tinha um gosto diferenciado pela literatura e tratava o povo como personagens de um romance literário. Collor, desde os primeiros comícios apareceu dizendo: “Minha gente”. Já tinha avião, então priorizou os carros, ou as carroças, como chamava-os. Por causa de um filho
bastardo venceu Lula em 89. Itamar, cheio de topete e dono da maior vaidade política moderna, resolveu dar seqüência a chinfrim administração de Collor, Trazendo de volta para os brasileiros o mais alemão dos carros, o Fusca, coisa parecida com a filosofia canina de Rogério Magri,
ex ministro do trabalho de Collor, quando evadira-se de um congresso para levar seu cachorro para passear, e disse a nação: “Meu cachorro é um ser humano como outro qualquer”. Pois é, somos tão cachorros, quanto à trajetória paradoxal da história que vou contar a vocês agora, leitores e eleitores.

O que eu preciso mesmo saber é onde estão os algozes de setenta. Os amigos de Médice e Geisel. Salvo Mário Henrique Simonsen e Mário Andreazza, dois Mários técnicos que não se envolveram diretamente com a ditadura militar, para mim, os outros foram comparsas. Golbery, era símbolo da mais dura repressão. Era dono do Itamaraty e do SNI, e de quase todos os famosos Atos Institucionais, inclusive o mais temido deles, o AI5. Sem falar em um outro General, o Cruz, muitos foram os protagonistas da ditadura mais fiel às regras das pseudo leis. Muitos foram, até os que não quiseram ser.

Por aqui, nesta hoje pós província efervescente, ainda existiam os homens biônicos. Eleição direta era só para centro cívico do colégio. Em 1978, eu tinha 16 anos, e participando das reuniões do Cine Clube Tirol na Fundação José Augusto, abracei, como todo jovem politizado da minha geração, um tema para lutar, uma bandeira para representar. Ainda no Marista, eu e colegas, dos quais alguns hoje são vereadores e deputados, fundamos o “Grupo Construção” de oposição a situação que sempre se elegia para o Centro Cívico. Vencemos as eleições e começamos a participar ativamente de todas as manifestantes reivindicações da época, Anistia Ampla Geral e Irrestrita, Eleições Diretas, Assembléia Nacional Constituinte, etc. Fizemos até excursão para visitar presos políticos em Itamaracá. Todas as causas foram conquistadas. Os presos de Itamaracá saíram justamente das grades para as salas burocráticas das administrações municipais, estaduais e federais. Era ético e politicamente correto um recém governador eleito pelo voto direto pós 64, prestigiar um homem que fora torturado pela repressão da ditadura militar nacional. Os exilados viraram deputados, ministros e senadores.

Um virou presidente por dois mandatos.

Com o advento do pluripartidarismo, aqui no RN, ainda prevalecia a forte marca da ARENA e do MDB. O PT, formado por dissidentes do MDB e do Partido Comunista(clandestino), caminhava de calça rasgada, camisa Hering e chinela de couro. Era quase lúdico. Aconteceram então as
primeiras eleições diretas para governador no Brasil depois de 64, em 1982. Aqui no RN, um Jovem que já tinha sido prefeito indicado (José Agripino), contrariando todas as expectativas das eventuais mudanças políticas, vencera Aluizio Alves, então dito representante das mudanças
conquistadas.Foi aí onde começaram as famigeradas coligações partidárias, a ferrugem que corrói o idealismo e a sensatez de uma luta.

Os donos dos dois únicos partidos legais que existiam, fundaram partidos menores com o intuito de angariar votos e mais votos.

Acredito que nesta época o PT sonhava o sonho lírico da conquista pela igualdade social, e não pelo nefasto poder. Penso que o PT hoje, está querendo que pessoas como nós que não têm mandatos, se esqueçam de que somos ainda muito mais fortes.

O jargão “Camarada” do movimento comunista, foi substituído pelo “Companheiro”. Era mais condizente com a proposta de um outro operário que elegera-se presidente da Polônia, e que não deu certo. Lula tem tudo para dar certo se parar de errar. É bem intencionado, mas sempre sem saber de nada vive cercado de Abutres Peculatários, de Neros modernosos queimando dinheiro público e lambuzando-se no doce mel do poder. Mas, o poder tem o poder de mudar sempre.

Não devemos desacreditar da luta, do sonho e da conquista, em detrimento de carreiristas que usam siglas partidárias para sugarem a história da conquista de um povo, que infelizmente ainda precisa aprender a votar melhor. Se Lula terminar este mandato sem realizar a reforma política, sempre continuará acontecendo no país o que aconteceu aqui em Natal recentemente.

Vão aparecer uns Júlios Protozoários votando contra a bandeira do próprio partido que dirige, porque o usou para apenas se eleger. E a filha de Carlos Alberto, outra dirigente da mesma sigla, foi tão omissa quanto Pilatos. Sem falar nos outros, dos outros partidos que tenho quase
certeza de que receberam folhas verdes de empresários especuladores para vetarem o Prefeito Carlos Eduardo.

Jânio Vidal tem razão, eles pensam que meio ambiente é ambiente pela metade.

Em meus solilóquios saudosistas resgato fatos e fotos da minha geração pós 64 que conquistou toda esta liberdade que hoje está invadida de aproveitadores sem vocação política nenhuma para exercer um mandato. Um político tem antes de tudo que ser um homem. Tem que ter humanismo. Em meus solilóquios saudosistas resgato a história desta geração que tirou os Generais do poder, e fico mesmo resgatado em minhas próprias aspirações, exilado de minha própria ideologia. A única coisa em que eu hoje acredito, é que o poder não foi feito para quem não pode. Agora, eu não tenho mais alegria, nem de fazer a hora, e nem de esperar acontecer.

Levamos o rei para o castelo e viramos súditos de mil impostos. Impostos que pagamos fielmente aos impostores.

Podem me chamar de sonhador, de altruísta, mas a culpa de tudo isto é minha que já sabia. Só os poetas vendem estrelas nas ruas.

Os políticos viram estrelas brasileiras de norte a sul. Estrelas vermelhas, talvez, estrelas com o sangue dos que padeceram em nome delas. O Brasil é mesmo uma aquarela de vinho tinto de sangue. De violência social, violência política, violência urbana, e de comandantes arbitrários.

Depois que o PT chegou ao poder, a única coisa de que ainda posso tirar proveito de uma vida de luta, é não precisar mais afastar de mim o cale-se, ou seja, a censura. O resto continua tudo como era antes na terra de Dante. Não por conformismo, mas por fidelidade ao idealismo, eu passo minha bandeira aos que estão chegando, eu já consegui por lá quem não deveria estar. Continuo órfão de credibilidade desde 1978 quando sonhei que poderia mudar o Brasil. O pior de tudo é que mesmo sendo de avião, já sei que esta é uma viagem sem volta. Hoje eu faço até tratamento psiquiátrico. Não consigo ouvir três palavras: Reacionário, companheiro e PT.

Mário Henrique Araújo
Músico, poeta, sonhador, funcionário público e
bipolar, em 11 de julho de 2007
mhda@ufrnet.br

por Alma do Beco | 7:42 AM | | Ou aqui: 0




domingo, julho 08, 2007

ENTREVISTA

Marcus Ottoni


"Cena política de Brasília exala um cheiro de m..."
Josias de Souza

Orf



FESTIVAL DO FORTE // GALERIA DO POVO (1977 - 1º de Outubro - 2007)
ENTREVISTA DE EDUARDO ALEXANDRE A FILIPE MARQUES MAMEDE GALVÃO


Filipe Galvão - Quem foi ou quem foram os idealizadores do festival?

Eduardo Alexandre - Numa tarde de 1978, chegou ao muro da Galeria do Povo, em exposição na Praia dos Artistas, o artista plástico paraibano Sandoval Fagundes, que, à época, morava em Natal e mantinha um ateliê na rua Padre Pinto. Conversamos e ele sugeriu que ampliássemos aquele movimento com música, teatro, dança, sugerindo a realização de um festival.

Topei de imediato contribuir com a idéia, e sugeri que o Festival, que se chamaria Festival de Artes do Natal, se realizasse na Fortaleza dos Reis Magos, daí ficar conhecido como Festival do Forte.


Filipe Galvão - Você se lembra do que 'tinha' no festival? Algum causo/anedota? Fale um pouco sobre isso?

Eduardo Alexandre - O primeiro foi de apenas um dia e foi realizado na Fortaleza, no dia 30 de dezembro de 1978. Já com música, artes plásticas, poesia, fotografia.

O segundo foi realizado no ano seguinte, também em um só dia, mas no Centro de Turismo, com uma produção praticamente solitária de Carlos Gurgel.

Em 1980 não houve festival, que voltou com força no ano seguinte, já com versão de três dias, e reunindo todas as artes. As exposições foram ampliadas e levadas agora às salas internas da edificação. Foi uma trabalheira colocar os quadros naquelas paredes de pedra.

No ano seguinte, 1982, iniciou-se um debate para criar-se ou uma cooperativa de artistas ou uma associação. Em 1984 já tínhamos a Cooperativa dos Artistas de Natal – Coart, dirigida por Chico Alves e a Associação dos Artistas Plásticos Profissionais do RN, presidida por mim, ambas com sede no Centro de Cultura, onde hoje funciona o Memorial Câmara Cascudo.

Nesse ano, vendo que o Forte já estava ficando pequeno para o público que a ele se dirigia, sugeri que a parte de espetáculos fosse realizada em um circo a ser montado diante do Forte, nas proximidades do Círculo Militar, mas a FJA, que tinha o Circo, deu parecer contrário, alegando que o solo arenoso e o vento não deixariam a lona em pé.

Os Festivais continuaram a ser realizados na Fortaleza por mais uns dois ou três anos, até ser levado para o Bosque dos Namorados e depois Cidade da Criança, onde foi realizada sua última versão.


Filipe Galvão - Quem era o público? Quais as influências políticas e culturais da época?

Eduardo Alexandre - O público era composto basicamente pela juventude, estudantes universitários e secundaristas, ávidos para mostrar e conhecer a produção artística que estava sendo feita em Natal.

Vivíamos tempos de ditadura e o movimento tendenciava ir de encontro àquela situação. Era um grito quase geral. A música brasileira era de muita criatividade e seus compositores faziam a cabeça da moçada contra aquela situação, que tinha n’O Pasquim uma trincheira de humorismo, informação e luta. O teatro também exercia reação, como boa parte da imprensa e da intelectualidade brasileiras. Era um tempo de muito inconformismo.


Filipe Galvão - O Festival, juntamente com a Galeria do Povo, era a tradução da contracultura local. Como você avalia esse tipo de iniciativa?

Eduardo Alexandre - Havia uma sede muito grande de se fazer algo, fazer aquela realidade mudar. O mundo inteiro estava passando por revoluções nos costumes, nas consciências, e era natural que isso desaguasse também em nossas terras. A liberdade que exercíamos na Galeria do Povo, contrariamente àquela repressão toda, era um apelo e um incentivo à grande participação que o movimento alcançou. Terra de poucos artistas até então, com a Galeria do Povo e os festivais, estes foram surgindo às dezenas, multiplicando-se em todas as áreas de manifestações artísticas.

Com a Galeria do Povo funcionando todos os finais de semana no local de maior afluência popular da cidade, que era a Praia dos Artistas, o surgimento de outros eventos ocorreu e muitos grupos se formaram a partir daqueles encontros de pé de calçada.


Filipe Galvão - Em relação à Galeria, quem eram os expositores? Qual a importância da Galeria na época? Quem freqüentava?

Eduardo Alexandre - Eu dizia à época que a Galeria do Povo surgira de uma necessidade de voz. Uma necessidade de se dizer em muro o que não se permitia dizer em jornais, censurados pela ditadura. Em abril de 1977, o presidente general Geisel fechou o Congresso Nacional e legislou por ele, causando grande revolta entre os cidadãos brasileiros. Naquele momento, foi que me veio o impulso de ir ao muro e protestar contra todo aquele absurdo. Comecei a preparar material para as primeiras exposições, a partir de oficinas que fazia no quintal lá de casa, com o pessoal da minha rua e adjacências do Tirol. O poeta Carlos Gurgel, quando iniciado o movimento em 1º de outubro daquele ano, teve uma importância fundamental, porque conhecia um maior número de pessoas ligadas à arte do que eu, egresso do jornalismo e de curso de Ciências Sociais. O repórter fotográfico Marcus Ottoni é outro nome que não pode ser esquecido nessa história, junto desde o princípio, documentando, e chegando a levar a Galeria do Povo ao Cruzeiro Novo, em Brasília, onde durante anos também funcionou.

Citar nomes num movimento grande como foi a Galeria do Povo é certeza de muita omissão. Mas lembro Fernando Gurgel, Assis Marinho, Novenil Barros, Nelson Quinderé, Nival Mendes, Ênio de Góes, João Natal (assinava João Maria, à época), Léo Sodré, Marcelo Fernandes, Marcelus Bob, Flávio Américo Novaes, Pedro Pereira, Valderedo Nunes, tantos, estes nas artes plásticas. Giovani Sérgio, Marcus Ottoni, Argemiro Lima, João Maria Alves, na fotografia foram alguns destaques. Marize Castro, Volontê, João da Rua, Flávio Resende, alguns dos poetas que mostraram ali seus versos pela primeira vez. Lembro também nomes como os de Sofia Gosson, Aluízio Matias, Dorian Lima, Venâncio Pinheiro, João Barra, Harrison Gurgel, Deoborah iskin Costa, hoje Milgran, Mário Henrique Araújo, Talvani Guedes da Fonseca, Jota Medeiros, Carlos Jucá, Alamilton Lima, Marconi Ginani, Carlos Astral, João Gothardo Emerenciano, os irmãos Lola, Fon, Eustáquio... É muito difícil lembrar de todos.

A Galeria proporcionou o encontro de toda essa gente, para realizar trabalhos coletivos ou individuais, o que fez crescer o movimento cultural da cidade. As exposições eram realizadas aos sábados e domingos a partir das 10h, e nós não repetíamos trabalho, obrigando o pessoal a produzir sempre, para que tivessem seus trabalhos expostos. As exposições eram, portanto, sempre diferentes, inéditas, e normalmente traziam uma palavra de ordem em forma de faixa de manifestação ou em letras recortadas de papel e afixadas ao muro. "Por uma Democracia Verdadeira, Por um Brasil Feliz!"; "Ao Povo Brasileiro, o Direito de Escolher os seus Próprios Destinos: Pela Convocação da Assembléia Constituinte!" Por exemplo.

A Galeria do Povo não era comercial: era um movimento que buscava mostrar a necessidade de união popular para combater aquela situação política adversa que o Brasil vivia. Chegamos inclusive a criar o Partido do Povo Brasileiro, depois registrado por um grupo que não oferecia a menor confiança, da mais legítima direita, a mando do então presidente Zé Sarney, que quis transformar o partido de sustentação da ditadura, a Arena, neste Partido do Povo Brasileiro que criamos aqui. O registro foi efetuado por um testa-de-ferro, a mando de Sarney.



Veja mais no:
O Bobo da Corte
www.eduardoalexandre.blogspot.com


por Alma do Beco | 7:09 AM | | Ou aqui: 0




sábado, julho 07, 2007

CHARUTO BABADO

Marcus Ottoni


"Sê sábia, ó minha dor, e queda-te mais quieta."
Charles Baudelaire

Hugo Macedo



Esperanto

Falo sua língua
Com meus dedos
Românticos, agressivos
Tímidos, nostálgicos
Perambulam, intercalam
Expressam e se calam
Fazem cair barreiras
Criam raízes profundas e rasteiras
Meus dedos
Sua língua,
Constante fusão.

Deborah Milgram


Linhas do mando

Não sigo as linhas do mando,
Nem mando as linha a seguir.


Sou ser.
Sou gente.
Presente da mãe-natureza,
Ciente,
Do seu bem-querer.

Bem quero.
Bem amo.
E ando
Sem me prevenir.

Apanho.
Não ganho.
Confesso:
Não sei se sei resistir !

Me armo de flores na mão.
No verso,
Eu sei,
Aqui não há solidão.

Há clima.
Há luta.
Esperança de não ser em vão
O canto,
A vida,
O dia de dor do poeta,
Dia de dor da canção !

Eduardo Alexandre

Fumaça sem fim

A festa era em torno de Dália, que havia chegado dos Estados Unidos, e de Ceiça, que vinha da Holanda. A mesa era grande e a alegria era total. Os assuntos giravam em torno da polêmica da entrevista de Chico Ivan para a Bruhaha e da peleja de dois becodalamenses em torno de algumas poucas fotos que foram enviadas para o grupo de discussão e brigas do Beco da Lama e das Adjacências.

Dália trouxe o seu caderno do tempo de colegial, onde ela faz anotações importantes de eventos vividos. Lá tem aquele festival de uodistoque, vários eventos políticos, festa dos 15 anos – organizada por Jota Epifânio -, uma ruma de coisas. Tem até charges de LeoSodré e poemas de Eduardo Alexandre.

A conversa girava solta, leve e plácida. Até que Chagas Lourenço resolveu fumar um charuto enorme, de fumaça azulada, densa e cheirosa. Daqueles que mesmo sem tragar dão uma lombra danada.

Cabrito encostou incólume, faceiro. Os olhos brilhavam em direção aos movimentos requintados que Chagas faz quando fuma um cubano de quase 60 dólares a unidade. Olhava para as mãos do poeta e seguia a fumaça com o nariz. Só não arrebitava mais as ventas porque choveu e ele teve medo de se afogar.

Do outro lado da mesa, Dália fazia sinais para mim. Ininteligíveis. Balançava o seu caderno preto e apontava para Chagas, que, calmo olhava a lua e tomava cerveja. Nem parecia o bebedor de aguardente das boas dos tempos do Beleléu, de Paulinho Sarkis, quando aparecia por lá para ver a garçonete Simone e tomar duas ou três. “Tomar uma é para amador”, sempre disse.

Os sinais de Dália não paravam. E eu não entendia nada.

Aos olhares cobiçosos de Cabrito, juntaram-se os de Franklin Serrão. Sandrinha, perspicaz, mandou o recado:

- Se der um trago nesse charuto babado, vai ficar um mês sem me beijar. Vou logo avisando.

Depois de quase duas horas, após o inevitável poema-música “Bobo da Corte”, Chagas resolve entregar o cotoco do charuto para Cabrito. Serrão ofereceu-se para mediar a entrega e aproveitou para dar um trago enorme. Tão grande, que caiu para trás na cadeira onde segundos antes o poeta Hugo Tavares estava sentado. Sandrinha afastou-se repugnada quando viu o estado da boca e dos olhos de Serrão, que, lombrado e tonto, olhava as estrelas e um pedaço de uma lua inexistente.

Cabrito fez pose de Cascudo para fumar o charuto. E, finalmente, Dália conseguiu me dizer o que queria com o caderno preto. Segui suas ordens. Não contei conversa, aprisionei a fumaça e a depositei no caderno, que, imediatamente, ficou lindo como um céu escuro. Cheiroso como uma penteadeira.

Leonardo Sodré



Orf

por Alma do Beco | 8:32 AM | | Ou aqui: 0




segunda-feira, julho 02, 2007

FICA A HISTÓRIA

Marcus Ottoni

"As penitenciárias estão explodindo de pobres e não vejo ninguém tomando as dores deles.”
Antonio Carlos Bigonha, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República


Ida e volta

Embarco
Seja para onde for
Levo comigo
Meu segredo, meu pecado
Meu amor
Sigo minha jornada,
Seja para onde for
Vem comigo
Minha sina,
Meu silêncio, minha dor
Fica no ar um sim
Contradizendo
Com a vontade de um não
Atravesso o ponto de saída
Longe, quase invisível,
Me espera, me convida
Desejado, cobiçado,
Procurado
Ponto de chegada.

Deborah Milgram


ISMAEL ALVES no projeto segunda solo

Nesta segunda-feira, 02 de julho, às 20h30, o compositor e letrista Ismael Alves se apresentará no Nalva Melo Café Salão, na retomada do projeto Segunda Solo.
Nalva Melo Café Salão fica na Rua Duque de Caxias, 110, Ribeira.
Informações: 3212-1655.
O show terá couvert artístico .


SOBRE ISMAEL ALVES

Ismael Alves, começou como cantor de músicas de carnaval em 1978 na cidade de São José de Mipibu, onde nasceu e viveu até os 23 anos. Em 1983 mudou-se para Parnamirim onde, após integrar uma Banda Baile, descobriu-se compositor.

Gravou 4 CD's: Estação do Sonho, Terra de Engenhos, Astro de Quimera e Vivências e possui vários trabalhos paralelos como Cantando com as Abelhas com o Grupo Colméia, Palavras onde musicou poesias de Uraquitan Lopes e vários outros.

Já Realizou a abertura dos shows de Geraldo Azevedo, Chico Cezar, Zé Geraldo e Flávio Venturini e participou de diversos festivais,inclusive no Rio Grande do Sul.

Ultimamente fez uma coletânea com vinte músicas e está preparando um CD para 2007 intitulado "Enigma das Estações" em parceria com Chico Morais – o parceiro mais freqüente.

A música de Ismael é Plural, não se limita a ritmos, harmonias ou a temas – embora seja mais evidente a temática social. O seu trabalho pode se enquadrar no que se chama MPB.



"Tudo isso o tempo diluiu.
Mas a história ficou..."


Os processos de (re)urbanizaçõ es, sempre norteados pela falta de memória que nos assola, dilapidam o depauperado patrimônio arquitetônico. Escrevi um texto preocupado como o futuro do velho Pontilhão da Praça Augusto Severo - "uma ponte para o passado"? Dias depois, os matutinos destacaram o tombamento (literal) da Ponte do Salgado. Imaginem como o rei vassalo Cascudo narraria ato tão bestial e cruento com nossa já usurpada história.

Na minha infância ribeirinha-salesian a, a Ponte despertava um enigma profundo: ligava nada a bulhufas, coisa nenhuma a non-nada. Seria agora mero elemento de ligação entre os tempos de efêmeras lembranças?

Ponte viva! Em arqueologia urbana, in loco constatei-a soerguida (entre amontoados de entulhos). Revisitei Cascudo num ponteofício cronológico.

Assim descrita em 1603, a par da cidade, uma campina alagada pelas marés do Potengi. As águas lavavam os pés dos morros, onde se tomava o banho salgado. Terreno ensopado, pantanoso, enlodado. A corrente de água viva obriga a existência de uma Ponte, simples de tronco de árvore, transposto em equilíbrio instável.

Desaparecera em 1604, quando um tal de Bernardo da Costa, "ambicionou" ser útil: "no rio desta cidade não há passagem certa como algum tempo houve e ser tão necessária como era para o povo, se quer ele suplicante obrigar a dita passagem"; dando-se o sítio por quatro vidas com seus logradouros para cultivar e plantar o que lhe parecer...

Intermitente e teimosa, ao labor dos movimentos incessantes das marés, a Ponte volta a ser mencionada em 1633, justamente onde "continua estando".

Acordando da letargia dos três séculos inerte, no bairro da Ribeira de 1878, "o oceano espraiava-se sobre plantas rasteiras, ficando ali as águas estagnadas como uma vasa lodacenta. Um istmo unia a Ribeira à cidade Alta, através de uma Ponte por baixo da qual as águas do mar atravessam um canal e vão derramar-se em uma extensa superfície, banhadas de águas salobras". Lugar em que Odorico Pelinca, esperava à hora de acompanhar o entregador de pães, mergulhando, nas madrugadas de luar, n’água salgada das enchentes.

No governo de Tavares de Lira, o pântano colonial que dera nome à Ribeira foi enfrentado. Herculano Ramos realizou o aterro e ajardinamento da Augusto Severo, em junho de 1904, gastou 62:446$86, mas o lamaçal desapareceu. "Cercado de calçadas, o lodo salgado foi aterrado pela areia alva dos morros". Herculano repetiu a façanha do conde Maurício de Nassau, transplantando árvores adultas e transformando o recanto melancólico num parque tropical cheio de sombras acolhedoras, bancos confortáveis, Pontes toscas ("pequenas pontes de cimento armado que dão passagem sobre o estreito canal"), graciosas alamedas, logradouro indispensável para as cidades de clima quente, repouso para as amplas insolações.

Escabreado, o Príncipe do Tirol, vaticinou: "Esse parque, maravilhoso de justiça urbanística, foi sendo pouco a pouco guerreado e acabou no que esta praça banal. Mutilado e sem função é um lugar por onde se passa e nada sugere parar e descansar". Na Natal, "cidade do já teve", o desmando com o destino do patrimônio coletivo permanece secularmente inalterado.

Pontilhão à mercê dos poderosos, alheios à recordação citadina. Numa alegoria hilária e sarcástica, no ano da graça de 1923, Lucas da Costa, desvenda o contexto de vicissitudes oligárquicas, tecendo carapuças para os fiéis "Attachés" dos Albuquerque- Maranhão:

"Disfarçam os governos em administradores modelos, falando às massas como exemplos de democracias, com o fim de alcançarem confiança e conseqüente continuação dos viciosos regimes... Disfarçam os militares impatriotas em garantidores das deturpadas e insustentáveis situações políticas... Disfarçam os tiranos em generosos cavalheiros, doutrinando a bondade como se fossem legitimo cultores desta religião... Disfarçam os torpes sedutores da honra em gente de linha e hierarquia para terem entrada no lar da família e na larga porta da sociedade... Disfarçam os ignorados impulsos os cidadãos honrados em vagabundos e traficantes freqüentadores de recantos... Disfarçam os cretinos em baluartes da justiça para ditarem nobres princípios às almas essencialmente moralizadas. .. Disfarçam, enfim, os infelizes que passam pelas avenidas, de cabeças erguidas, faceiros, alegres, enquanto a farpa mais aguda lhes pene".

Insisto, contra a corja desmemoriada, é preciso ficar atento, e destemido, forte! Receio que os vaidosos canalhocratas da atualidade, cheios de si, tentem subtrair do horizonte a Fortaleza dos Magos Reis, com o objetivo fútil de desnudar a paisagem para ressaltar o designer da nova Ponte Newton Navarro. Reavivar no Exercício da Palavra (1975) de Zila Mamede: A Ponte

salto esculpido
sobre o vão
do espaço
em chão
de pedra e aço
onde não
permaneço
- passo.


Plinio Sanderson

por Alma do Beco | 6:56 AM | | Ou aqui: 0


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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Contatos Imediatos

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Praieira
(Serenata do Pescador)


veja a letra aqui

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A imagem de fundo é do artista plástico e poeta Eduardo Alexandre©

layout by
mariza lourenço

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