segunda-feira, julho 30, 2007

PARÁGRAFO FINAL

Marcus Ottoni


"Não existe em toda região espaço mais livre e democrático que o Beco da Lama e adjacências."
Cristina Tinôco


"É possível que os membros da diretoria atual não estejam com tempo suficiente para se dedicar às relevantes questões culturais do Beco da Lama e das Adjacências."

Ivan Júnior

Karl Leite (Pratodomundo 2005)

Aspirações


Bem quisera

Ser eu a resposta

Clara, direta,

Total, completa

Bem quisera

Não saber a pergunta

Irrelevante, intolerante

Estonteante, fascinante

Bem quisera

Ser eu apenas eu

Despreparada

Desconcertada

Despenteada

Desenfreada

Desnorteada

Sensibilizando

Você e eu…


Deborah Milgram



Manifesto

PROPONDO O DEBATE E A SOLUÇÃO DEMOCRÁTICA


Preocupo-me com a apatia da SAMBA. Por isso, gostaria que os amigos da lista tentassem, como eu tentei até agora, lembrar qual o evento, reunião ou qualquer outra atividade, que ocorreu durante o ano de 2007, por iniciativa da nossa sociedade. Lembrar o Carnaval não vale, porque foi uma iniciativa da Prefeitura Municipal de Natal. Não nos lembramos porque simplesmente não aconteceu nada.

A diretoria da SAMBA, precisa, no mínimo, fazer uma reflexão e promover um debate aberto em torno do assunto. E, se for o caso, antecipar (se possível for) as eleições, abrindo espaço para formação de uma nova diretoria. Porque é possível que os membros da diretoria atual não estejam com tempo suficiente para se dedicar às relevantes questões culturais do Beco da Lama e das Adjacências. Ora, acredito que existam bons companheiros dispostos a tocar a entidade. Poderemos entender os vários motivos que fizeram a SAMBA parar, é necessário apenas que eles sejam informados e isso não significará nenhum desgaste à diretoria atual, que no momento está ausente.

O Beco é criativo. Aí está o chorinho (voluntário) de Camilo & Cia, pegando legal. E a Samba, que tem diretoria específica nem divulga que essa atividade existe no Beco. Uma pena, não?

Tem muita gente de valor, pessoas boas, bem intencionadas e inteligentes na diretoria comandada pelo professor Bira. Cito Dorian Lima, Júlio Pimenta, Civone Medeiros, entre outros que não lembro agora. Infelizmente, e mesmo assim, a SAMBA não funciona.

Pelo debate, pelo diálogo e rápida solução.

Em favor da SAMBA,


Ivan Júnior



Gatos de becos

Sexta-feira, dez da noite. A cena urbana alternativa do velho centro da cidade atinge seu nível máximo de ebulição. O grupo de chorinho, depois de cumprir voluntariamente seu expediente, dá lugar ao samba e a moçada solta o quadril mostrando todo o molejo brasileiro. Casais trocam juras de amor pós-moderno sabendo que aquela emoção será tão breve e intensa quanto eterno possa parecer o momento; talvez exatamente longo o suficiente para ser gasto no balanço das horas de uma noite. Amigos de mesa e de bar discutem calorosamente os últimos acontecimentos políticos, tentando, com o poder das suas metralhadoras verborrágicas, inocentar seus partidos simpatizantes. Nas rodas de conversas os temas variavam entre as produções culturais da cidade e alhures, fatos do dia-a-dia e outros bem mais pessoais, cochichados baixinho, entre trocas de carinho.

A menina rica e a menina de rua são vistas freqüentando o mesmo território. Afinal, não existe em toda região espaço mais livre e democrático que o Beco da Lama e adjacências, mas, independentemente da vizinhança encontram motivos para divergências. Quem sabe o mesmo gato estava sendo cortejado pelas felinas, quer dizer, meninas? Não sabemos exatamente qual, mas as diferenças foram tantas que pareceram gritar insultando as carências da menina de rua. Ela, a seu turno, deixando-se vencer pelos apelos dos seus demônios interiores, lança mão das armas que dispõe naquele instante: seu rico acervo de palavras chulas e uma mísera garrafa quebrada. A cena começa a ficar emocionante. Por segundos imagino uma arena romana e gladiadores debatendo-se nela. A galera vai ao delírio com os avanços e recuos de cada parte. A turma do deixa pra lá entra em ação e uma negociação começa a ser desenvolvida. Paralelo ao evento os grupos começam a se dispersar. Os mais temerosos vão saindo de fininho, bem à francesa, para não chamar atenção.

Nossa conversa, que versava em torno da antiga e protelada revitalização do velho centro da cidade, aos poucos vai se configurando como parágrafo final. Antes, contudo, lembramos que, no entorno daqueles becos encontram-se edificações que abrigam organismos de poder tais como: a Prefeitura, a Assembléia Legislativa e o Palácio da Cultura, antigo palácio do Governo, agora órgão da Fundação José Augusto, principal entidade cultural do nosso Estado. Todas elas instituições que, de uma forma ou de outra, poderiam estar envolvidas em alguma iniciativa em prol da recuperação daquele espaço.


Despedi-me dos companheiros de conversas na calçada me sentindo quase uma vira-lata, pela proximidade com alguns sacos de lixo de odor indecifrável. Acompanhou meus passos o burburinho das conversas ainda exaltadas. Imaginei Chico Science, lá do céu dos músicos fazendo uma versão para a ocasião: "...da lama ao caos, do caos à lama, nos Becos do Centro tudo se inflama...", e os insultos da pobre menina de rua para a também pobre menina de família. Como fundo musical para o episódio da noite, depois de Chico ter concluído seu repente, entrou Vanessa da Mata ressuscitando outro Chico, desta feita o Buarque, com seu antigo sucesso "Os Saltibancos". E a musiqueta ecoava assim: "Nós gatos já nascemos pobres, porém já nascemos livres. Senhor, senhora, senhorinha...."


Ana Cristina Cavalcanti Tinoco



O natalense, este bicho esquisito...


Meu pai, o saudoso escritor e publicitário Padre Zé Luiz, costumava brincar dizendo que o natalense era um bicho esquisito. Talvez mais que o mossoroense, que, por viver em outro país (o País de Mossoró, tão mítico quanto Passárgada) tem reconhecidamente hábitos e idiossincrasias diferentes dos norte-riograndenses e brasileiros. Contudo, os nascidos e moradores da Cidade do Sol possuem características estranhas, dignas de serem estudadas pela antropologia.

Começa que, como sentenciava Zé Luiz, o natalense não gosta de ganhar dinheiro. Há inclusive uma frase famosa, atribuída ao jornalista Cassiano Arruda Câmara, que reza que "o natalense gasta 200 para o outro não ganhar 20". Recordo que na minha infância, lá pelo início dos anos 80, saíamos em família para almoçar fora aos domingos. Qual não foi nossa surpresa quando uma vez nos deparamos com um cartaz na porta de um restaurante: “Fechado para almoço”. Quantas outras vezes aos domingos não saíamos para jantar o os restaurantes fechavam às oito da noite.

Sobre essa vocação natalense, vivi história igualmente curiosa dia desses. Perto de minha casa há uma lanchonete que freqüento há cerca de um ano. Embora o dono – um senhor bigodudo com ares de português – não seja um exemplo de simpatia, resmungava um bom dia quando eu aparecia lá para degustar a especialidade da casa: salgado + suco por um real. Em um belo dia, desejoso de tomar um café preto, perguntei a ele se não poderia substituir o suco por um café. O homem respondeu que não, que o café custava 70 centavos e o salgado fora da promoção, 80, totalizando 1 real e 50. Argumentei que nem precisava ser um copo abarrotado de café. Bastava uma xicara pequena. Ele respondeu que o café pequeno custava 30 centavos. Com mais 80 do salgado, 1 real e 10. Tentei explicar que ele ganharia mais dinheiro comigo se eu bebesse uma xicrinha de café (mais um salgado) a um real do que bebendo um suco - em copo grande - de acerola ou cajá (mais o salgado) pelo mesmo um real. O homem se invocou e, me olhando como se eu quisesse enrola-lo, sentenciou que somente a promoção suco-salgado era um real. Se eu quisesse o café, que pagasse a mais. Não contei conversa. Atravessei a rua e fui para a lanchonete do outro lado, onde o café pequeno era 20 centavos e a coxinha saiu por 70 centavos, totalizando 90 centavos, claro. Achei curioso como o bigodudo perdia um cliente fiel por um café (ou uma diferença de dez centavos). Definitivamente, aquele comerciante não gosta de ganhar dinheiro.

O natalense também tem particularidades curiosas, como o fato de se enxergar com mais glamour que os demais nordestinos. Isso não quer dizer bairrismo. Cearenses e pernambucanos dão um banho em nós em se tratando de valorizar as coisas da terra onde se nasce. É que o natalense no fundo se considera um lorde inglês, mais ou menos como um argentino se sente em relação aos demais latino-americanos. O natalense médio (principalmente da famigerada classe média, claro) tem sempre que estar bem arrumado, endinheirado e automotivo. Natal é uma cidade onde não possuir um carro é quase um crime de lesa-capital.

Recordo, por exemplo, de um casal amigo meu que morava em Neópolis. Ambos trabalhavam no centro, um na Deodoro outro na Princesa Isabel, a quinze metros um do outro, e nos mesmos horários. Apesar disto, ambos iam para o trabalho cada qual em seu carro, afinal, acho que pensavam, o que os colegas de trabalho iriam imaginar se os vissem chegando no escritório a pé. Em São Paulo mesmo quem tem um carro zero do ano reza para pegar um carona com alguém que vá para um destino próximo. Além de economizar gasolina, desafoga o trânsito. Depois se reclama que o trânsito natalense está ficando caótico...

Mas, o senso de coletividade não é uma das características do natalense. Basta observar o número de veículos estacionados ocupando duas vagas. Em shoppings, estacionamentos privados, bares, restaurantes... é chique para o natalense impedir que outro motorista ocupe a vaga ao lado.

Um amigo que conhece bem outras capitais nordestina, tais como Recife e Fortaleza, jura de pés juntos que Natal é a recordista mundial em babacas que postam veículos em bares e lanchonetes e abrem o porta malas do carro para irradiar as novas pérolas de Calcinha Preta, Raparigueiros do Forró e Chibata Nela. E ai de quem se atrever a questionar o som alto. os próprios donos dos estabelecimentos parecem não gostar de quem critique este abuso.

Definitivamente, o natalense é um bicho estranho, que se arruma para andar na areia da praia, se orgulha de ter sua cultura influenciada por soldados norte-americanos e paga fortunas para cantores e cantoras de outros estados enquanto negligencia os artistas locais. E o natalense ainda faz piada dos bravos mossoroenses, que expulsaram Lampião de seus domínios e libertaram os escravos antes de todo o resto do país.

Cefas Carvalho

por Alma do Beco | 6:20 PM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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Praieira
(Serenata do Pescador)


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A imagem de fundo é do artista plástico e poeta Eduardo Alexandre©

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