ÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚÚ !!!!!!!
90 mil pessoas no Maracanã, sempre que o nome de Lula era pronunciado na abertura do PAN, sexta-feira passada.
Alexandro Gurgel Nei Leandro e Civone Medeiros
em câmera lenta
o ar aquareliza-se em cinzentos
os verdes envelhecem de repente
o rubro do sobrado se anemiza
a tarde por inteiro empalidece
os pássaros mais cedo se recolhem
e um falso sossego prenuncia
o instante que desata a tempestade
Márcia Maia
Nem com muitos, nem comigo...
nem com muitos, nem comigo:
há dias de não me ser.
o mais feroz inimigo
bem dentro de mim trazer.
em nada sentir prazer,
ver na beleza castigo,
vou à luta e não consigo
eu esse que sou vencer.
nada diz o que me digo,
nem nada falta dizer.
Antoniel Campos
O baleiro do Cine Bangu
Escurinho do cinema, década de cinqüenta. Na tela o filme passava normalmente, na platéia ouvia-se um gritodiscreto quase sussurrando: baleiro..bala...baleiro...balas Ruth... olha a goma!Fazia-se então um silêncio por uns dez ou quinze minutos e de repente via-se o vulto do vendedor de balas passando devagar e voltava com seu pregão: baleiro...bala...balas Ruth...goma...olha a goma!
A maioria dos cinemas não tinha bar para vender pipoca ou doces, e a figura do vendedor de balas andando pela sala, era certa.
De vez enquanto, um pequeno tumulto: na tela um filme de suspense e na melhor cena onde o som era importante dentro da cena, ouvia-se aquele pregão: baleiro..balas Ruth!
-Cala a boca guri!
O vendedor de balas se calava e desaparecia na escuridão para voltar mais tarde com o seu pregão.
Um colega de escola era um desses vendedores de balas e me convidou para ser baleiro. Ele me convenceu com um argumento infalível: podia ver todos os filmes e seriados de graça.Não precisou falar duas vezes.
O grande problema era convencer minha mãe.
-Vender bala no cinema? Não. Não e não.Onde já se viu isso? Um menino de dez anos em vez de estudar vender bala no cinema?
-Mãe, eu vou ver todos os filmes de graça e é só final de semana.
Diante disso- de que era só no final de semana - e ela não precisava se preocupar com o dinheiro da entrada....
-Você jura que é só no final de semana?
-Juro.Pergunta ao Beto, foi ele quem me arranjou.
-Ora, logo quem? O Beto, com aquela cara de santinho barroco?
-Eu juro.Quem sabe o dono não deixa a senhora entrar de graça?
Peguei pesado.Grande chantagem com dona Belaniza, minha mãe.Ela pensou, titubeou, e não deu outra.
-Está bem. Você ganha algum dinheiro com isso?
-Ganho.
-Está bem pode ir, mas é só no final de semana.
Saí pulando de alegria.Já pensou? Ver filmes de graça? E o seriado: Ayooo... Silver! Lá ia o Zorro em cima de seu cavalo Silver, e o índio - Tonto - que era seu companheiro inseparável, O Homem Aranha, e os desenhos animados? E os filmes proibidos?
No dia marcado minha mãe me arrumou todo, roupa limpa e perfumado, estava mais perfumado do que filho de barbeiro.
Apresento-me ao dono do cinema que me apresenta um tabuleiro cheio de balas.
O tabuleiro era de vime, desses que se pendura no pescoço com uma alça de pano.
Era bem sortido, com vários tipos de balas, mas na época a mais famosa era as tais balas Ruth, as que vendiam mais, pois faziam muito "reclame" no rádio.
Lá vou eu. De inicio um pouco inibido, eu prestava mais atenção ao filme do que apregoava a venda das balas; na realidade eu passeava pela sala de projeção sem gritar até que um dado momento o lanterninha me disse que o dono queria falar comigo.
-Carlinhos , disse o gerente dirigindo-se a mim: você tem que anunciar que está vendendo balas, não é só passear pela sala, se você não gritar, ninguém vai saber o que você está fazendo ali. Grita Carlinhos.Grita, que você vende.
-Posso gritar?Pergunto.
-Pode. - responde, o dono.
Encostei-me atrás das últimas cadeiras, tomei coragem e fui em frente.
-Alô. Bala... baleiro... baleiro, bala! Tá docinha que tá danada.Vai de bala aí, senhor? E a senhora, vai de bala? Alô... baleiro, bala.
Desandei a falar pelos cotovelos.
Eu pensei: está tudo no escuro, ninguém sabe quem eu sou.Lá vou.
Inventei um pregão diferente achando que estava abafando, falava rápido, mas baixinho para não incomodar.
De vez enquanto alguém me chamava e comprava balas.
Isto durou dois fins de semana mais num belo sábado, durante a projeção de um filme de horror, eu todo compenetrado como o baleiro do cinema Bangu, realizando meus sonhos- ver filmes de graça e ver até filme proibido, quando...
-Baleiro, bala...baleiro...vai de Ruth, senhor?
E o filme lá no telão quadrado.Quando, de repente, alguém grita: ô guri chato pára com esta cantoria!!!
Houve aquele silencio.Aquilo para mim foi a maior vergonha ser chamado atenção quando estava trabalhando, vendendo minhas balas.
Fui de mansinho lá para os fundos do cinema, no escuro ninguém me via, mas a impressão que eu tinha era de que todos me olhavam.
Fiquei decepcionado com a platéia. Pensei: vou me vingar.
Em dado momento, no melhor do filme, na hora mais emocionante (eu conhecia o filme) enchi os pulmões e berrei com tudo que tinha dentro de mim:
BALEIIIIROOO!!! QUEM VAI DE BALA!! BALEIIIROOO!!!
Saí gritando pelo salão adentro e ainda parava na frente de todo mundo.
Foi um Deus nos acuda, nunca vi tanto palavrão como naquele dia, coitada da minha mãe, ainda bem que ela não soube.
Era assobio e neguinho gritando: cai fora guri, vai vender bala lá na rua, e aí é que eu gritava mais ainda; foi a maior guerra de berro.
O dono do cinema acendeu as luzes e lá estava eu, em frente a uma platéia de cinéfilos a gritar comigo, e eu com aquela cara de garoto de dez anos, espantado, mas não com medo.
-Tira este guri daqui, ô seu Manoel.
Seu Manoel, o dono do cinema, foi lá e me arrastou delicadamente para fora da sala de exibição. E a sessão continuou normalmente, mas sem o baleiro mor do cinema Bangu.
Carlos Tourinho
O quente banheiro do Bar de Nazaré
Leonardo Sodré
Leosodre1@yahoo. com.br
O banheiro do Bar de Nazaré já protagonizou várias histórias engraçadas. Houve um tempo em que um desenhista misterioso resolveu fazer um mapa de um Brasil Erótico – e olhe que naquele tempo ainda nem tinham tantos escândalos -, desenhando minúsculas figuras da genitália feminina na parede leste do banheiro. As figuras, superpostas ou bem juntinhas, eram compostas por apenas sete pentelhos, numa organização de fazer gosto a qualquer gestor. Mas, essa brincadeira quase provocou mortes, porque Nazaré andou uns tempos armadas com uma peixeira afiada dos dois lados em busca do “artista”, nunca descoberto nem no beco e tampouco nas adjacências.
Mas, o título tem a haver com o texto, porque o banheiro é “quente-pegando- fogo” e somente Tázia, a garçonete, consegue passar horas naquele forno, em demorados banhos “fazendo sei lá o quê”, como diria Dunga, agora um Cristão Novo nas hostes de Miguel Mossoró, a caminho da vereança e já com o saco do protetor do telefone celular devidamente grampeado.
O fato é que numa sexta-feira de chorinhos e muita conversa boa, que incluiu até charutos cubanos e outros comprados numa banca de macumba, diante de muitas cervejas, enquanto se falava em arte, poesia e na longevidade de certo Wolkswagen Santana 1989, que teima em permanecer vivo para deleite de alguns habitantes peçonhentos, alguns com mais de 20 anos de casa, como uma velha cobra papa-ovo, que mora por lá desde o tempo da reforma do muro do 16º Batalhão de Infantaria, fiquei adiando a vontade de verter água na sauna, digo, banheiro de Nazaré – que, diga-se de passagem, está sempre limpo – até não agüentar mais. Aí, fiz carreira em vão porque quando cheguei tinha alguém que estava demorando um bocado. Enquanto esperava na agonia pela abertura da porta, vendo a hora não conseguir me segurar, eis que chega o cineasta Lula Augusto, nas mesmas condições.
-Leo eu vou entrar primeiro porque estou que nem me agüento!
-De jeito nenhum! – retruquei – eu estou pior do que você. A mesa é testemunha.
Ele ficou calado coçando a barba e quando a porta se abriu, saiu uma moça de olhos arregalados pela nossa pressa, em passos de gueixa. Não teve esse negócio de entrar um primeiro do que o outro. Entramos os dois, lado a lado, ombro a ombro, como um atacante e um zagueiro em dia de jogo Brasil e Argentina. Nem nos lembramos de fechar a porta.
Quando estávamos em plena atividade de alívio, eis que entra de carreira o artista plástico e cronista Franklin Serrão, também no maior aperreio.
-O que é isso?
Respondi bem ligeiro para criar a confusão:
-Ora, Franklin, é um concurso...
Ele arregalou os olhos e disse:
-Deus me livre! – indo urinar tristemente no ralo onde escorre a água e o sabonete de Tázia, uma vez por dia.
Quando voltamos para a mesa, contamos, entre muitas gargalhadas, a história, e Sandrinha, muito séria, partiu em defesa de Serrão:
-... É, mas ele se garante!
Serrão tinha acabado de dar um trago no charuto cubano de Chagas Lourenço. Aliás, ele está viciado em fumar a “segunda” do charuto, que dá uma lombra danada, uns passamentos, umas tonturas, quando disse com um sorriso meio triste:
-É, né Sandrinha, é pequeno, mas funciona...
“Me tratam como um grande artista”
Fábio di Ojuara é um cara simples e querido por todos os artistas visuais do Rio Grande do Norte. Natural de Ceará-Mirim, já ousou em várias vertentes. Lançou um manual para cornos e criou o anárquico slogan ‘‘Toda merda agora é arte’’, que revirou o meio das artes plásticas natalenses recentemente. Há quatro meses está em Gmünd, a “cidade austríaca da arte”, participando de eventos internacionais como a feira Internacional Wassen Kraft. Nesse périplo rodou países do velho continente relizando performances inusitadas. Chamou particularmente a atenção dos visitantes da 52º Bienal Internacional de Veneza. Qundo voltar, não sabe ainda quando, tem vários projetos em mente. Um deles diz respeito a uma exposição com todo o material desta viagem. Pela Internet o Fábio relata ao Diário de Natal esta experiência como sendo ‘‘a mais importante da sua vida artística’’.
Diário de Natal - O que você está fazendo aí na Áustria?
Fábio di Ojuara - Estou aqui como artista internacional convidado da cidade de Gmünd, que é a cidade austríaca da arte, em 2007, para participar da feira internacional Wasser Kraft - Força da Água, que acontece anualmente no Estado da Caríntia (Karnten). Cheguei aqui no final de abril e vou ficar até julho. A minha vernissagem já está marcada para o dia 19 de julho e os convites já estão sendo enviados. O tema que escolhi foi voltado ao esqueleto do peixe e ao cavalo marinho, trabalhado dentro do contexto simbolico de ‘‘morte e vida’’.
Como surgiu este convite?
Um casal de amigos, que vão anualmente ao Brasil, Reinhard Schell (Engenheiro Civil) e Verônica Schell (Jornalista, formada pela UFRN, e atualmente minha Assessora de Comunicação na Europa) viram meus trabalhos, gostaram e me perguntaram se eu não teria interesse em participar de um evento internacional na Áustria. É claro que eu disse que sim. Depois disso, eles levaram o meu curriculum, e um catálogo com fotos das minhas obras, e entregaram à comissão organizadora do evento, para passar por uma avaliação. Pelo que me explicaram, a cidade de Gmünd, conhecida por suas constantes atividades artísticas, possui uma equipe de conselheiros, curadores, etc. E é essa equipe, notoriamente exigente, que escolhe os artistas que poderao participar das exposições. Fiquei esperando pela resposta e pensando se seria convidado, ou não, já que estaria concorrendo com artistas renomados do mundo inteiro, como por exemplo a artista Valerie Export, uma das participantes da Bienal Internacional de Veneza em 2007. Dois meses tive a alegria de receber um documento oficial da Secretaria de Cultura do Estado da Caríntia, convidando-me a morar por 3 meses em Gmünd, como artista internacional convidado. Tenho que dizer que estou tendo a honra de ser o primeiro artista brasileiro a participar da feira de arte Wasser Kraft da Áustria. Como sou um artista convidado, a cidade colocou à minha disposição um atelier, integrado a uma galeria, onde executo meus trabalhos, e um apartamento medieval super confortável, equipado com tudo o que eu preciso, e até com o que não preciso, como por exemplo máquina de lavar pratos (risos), com vista ao castelo da cidade, que é um dos mais visitados da Áustria. Quando acordo com o barulho do sino, olho pela janela e vejo o castelo, penso que estou num filme da idade média. Pela minha galeria passam em média 200 visitantes por dia. E, para minha felicidade, até agora só tenho recebido elogios pelo meu trabalho. Isso, vindo de pessoas que conhecem arte, é algo muito especial para mim e me gratifica muito.
Que tipos de trabalhos tem desenvolvido aí?
Estou participando da exposição com esculturas, pinturas e performances, que eu chamo de intervenções urbanas ou arte interativa. Mas, como sou um artista inquieto e provocante, não tenho me limitado a ficar só em Gmünd, tenho levado essas intervenções a cidades importantes. Abaixo, relato as duas intervencoes mais interessantes: Intervenção Urbana em Viena - Em Viena fiz uma itervenção urbana com o meu amigo Reihard Schell, na frente da catedral de São Estevão intitulada For Export. A obra teve duas vertentes: uma foi o problema dos estrangeiros ilegais, que a cada dia chegam à Áustria, e a outra foi a minha atividade como artista do Mail Art, pois nesse dia, acho que criei o primeiro Mail Art vivo da história. Por outro lado, geralmente os estrangeiros é que são mandados de volta aos seus países. No meu caso, eu empacotei um austríaco para exportação, coisa que ninguém nunca tinha imaginado. Essa arte interativa foi vista por centenas de transeuntes e gerou muitas indagações. No final, fomos muito aplaudidos. Em Veneza, realizei uma intervenção na 52º Bienal di Venezia, que considero bastante significativa: pintei uma tampa de vaso sanitário, com o slogan criado por mim ‘‘Now, every shit is art’’, conhecido em todo o mundo, e saí andando com ela na cabeça. Minha intenção não foi de maneira nenhuma criticar os artistas da exposição, mas sim levar o público a refletir sobre a crise de identidade que está ocorrendo no mundo da arte.
Creio que as pessoas entenderam minha mensagem, pois receberam essa ação com muito entusiasmo e simpatia. Até alguns funcionários da bienal me saudaram com ‘‘bravo’’ ou ‘‘ma che belo’’. Após o meu passeio pela bienal fomos a pé a praça São Marcos e de lá seguimos pelas principais ruas de Veneza. A reação do público foi incrível: todo mundo queria tirar uma foto comigo, até os famosos mascarados, que cobram para ser fotografados com os turistas, me chamavam para posar junto comigo. Foi uma loucuuuuura! !!! O pessoal que passava nas gôndolas e vaporetos (barcos coletivos) também não se continha: sacava as câmaras e me fotografava. Também vi algumas pessoas ligando pros amigos, só pra contar o que estavam vendo. Mais um mais engraçado foi quando um italiano passou correndo por nós (eu, Reinhard e Veronica) gritando com um sotaque engraçado: ‘‘Shuchesso, shuchesso!!’’ Registrei todos esses momentos, pois nunca tinha vivido algo tão tremendo.
Na abertura do Feira Internacional de Gmünd, Áustria apareci rolando uma bola, que representava a terra. O tema dessa intervenção foi ‘‘Buscando um lugar melhor para a terra’’ e quiz chamar a atenção para a destruição que o homem está causando ao nosso planeta. Fiz a bola totalmente irregular, de propósito, para mostar que a nossa terra não é mais a mesma. Todo mundo gostou da idéia, mas as crianças foram as mais entusiasmadas. Devido a essa intervenção, apareci em alguns jornais do Estado.
Qual a repercussão do meu trabalho junto ao público áustriaco
A repercussão tem sido a melhor possível. As pessoas aqui me tratam como um grande artista, mas principalmente com muito carinho e respeito. Até o Governador do Estado da Caríntia, Jorg Haider, que tem fama de não gostar de estrangeiro, quiz tirar foto com a minha primeira intervenção urbana aqui ‘‘Buscando um lugar melhor para a terra’’. Também estou vendendo bem as minhas obras e já tenho outros convites para voltar no próximo ano, para dar cursos de escultura em alumínio, participar de mais uma exposição e talvez até participar da Bienal da Áustria. Já recebi até convites para passar um período mais longo aqui, morar por algum tempo, mas isso é algo a se pensar com calma. No momento estou com o coração dividido entre o Brasil e a Áustria, esse país lindo, de pessoas que me receberam com muita hospitalidade. No geral as pessoas daqui não gostam muito de estrangeiros, mas em se tratando de Brasil, tudo é diferente. Eles adoram o nosso país e o nosso povo.
Como define essa experiência?
Como sendo uma experiência única e a mais importante da minha vida como artista. É como subir ao podium da arte internacional e eu estou, sem falsa modéstia, me sentindo um campeão, que tem a honra de representar o seu Estado, o seu país e a sua gente em outra terra. Quando me perguntam porque escolhi temas marinhos para a minha exposição, sempre falo da minha amada Natal, do meu querido Estado do Rio Grande do Norte e todos respondem dizendo que, sem dúvida, a arte brasileira está sendo muito bem representada na Feira Wasser Kraft, da Áustria. Na verdade essa minha proposta é algo conceitual e pode ser interpretada de diversas maneiras. O pessoal do Dadaísmo, por exemplo, já trabalhava essa lógica e muitos artistas utilizaram excrementos para compor trabalhos artísticos. O que eu fiz foi ressuscitar um conceito antigo e aplicar à situação atual. Ou seja: hoje em dia, qualquer pessoa pode fazer uns rabiscos na parede e dizer que é Arte. Ou então se jogar de um prédio, para pintar uma lona com o sangue do seu próprio corpo, dar um tiro no braço, etc., e afirmar que isso é Arte. É claro que isso tem um lado positivo, que é a liberdade de criação, mas por outro lado, alguns artistas fazem umas coisas sem sentido, até sem responsabilidade, vendem por milhões, e quase ninguém tem coragem de questionar o trabalho, por medo de ser visto como um ignorante cultural. Pra você ter uma idéia, já tem gente até afirmando que as artes plásticas só atestam sua própria condição de ‘‘a mais perdida e desnorteada de todas as artes”. Foi por isso que criei esse slogan, para fazer as pessoas pensarem, refletirem sobre a crise que a arte está vivendo atualmente e isso está surtindo efeito.
Qual a repercussão aí de ‘‘Toda Arte é Merda’’ na Europa ?
Aqui a repercussão tem sido das melhores. Hoje chegou uma holandesa, na minha galeria, viu a tampa do sanitário, que ocupa um lugar de honra lá, e disse: é verdade, a arte está perdendo sua identidade! Na Bienal de Veneza, a sensação que tive é que as pessoas estavam gritando junto comigo ‘‘Toda merda agora é arte’’. Até um doutor francês, colecionador de obras brasilieiras, me parou em frente do pavilhão brasileiro e pediu que eu lhe mandasse as fotos da minha intervenção (Dr. Dejacques). Creio que o sucesso de uma intervenção como essa se pode medir através da reação do público de rua e dos artistas. Aqui na Europa tenho tido a aprovação de ambos os lados. Tanto colegas, quanto pessoas não ligadas a arte, têm apoiado minha iniciativa. Enfim, estou recebendo um reconhecimento internacional, de pessoas que realmente entendem do que estao falando, pois convivem com o tema.
Quais seus planos quando voltar ao RN, se é que vais voltar?
A primeira coisa que quero fazer, quando voltar ao RN, é organizar uma amostra do meu material de viagem. Estou fotografando e filmando tudo o que acontece de interessante por aqui, e tenho certeza que muitas pessoas têm curiosidade de saber como é a vida na Europa, então não posso deixar de produzir essa pequena amostra. Os outros planos dizem respeito a arte potiguar, mas ainda estão sendo elaborados por mim e por outros parceiros aqui da Áustria. Tenho alguns projetos muito bons em mente, que beneficiaríam nosso Estado. Mas para que eles possam ser executados, preciso do apoio da iniciativa pública, iniciativa privada e de pessoas ligadas a arte. Como ainda não pude falar com ninguém daí, primeiro estou tentando firmar parcerias aqui, para depois levar as propostas ao Brasil. O que posso adiantar é que os projetos que estou elaborando deverão ter conexão direta com a Europa. No mais, vou continuar trabalhando, como sempre fiz, sem deixar de lado as experiências práticas que estou adquirindo aqui.
MOISÉS DE LIMA
DA EQUIPE DO DIÁRIO DE NATAL
DO PLURIPARTIDARISMO AO PODER
(O sonho que virou pesadelo)
(Um governo de Abutres Peculatários)
“Estrela brasileira de norte a sul”...
Esta frase é o começo de um jingle de uma empresa de aviação aérea que eu ouvia quando criança no comecinho da década de setenta. Avião é hoje neste mundo globalizado não só um bicho de ferro que voa, mas é também o apelido de atravessadores, de pessoas que traficam drogas, que traficam cargos públicos, que traficam dinheiro público, e, mais do que nunca, é sinônimo de “apagão aéreo”.
O General Figueiredo, o “responsável” pela mudança do sistema militar para o sistema civil, gostava mais dos cavalos do que povo. Sarney, seu sucessor, chamava o povo da nação de “brasileiros e brasileiras”.
Contudo, tinha um gosto diferenciado pela literatura e tratava o povo como personagens de um romance literário. Collor, desde os primeiros comícios apareceu dizendo: “Minha gente”. Já tinha avião, então priorizou os carros, ou as carroças, como chamava-os. Por causa de um filho
bastardo venceu Lula em 89. Itamar, cheio de topete e dono da maior vaidade política moderna, resolveu dar seqüência a chinfrim administração de Collor, Trazendo de volta para os brasileiros o mais alemão dos carros, o Fusca, coisa parecida com a filosofia canina de Rogério Magri,
ex ministro do trabalho de Collor, quando evadira-se de um congresso para levar seu cachorro para passear, e disse a nação: “Meu cachorro é um ser humano como outro qualquer”. Pois é, somos tão cachorros, quanto à trajetória paradoxal da história que vou contar a vocês agora, leitores e eleitores.
O que eu preciso mesmo saber é onde estão os algozes de setenta. Os amigos de Médice e Geisel. Salvo Mário Henrique Simonsen e Mário Andreazza, dois Mários técnicos que não se envolveram diretamente com a ditadura militar, para mim, os outros foram comparsas. Golbery, era símbolo da mais dura repressão. Era dono do Itamaraty e do SNI, e de quase todos os famosos Atos Institucionais, inclusive o mais temido deles, o AI5. Sem falar em um outro General, o Cruz, muitos foram os protagonistas da ditadura mais fiel às regras das pseudo leis. Muitos foram, até os que não quiseram ser.
Por aqui, nesta hoje pós província efervescente, ainda existiam os homens biônicos. Eleição direta era só para centro cívico do colégio. Em 1978, eu tinha 16 anos, e participando das reuniões do Cine Clube Tirol na Fundação José Augusto, abracei, como todo jovem politizado da minha geração, um tema para lutar, uma bandeira para representar. Ainda no Marista, eu e colegas, dos quais alguns hoje são vereadores e deputados, fundamos o “Grupo Construção” de oposição a situação que sempre se elegia para o Centro Cívico. Vencemos as eleições e começamos a participar ativamente de todas as manifestantes reivindicações da época, Anistia Ampla Geral e Irrestrita, Eleições Diretas, Assembléia Nacional Constituinte, etc. Fizemos até excursão para visitar presos políticos em Itamaracá. Todas as causas foram conquistadas. Os presos de Itamaracá saíram justamente das grades para as salas burocráticas das administrações municipais, estaduais e federais. Era ético e politicamente correto um recém governador eleito pelo voto direto pós 64, prestigiar um homem que fora torturado pela repressão da ditadura militar nacional. Os exilados viraram deputados, ministros e senadores.
Um virou presidente por dois mandatos.
Com o advento do pluripartidarismo, aqui no RN, ainda prevalecia a forte marca da ARENA e do MDB. O PT, formado por dissidentes do MDB e do Partido Comunista(clandestino), caminhava de calça rasgada, camisa Hering e chinela de couro. Era quase lúdico. Aconteceram então as
primeiras eleições diretas para governador no Brasil depois de 64, em 1982. Aqui no RN, um Jovem que já tinha sido prefeito indicado (José Agripino), contrariando todas as expectativas das eventuais mudanças políticas, vencera Aluizio Alves, então dito representante das mudanças
conquistadas.Foi aí onde começaram as famigeradas coligações partidárias, a ferrugem que corrói o idealismo e a sensatez de uma luta.
Os donos dos dois únicos partidos legais que existiam, fundaram partidos menores com o intuito de angariar votos e mais votos.
Acredito que nesta época o PT sonhava o sonho lírico da conquista pela igualdade social, e não pelo nefasto poder. Penso que o PT hoje, está querendo que pessoas como nós que não têm mandatos, se esqueçam de que somos ainda muito mais fortes.
O jargão “Camarada” do movimento comunista, foi substituído pelo “Companheiro”. Era mais condizente com a proposta de um outro operário que elegera-se presidente da Polônia, e que não deu certo. Lula tem tudo para dar certo se parar de errar. É bem intencionado, mas sempre sem saber de nada vive cercado de Abutres Peculatários, de Neros modernosos queimando dinheiro público e lambuzando-se no doce mel do poder. Mas, o poder tem o poder de mudar sempre.
Não devemos desacreditar da luta, do sonho e da conquista, em detrimento de carreiristas que usam siglas partidárias para sugarem a história da conquista de um povo, que infelizmente ainda precisa aprender a votar melhor. Se Lula terminar este mandato sem realizar a reforma política, sempre continuará acontecendo no país o que aconteceu aqui em Natal recentemente.
Vão aparecer uns Júlios Protozoários votando contra a bandeira do próprio partido que dirige, porque o usou para apenas se eleger. E a filha de Carlos Alberto, outra dirigente da mesma sigla, foi tão omissa quanto Pilatos. Sem falar nos outros, dos outros partidos que tenho quase
certeza de que receberam folhas verdes de empresários especuladores para vetarem o Prefeito Carlos Eduardo.
Jânio Vidal tem razão, eles pensam que meio ambiente é ambiente pela metade.
Em meus solilóquios saudosistas resgato fatos e fotos da minha geração pós 64 que conquistou toda esta liberdade que hoje está invadida de aproveitadores sem vocação política nenhuma para exercer um mandato. Um político tem antes de tudo que ser um homem. Tem que ter humanismo. Em meus solilóquios saudosistas resgato a história desta geração que tirou os Generais do poder, e fico mesmo resgatado em minhas próprias aspirações, exilado de minha própria ideologia. A única coisa em que eu hoje acredito, é que o poder não foi feito para quem não pode. Agora, eu não tenho mais alegria, nem de fazer a hora, e nem de esperar acontecer.
Levamos o rei para o castelo e viramos súditos de mil impostos. Impostos que pagamos fielmente aos impostores.
Podem me chamar de sonhador, de altruísta, mas a culpa de tudo isto é minha que já sabia. Só os poetas vendem estrelas nas ruas.
Os políticos viram estrelas brasileiras de norte a sul. Estrelas vermelhas, talvez, estrelas com o sangue dos que padeceram em nome delas. O Brasil é mesmo uma aquarela de vinho tinto de sangue. De violência social, violência política, violência urbana, e de comandantes arbitrários.
Depois que o PT chegou ao poder, a única coisa de que ainda posso tirar proveito de uma vida de luta, é não precisar mais afastar de mim o cale-se, ou seja, a censura. O resto continua tudo como era antes na terra de Dante. Não por conformismo, mas por fidelidade ao idealismo, eu passo minha bandeira aos que estão chegando, eu já consegui por lá quem não deveria estar. Continuo órfão de credibilidade desde 1978 quando sonhei que poderia mudar o Brasil. O pior de tudo é que mesmo sendo de avião, já sei que esta é uma viagem sem volta. Hoje eu faço até tratamento psiquiátrico. Não consigo ouvir três palavras: Reacionário, companheiro e PT.
Mário Henrique Araújo
Músico, poeta, sonhador, funcionário público e
bipolar, em 11 de julho de 2007
mhda@ufrnet.br