Mário Quintana
Berço do Dia da Poesia em Natal, Galeria do Povo é excluída das programações hoje oficiais da data
Eduardo Alexandre
No começo, não foi fácil. Mas foi pela ousadia, perseverança, constância e renovação que o 14 de Março, Dia Nacional da Poesia, consolidou-se e fez de Natal o maior pólo de comemorações da data em todo o país. À frente desta luta, eu (desculpem o uso da primeira pessoa) então jovem poeta, hoje com 55 anos de idade, comandava ou participava diretamente das manifestações e invadia redações de jornais, rádios e televisões para ver a festa consolidada no calendário festivo da cidade. Não deixava passar em branco.
São 30 anos de festa à Poesia, sempre com a marca da Galeria do Povo. Este ano, porém, exatamente na data dos 30 anos e numa exposição que marcaria a 31ª edição do movimento, as entidades que representam o setor cultural do Estado e da cidade esqueceram todo o esforço empreendido durante todo esse tempo e chegaram a boicotar, como foi o caso da Fundação José Augusto, uma exposição que me foi solicitada, depois da sugestão ter sido acatada em votação da comissão que preparava a festa.
Fui convidado oficialmente por um representante da FJA para realizar a exposição, e nem sequer depois fui informado de que a exposição não seria realizada. Quando chegaram à Fundação, esses dirigentes do PT disseram que não iriam atuar politicamente na entidade, iriam fazer cultura. Hoje, o diretor geral fala em gestão petista na Fundação e nem sequer lembra que o governo a que serve é do PSB, da governadora Wilma. Ano passado, o meu nome foi sugerido pela Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências para ser o poeta homenageado, mas eles recusaram a sugestão, alegando que eu era coordenador do CEDOC - Centro de Documentação Cultural Eloy de Souza - e não ficaria bem a entidade homenagear um coordenador. Este ano, o fórum de programação votou pela realização da exposição da Galeria do Povo, mas quando a proposta chegou às instâncias superiores não teve eco, teve veto. Acho muito bom que a Capitania das Artes e a Fundação José Augusto comemorem a data, convidem poetas e cantores estrangeiros para a festa. Mas pergunto: qual foi a contribuição deixada por Chico César para o Dia da Poesia em Natal?
No ano passado, eu estava na comissão que organizou o evento pela Fundação. Depois do boicote ao meu nome, sugeri os nomes de Plínio Sanderson e Civone Medeiros para serem homenageados. Por quê? Porque são poetas que têm histórico de realizações pelo Dia da Poesia. Acho um equívoco desta administração tratar a questão cultural do Estado da forma como está tratando. Cultura não merece ser administrada com o ranço político. Menos ainda a Poesia. Como nesses 30 anos de batalha só tomei pancada, estou acostumado a esse tipo de comportamento de autoridades relapsas e autoritárias, sem qualquer compromisso com a Arte. Mas rezo a cartilha da Poesia e afirmo como o colega do outro Rio Grande, o vivíssimo Mário Quintana: "Eles passarão. Eu, passarinho." E como até a Samba, a Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências - da qual fui diretor executivo, e levei as comemorações do Dia da Poesia para o Beco da Lama, me esqueceu, passo o 30º ano do Dia da Poesia em Natal em casa, triste, mas torcendo para que seja uma data bonita, bem comemorada.
Agora, eu entendo porque o autor da "Serenata do Pescador", a "Praieira dos Meus Amores", Othoniel Meneses, era tão amargurado com a cidade. Nada disso, porém, vai me abater e me deixar amargurado como ele. Sinto, é de se esperar, mas apenas lamento o fato de a governadora ter destinado a cultura a gente tão despreparada e rancorosa, perseguidora. Para mim, a Poesia não tinha disso, não.