terça-feira, agosto 14, 2007

DEVOLUÇÃO

Marcus Ottoni


"Quem tem boca vaia Lula"
Da Net

"O país apodreceu de vez. Nos poderes, nas instituições, nas atividades, nas relações interpessoais, na deformação do caráter, na reconstrução de conceitos, nos objetivos profissionais, no papel da imprensa, na programação televisiva, no sonho de futuro. Acho que Andy Warhol andou por aqui tecendo uma velha tese. Somos a nação da mediocridade instantânea."
Alex Medeiros


Hugo Macedo

CLASSIFICADOS

Procura-se romântico:

Transparente, indecente

Cínico, sinistro

Aflito, pouco amado

Feroz, um tanto domado

Introvertido, consciente

Bom vivant, desobediente

Áspero, sonhador

Ovelha negra, acalentador

Com defeito, mediador

Construtivo, ótimo infrator

Informações:

Iremediável desastrosa

Mandar Curriculum vitae

Deborah Milgram


Em um eu sinto o buscar-te

Em um eu sinto o buscar-se;

noutro, nada além do ir-se.

Naquele, o multiplicar-se;

nesse, o afã de dividir-se.

Um inteira-se ao partir-se,

faz do fim o eternizar-se;

se um eu só é ao dar-se,

outro o é ao consumir-se.

Um é do outro o disfarce,

se o outro em um traduzir-se.

Antoniel Campos



Defeito de fábrica

- Boa tarde. Quero trocar esta mercadoria que comprei aqui mês passado.

- Está com defeito, minha senhora?

- Defeito de fábrica, eu presumo. Mas tem três meses de garantia.

- Certo, minha senhora. Tentaremos consertar o produto, e se não conseguirmos a senhora pode levar outro sem qualquer ônus. Mas, quais os defeitos que o produto apresentou?

- Bem, nos primeiros dias ele funcionou direitinho. Me levava para jantar, abria a porta do carro para eu sair, dizia palavras doces enquanto bebíamos vinho. Sabia até ler a carta de vinhos, imagine. Um luxo!

- Trata-se de um bom modelo, minha senhora.

- Como eu disse, no começo funcionava bem. Me mandava flores, enxugava a louça que eu lavava, chegou a fazer o jantar uma vez, estrogonofe de frango, imagine... E na hora do amor eu não tinha nada a reclamar. Cumpria bem suas obrigações, do jeito que a vendedora me garantiu. Porque, minha filha, você sabe que tem modelos bem acabados que neste aspecto, são uma negação.

- Quando foi que o modelo começou a apresentar defeitos?

- Teve uma vez que eu o mandei deixar o lixo lá embaixo do prédio e ele não subiu mais. Quando desci, o peguei bebendo no bar da esquina com uns amigos que acabara de fazer. No dia seguinte, cheguei em casa cansada do trabalho e encontrei a toalha molhada na cama. E ele começou a não dar mais descarga depois que usava o banheiro. Este tipo de coisa...

- Às vezes estas mercadorias apresentam problemas... Mesmo os modelos mais avançados.

- Eu pensei que fosse só um defeitinho passageiro, mas, não. Ainda tentei conversar, discutir a relação, mas ele fugiu da conversa como o diabo foge da cruz. Depois, nada mais de mandar flores, nem de cozinhar. Chamei-o para jantar uma noite e ele propôs assistirmos um filme de Van Damme. Mas o cúmulo mesmo, foi quando estávamos fazendo amor, e olhe que ele nem tinha mais o ímpeto dos primeiros dias, e de repente ele parou tudo, levantou-se e correu para a televisão, que estava ligada. Pensei que algo grave tinha acontecido e ele me respondeu com a cara mais deslavada do mundo que o Flamengo fizera um gol. Foi a gota d´água. Desliguei-o, tirei a bateria e trouxe aqui para devolução.

- A senhora tem certeza que quer trocá-lo? Muitas mulheres se afeiçoam à mercadoria mesmo com tantos defeitos registrados...

- Não nego que vou sentir um pouco de saudades, mas, definitivamente, não quero mais este. Mesmo que tenha conserto, quero trocar por outro.

- Certo. A senhora pode se dirigir àquela vendedora ali, ela lhe indicará os novos produtos da loja. Temos inclusive uma mercadoria importada.

- Parece interessante.

- Francês. A cara do Alain Delon.

- Não sei, acho que prefiro algo mais moderno.

- Temos um lançamento bom. Jogador de vôlei.

- Não, menos esportivo... Gosto de modelos mais clássicos.

- Que tal um jovem executivo da bolsa de valores

- Comprei um modelo destes no ano passado. Insuportável!

- Bem, a senhora fique à vontade para procurar o produto que mais lhe agradar.

- Pensando bem, acho que vou experimentar o francês com a cara do Alain Delon.

- Esse modelo sai muito. A senhora não se arrependerá.

- E se tiver defeito de fábrica?

- Basta trazer para a loja. Mas, com base na minha experiência na loja e na vida, posso confessar uma coisa à senhora?

- Claro.

- Não existe modelo perfeito.

Cefas Carvalho


A DEVOLUÇÃO DOS BICHOS

(Conto da vida real na terceira pessoa)

E aí George Orwell o que você faria?

Ele jogou na Vaca e deu Burro.

Descera do ônibus e viu uma balzaquiana formosa em pé embaixo de um guarda sol com uma placa na cabeça que anunciava: “PARATODOS”. Como era um poeta, lhe veio à cabeça imaginações insólitas. Pensara: Nossa! Uma mulher bonita dessa embaixo de um anúncio que é paratodos... (É uma mulher muito bonita mesmo, de chamar atenção)

- Vai apostar em algum bicho senhor?

- Talvez não, estava só imaginando que você poderia ficar muito mais bonita ainda por trás de outra banca.Você tem algum palpite para me dar?

- O senhor sonhou com algum bicho ontem?

- Não.

- Conhece alguém de quem o senhor está com raiva e se parece com um bicho?

(Ele contou-lhe uma recente história)

- Então senhor, se é do jeito que você contou, é vaca.

Ele apostou na Vaca e deu Burro. Quando voltou para saber do resultado, ele reclamou que o palpite dela tinha sido errado.

- Não fique triste meu filho, levar chifre hoje em dia é chique, ser burro é ficar sustentando a vaca.

Ele cheio de defesa pensou que ela estava querendo curtir com a cara dele.

E entrou no jogo.

- Pôrra! Você é o bicho mesmo, quase que me comove.

- É, eu sou o bicho mulher, e quem joga nele nunca ganha. Quando eu era adolescente, aqui na redondeza todo mundo dizia que eu era “Galinha”, que eu trepava com a mão na cabeça pra não perder o juízo. Eram as mulheres dos homens, aquelas véias feias e gordas que tinham inveja de mim porque quando eu tinha 17 anos já tinha esse corpão. De tanto eu desfilar na rua me “defamaram”.

-Acabaste de pronunciar um neologismo, defamar, talvez seja, criar fama, em vez de difamar que é desmoralizar.

- Que diabo é “niologismo”?

- É um bicho que você sempre pronunciará, mas que talvez nunca conhecerá.

- Meu filho, eu conheço tudo nesta vida, e esse tal de “niologismo” foi você quem inventou para tirar onda com a minha cara.

- Não minha linda, foi você quem inventou. Você disse defamar em vez de difamar.

- E então, foi isso mesmo, me “disfamaram”.

- Disfamaram com Z ou com S?

- Pôrra cara, vai procurar tua vaca! Eu não estudei muito, mas sei o que é a vida. Eu não falo difícil como você, ma sei fazer a vida ficar fácil.

Diga logo em qual bicho você vai jogar hoje e pronto.

- Eu não confio mais no seu palpite.

- Você ta certo, é melhor ir embora, você não é homem de jogar. Tem azar no jogo, e pelo que me parece também não tem sorte com as mulheres. Aposte em você mesmo, se você fosse um bicho eu apostaria em você.

- Mas você acabou de dizer que eu não sou homem de jogar!

- É por isso que deu Burro ontem seu cara de Cachorro. Você não é homem de se jogar fora.

- Então, só por causa do elogio, hoje eu vou jogar no Macaco.

- Por quê?

- Eu vivo pulando de galho em galho.

- Não seu burro, jogue na galinha. Ninguém aposta nela, mas todo mundo come. Eu já lhe disse, eu não estudei muito e não sei falar difícil como o senhor, mas, já vi nos seus olhos que o senhor faz qualquer “Galinha” virar um ex-mulher sozinha.

- Você não é casada?

-Não, sou complicada com um bicho que nem tem no meio desses vinte e cinco que tem aqui na banca.

- E que bicho é esse?

- É o bicho “Homem cachorro”.

- Tudo bem, joga aí cinco na Galinha.

- O senhor não é burro, é “ingênio”. Não tem galinha no jogo do bicho, só tem Galo, até nisso sacanearam às mulheres.

Putz! Outro neologismo.”Ingênio” pode ser o gênio incompreendido. Mas ficou na dele, não revidou.

Jogou no Galo, e não foi saber no outro dia qual resultado de bicho tinha dado. Não por medo de enfrentar a formosura plástica da vendedora de palpites, mas por medo de se apaixonar por suas palavras simples e cheias de tanto expressar. Para ele já tinha acontecido o mais importante.

Descobrira que nem a mulher é Galinha, e nem o homem é cachorro, que já era hora de devolver o nome dos bichos para eles mesmos, pois todos os homens são animais, e por serem racionais, são muito mais perigosos do que eles.

Talvez ainda nem saibamos, mas somos o único bicho capaz de matar para não comer. Somos o bicho ser humano. E aí George, o que é que eu faço?

Mário Henrique Araújo

por Alma do Beco | 3:11 PM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

.. .. ..

.. .. ..

Recentes


.. .. ..

Praieira
(Serenata do Pescador)


veja a letra aqui

.. .. ..

A imagem de fundo é do artista plástico e poeta Eduardo Alexandre©

layout by
mariza lourenço

.. .. ..

Powered by Blogger

eXTReMe Tracker