Franklin Serrão
"Avisa ao pessoal de casa queu fui mandar brasa com o senhor São João."
Elino Julião
Elino, sempre!
Levar Elino Julião ao Beco da Lama foi minha maior alegria enquanto diretor executivo da Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências. Maior ainda por representar um desafio, aos olhos de muitos, intransponível: levar público ao centro de Natal durante uma passagem de ano.
Para mim, aquele evento seria, se alcançado sucesso, a porta aberta para a realização do I Carnaval do Centro Histórico.
Quando, durante a segunda etapa do Pratodomundo, o Festival Gastronômico do Beco da Lama, o secretário de turismo da cidade, Fernando Bezerril, trouxe-nos a notícia de que podíamos anunciar a realização do ‘Réveillon do Beco’, não tive outra reação: dessa vez trazemos o maior forrozeiro vivo do Nordeste para uma apresentação aqui.
Elino era a única garantia de sucesso, se pensássemos em atrações com artistas norte-riograndenses. Era o nosso maior nome. O que representava o que de melhor tínhamos em nossa música. Não podia ser outro.
Porque Elino era, e continua sendo em sua música, pura alegria. Um menino que trouxe no sangue o vírus da música de sua terra. Uma caixa de fósforos bastava como acompanhamento. Ou só as palmas das mãos. Bate aqui, bate ali, abria a voz e a música fluía fácil de sua alma. E vinha o puladinho que o acompanhava em todas as apresentações. Puladinho que puxava o ritmo, que trazia a coreografia que caracterizava o seu forró mais genuíno de pé-de-serra: sanfona, pandeiro, zabumba e triângulo.
Da combinação destes instrumentos com a voz de Elino, estava servida a melhor receita do som do nordeste. E como Elino contagiava! Como, além de alegre, era bem humorado em sua música! E como cantava com amor a sua terra, seja o Seridó, seja Natal ou o próprio RN, o Nordeste, o Brasil!
Sim, porque Elino representava e representa o que de melhor temos de Brasil e de música brasileira. Até na picardia. Na pulha nordestina.
Os temas de Elino podiam ser o São João ou próprio forró, como o rela-bucho de tanto sucesso interiores afora. Podia ser a cidade e seus logradouros, como no Forró da Coréia.
Quando anunciei a programação que propúnhamos para o Réveillon, chamaram-me de doido: Forró em plena passagem de ano?
Forró, sim. Forró de Elino Julião.
Tomei coragem e telefonei para ele.
Como dizem os daqui: pense numa conversa gostosa! O homem era pura simpatia. Que energia transmitia em cada palavra!
Ah, Elino! Sei ser fácil em palavras e gestos como você, não. Deixo aqui, entre os que ficaram, mais que uma palavra de saudade e homenagem. Deixo uma palavra de agradecimento por você ter-nos feito felizes em tantos momentos, e por toda essa vasta obra que continuará para sempre, com grande alegria, invadindo os sertões nordestinos e brasileiros.
Sei que você merecia muito mais do que teve em vida. Mas também sei que você partiu feliz por ter deixado tudo o que deixou. Especialmente o ritmo alegre e o jeito feliz que foi você e todas as suas composições, até nas debochadas, todas, sempre, cheirando a povo. Povo do Nordeste do Brasil.
Obrigado, esse menino de Timbaúba. Valeu!
Eduardo Alexandre
Calou-se Elino Julião!
Morreu um dos últimos grandes cantores da música nordestina. Elino Julião com seu canto sagrado já não embelezará a vida dos que se orgulham de terem nascido sob o sol causticante dos sertões. A MPB fica com menos poesia, com menos gorjeios, com menos graça. Todos nós que nos encantamos com essa estirpe nobre, computamos outra baixa, o exército dos cavaleiros inspirados por Miguel de Cervantes, chora mais uma despedida.
Elino faleceu no sábado (19) e foi sepultado anteontem, com certeza sem as honras merecidas, com um toque de quase silêncio. Certamente em uma campa sem plumas e sem paetês, mas rodeado dos anjos tortos que se negaram a ser gauche na vida. Foi juntar-se a Jackson do Pandeiro, Gordurinha, Lindú, Ary Lobo e Luiz Gonzaga. Foi ter com o Divino, oferecer-lhe seu canto de ave sagrada.
Nascido no município de Timbaúba dos Batistas, fronteiriço com o sertão do Rio Grande do Norte, nas beiradas dos rios mortos. Gravou mais de 40 discos, entre todos os formatos, sendo que um deles marcaria sua carreira: “O Canto do Seridó”, já na fase do CD, cantando em dueto com estrelas como Fagner, Lenine, Dominguinhos, Elba Ramalho, Marinês, Maciel Melo, Silvério Pessoa, Tetê Espíndola e Ná Ozzetti. Diversas gerações da Música Popular Brasileira decente e pura, saudando uma garganta bendita capaz de me embalar nos bosques férteis da minha alma cansada.
Cantor de qualidades diversas, Elino Julião era compositor não menos genial. Escreveu obras como “Amor Enchucalhado”, “Tamarineira”, “Presente de Papai Noel” e “Relampiou”. Emplacou o sucesso “Rabo do Jumento”, que embalou muitos forrobodós nos chãos de latada desta nação nordestina. Herói. Sim, herói Julião. Se não das ligas camponesas, das ligas quixotescas musicais. Herói entre heróis.
Recomendo a quem puder a aquisição dos CDs “O Canto do Sertão” e “O Canto do Sertão 2” tentando o endereço eletrônico: mensagens@candinhabezerra.com. Todo esforço será recompensado com uma música de fino humor e de musicalidade tão plena quanto viçosa. Lá vamos nós, chorar mais um morto. Nós que empunhamos as armas poéticas e os ritmos soberanos, na luta contra a prostituição do meio musical nordestino.
Perdemos Elino Julião. Enquanto isso, sobrevivem os canalhas que engendram bandas e mais bandas asquerosas, deturpadoras do forró. Vivemos a era dos arremedos, era da falsidade, das mentiras. E, enquanto nos enlutamos de um artista do porte de Elino, um punhado de calhordas analfabetos engordam suas contas bancárias rebolando as nádegas e vomitando a decadência cultural e moral, sim, senhor, sobre nossas cabeças.
Vai lá, Elino Julião! Canta para Deus! Ficamos aqui mais tristes e mais desamparados, mas não deixaremos esses moleques travestidos de grupos musicais nos fazerem de trouxas.
Até a vista!
Ricardo Anísio
Nota musical de falecimento
Jornal de Hoje, 22.05.06
“Eu vou ali fazer uma viagem
cadê coragem pra me despedir
não quero ir, meu Deus peço socorro
eu sei que morro de saudade do Siri.”
(Elino Julião, Siri Siridó, 1976)
Eu havia acabado de deixar a sessão de “O Código Da Vinci”, no Praia Shopping, pouco antes das 22 horas, e fui para uma resenha em Ponta Negra com Jacqueline, Ailton Medeiros, Jener Tinoco, Robinson Faria e sua mulher, Julianne. Nem tinha tomado o primeiro gole de guaraná e o telefone toca. Ouço a voz do produtor cultural Zé Dias. Pensei: lá vem sacanagem (aquele papo de uso do cachimbo faz boca torta).
Mas diferente de todas as outras milhares de vezes em que a voz de Zé vem carregada de provocações ideológicas (quando o assunto é Lula), zombarias futebolísticas (quando há derrotas - perdão da redundância - do Botafogo) e vibrações musicais (quando é o caso de sucesso de algum artista local), daquela vez o timbre era de tristeza. Falando num compasso de marcha fúnebre, ele avisou: “Elino Julião acabou de morrer”.
Minha cabeça rodou e me levou de volta à estreita travessa Mário Lira, nas Quintas, quando a partir dos anos 1960 aprendi a gostar das canções de Elino, tocadas numa constância em todas as rádios de Natal e do interior. Sempre que quero viajar àquele passado lúdico, coloco no CD do carro sua coletânea com o melhor daqueles anos: O Rabo do Jumento, de 1967, Puxando Fogo e Xodó de Motorista, de 1970, A Festa do Senhor São João, de 1973, e Na Sombra do Juazeiro, de 74.
Se a vida fosse um filme, e o gênero fosse bang-bang (quem disse que não é?), Elino seria o meu Ennio Morricone, o compositor de temas dos melhores filmes do diretor Sergio Leone. Suas canções funcionam como trilhas de bons tempos, cada uma delas rememora períodos da minha infância e adolescência. Quando tive o privilégio de gozar da sua amizade, coisa rara entre ídolos e tietes, contei-lhe sobre isso. Ele expressou um orgulho que era para ser só meu. O poeta Graco Medeiros, meu mano, ficou lhe devendo a promessa de me levar para um palmo de prosa em sua casa, como ele queria.
Elino também foi trilha sonora das emoções da Copa do Mundo de 1970, quando seus clássicos foram sucessos em todos os campos radiofônicos do Brasil. Nenhum som me lembra mais aqueles instantes do que Xodó de Motorista, um forró pisado numa seqüência rítmica que mistura lirismo e linguagem popular, numa métrica de soneto aleijado. Naquele tempo, o “quadrado mágico” era formado por ele, Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro e Marinês.
Elino Julião está para a cultura do Rio Grande do Norte como Jackson para a da Paraíba. Sua carreira e discografia são marcas de um artista com fôlego musical e atemporal. Seu forró é original como o trio de instrumentos que agora experimenta ressurreição nos salões de dança, aquele que foi destaque até no “The New York Times”. As louras que hoje rebolam cantando letras ridículas em forrós pasteurizados não amarram a chinela da “deusa do Mercado José”.
Elino se foi como um pássaro cantante. Morreu na sua estação preferida, a estação das sanfonas, dos arrasta-pés, das fogueiras, dos balões, das canjicas. Elino não vai mais amanhecer o dia na festa do Senhor São João, em Mossoró. Mas em sua memória, vamos todos mandar brasa, pois ele gostava mesmo era de animação. Agora, cada vez que meu filho de nove anos pedir para ouvir “O Rabo do Jumento”, eu vou morrer de dor. E por favor, avisa ao pessoal de casa: quem esquecer Elino Julião é um filho de goiamum.
Alex Medeiros
Morreu cantando...
Jornal de Hoje, 22.05.06
O natalense acordou hoje com o céu nublado, com chuviscos que representavam o sentimento de perda daqueles que se despediam de um dos maiores ícones da cultura popular brasileira. O forrozeiro Elino Julião faleceu no último sábado, por volta das 21:30 horas, e desde o começo da tarde de ontem estava sendo velado no Palácio da Cultura.
Às 8 horas da manhã, fãs, familiares e amigos se aglomeravam ao redor do caixão que mostrava o semblante de Elino Julião que, assim como em vida, transmitia paz e a alegria. A missa de corpo presente foi presidida pelo padre Antônio José, que enfatizou que naquele momento estavam celebrando a vida e não a morte. O acompanhamento musical foi feito pelo grupo de forró pé-de-serra "Meirinhos do Forró" que, além das canções litúrgicas da celebração eucarística, homenagearam o cantor e compositor com as músicas "O cajueiro de Pirangi" e "O rabo do jumento", ao lado do flautista Carlos Zens.
Elino Julião faleceu aos 69 anos, em um dos melhores momentos de sua carreira e se preparando para a época do ano que mais amava, o São João. No seu velório, estiveram presentes diversos parentes de uma grande família. Elino Julião teve 14 filhos, sendo três deles com a cantora Lucimar. Ela conta que conheceu o cantor em Campina Grande, sua cidade natal, e que aos 16 anos, já como cantora, fugiu com ele para o Rio de Janeiro. "Vivemos 29 anos juntos, cantamos muito e tivemos três filhos, Elino Julião Júnior, 26, André, 25, e Priscila, 19. Soubemos que Elino tinha falecido às 4:00 horas da manhã do domingo. Tínhamos acabado de chegar de um show dos meninos que têm um grupo de forró chamado 'Os manos' e viemos direto para cá", revela.
Elino Julião Júnior também é professor de Educação Física e era o mais emocionado dos filhos. Ao chegar perto do caixão, conversou com o pai, segurando sua mão. Disse que guardava tudo o que tinha recebido dele, como uma chuteira, e, bastante trêmulo, pedia para que o pai não o deixasse. Amparado pela família, Júnior foi levado para perto dos irmãos, André e Priscila, para tomar um pouco de água e tentar se acalmar diante da perda.
Segundo André, que é jornalista e pretende estudar Direito, além de seguir a carreira do pai, a agenda de shows tanto do grupo que mantém com os irmãos, como a do pai, dificultava o contato entre eles. "A última vez que o encontrei foi no São João de 2004. A Paraíba está em luto por causa da morte do meu pai, ninguém esperava porque ele estava em um momento muito bom da carreira dele. Ele esteve em Campina Grande semana passada, mas não nos falamos", lamenta.
Lucimar explica que as divergências existentes entre ela, os filhos e a atual família de Elino Julião tornaram a convivência difícil. "Há 7 anos ele não via Júnior e Priscila. Mas tivemos muitos momentos bons e agora o que queremos é perpetuar o que ele deixou. Dos anos que vivemos juntos, além de termos em comum o amor pela música e cantar, tivemos quatro filhos, mas o mais novo, João Paulo, morreu aos 8 meses. O céu nublado de hoje foi em homenagem a Elino Julião que adorava a chuva", diz.
Maria Veneranda de Araújo, atual mulher de Elino Julião, ressalta que morte do marido aconteceu no auge de sua carreira. "Ele conseguiu assumir a paternidade das suas mais de 400 obras, inclusive muitas que as pessoas até hoje não sabem que são dele. Agora vivemos um momento de perda de um dos maiores incentivadores da cultura popular.
Nos últimos dias ele soube que seria homenageado pela Prefeitura de Natal durante o São João deste ano, e gravou um documentário pela TV Globo Nordeste (que será transmitido no dia 17 de junho) no qual reconstruiu sua trajetória e contou como era sua vida em Timbaúba dos Batistas, quando cantava e tocava batendo em lata, depois fugindo em um caminhão para Natal, a amizade com Jackson do Pandeiro e depois o seu auge tocando com Dominguinhos no Forró da Lua, no último dia 13. Ele também estava lançando o CD 'Dentro do Movimento', todo produzido cuidadosamente por ele. E ainda estava em estúdio gravando outro disco", conta Veneranda, que também é compositora e costumava fazer a divulgação de todos os trabalhos do marido. "Ele morreu nos meus braços e de Arakém, minutos depois de ter me pedido para que ficasse com a aliança dele 'pois ela estava folgada'", relembra a viúva.
O último adeus ao forrozeiro
Músicos, produtores culturais, artistas, políticos e populares. Todos juntos em torno de um mesmo nome: Elino Julião. O músico, cantor e compositor que na década de 60 conseguiu um espaço nas rádios do país graças ao poder de sua música. A última homenagem, de corpo presente, feita ao ícone do forró pé-de-serra foi durante o seu velório, realizado ao som da música que ele tanto amava.
O produtor cultural Zé Dias enfatiza que a morte de Elino Julião representa a perda do último cantor nordestino popular que fez o rádio se render ao seu talento. "Depois de ter conquistado o sucesso nos anos 60, Elino foi esquecido, caiu no ostracismo na década de 90 e no começo dos anos 2000, Dácio Galvão, Candinha Bezerra e Marcos Lopes (idealizador do Forró da Lua) se uniram para resgatá-lo, colocando-o de volta no lugar de onde ele jamais deveria ter saído, perto do povo. Elino foi do mesmo tamanho de nomes como Jackson do Pandeiro e Luiz Gonzaga, que também foram seus parceiros. A obra dele está acima da média e não há dúvida de que estamos órfãos", diz.
A cantora Khrystal esteve no velório e, bastante emocionada, lembrou o show do reveillon deste ano do Beco da Lama, no qual dividiu o palco com Elino Julião. "Ele era a tradição da música nordestina e agora a fórmula acabou. Somos os responsáveis por levar tudo isso adiante, cada um a sua maneira. Sempre fui louca por ele, vou lançar meu novo CD em julho e nele gravei uma música dele, o 'Forró da Coréia', mas como minha música é uma mistura de rock com forró, e por isso meio psicodélica, ficava me perguntando se Elino iria gostar. Infelizmente não deu tempo dele ver", lamenta.
O presidente da Fundação Capitania das Artes (Funcarte), Dácio Galvão, afirma que o Brasil acaba de perder o último representante de uma geração da elite do forró. "Ano retrasado faleceu Jacinto Silva que foi parceiro de Elino. O trabalho dele sempre teve consistência, assim como o de Jackson do Pandeiro e Luiz Gonzaga, e exatamente por isso trabalhamos para traze-lo de volta ao cenário musical em um momento em que ele estava completamente excluído. A Prefeitura realizou a gravação de dois CDs dele, o 'Canto do Seridó' I e II, com a participação de nomes como Elba Ramalho, Zeca Baleiro, Lenine, Xangai, sanfoneiros como Toninho Ferragui, além do reencontro com Dominguinhos. Todos esses artistas se entregaram ao projeto pela pessoa de Elino e não pelo cachê. Esta é sem dúvida uma grande perda, tanto local como nacional", enfatiza.
A Prefeitura de Natal vai homenagear o forrozeiro no São João deste ano. De acordo com o prefeito Carlos Eduardo, durante o lançamento da festa, 20 dias atrás, Elino dançou e cantou muito ao receber a notícia. "Ele estava muito feliz com a homenagem, mas, infelizmente, agora será póstuma", observa.
Durante a missa, alguns fãs choravam bastante, como Cléofas Caldas, 45 anos. Natural de Assu, ele afirma que acompanhava o forrozeiro desde a infância. "Tenho diversos discos dele e sua morte é como se estivesse ficando órfão, culturalmente mais pobre". O mesmo sentimento carrega sua mulher, Zelda, que por influência de Cléofas passou a admirar o trabalho de Elino Julião. "Ele é um artista que merece a homenagem que está recebendo, mas infelizmente somos da terra do 'já teve' que espera as pessoas morrerem para lembrar o que elas fizeram", afirma.
Lainês Batista de Araújo, 74 anos, é de Timbaúba dos Batistas - terra natal de seu ídolo. Durante o velório permaneceu ao lado do caixão e seguiu, com o primo, José Gerson de Araújo, para o enterro realizado no Cemitério Morada da Paz, em Emaús. "Acompanhava o trabalho dele, somos conterrâneos. Fiquei bastante emocionado ao saber da morte dele e não poderia deixar de vir aqui, gosto muito dele e lembro que quando ele trabalhava no sítio do prefeito, lá do município, ele via se ia chover quanto relampejava e por isso escreveu aquela música 'Relampeou'. Uma pena não terem cantado hoje", disse enxugando as lágrimas.
Élida Mercês
Elino cala, o sertão chora
Diário de Natal, 23.05.06
Expressão maior da música norte-riograndense, Elino Julião da Silva deixa uma imensa obra musical construída em mais de 50 anos de carreira. O artista, falecido na noite do último sábado, gravou 48 Lps e nove CDs,compôs até seus ultimos dias cerca de 400 canções entre forrós, xotes, baiões, xaxados, marchas juninas, baladas e até um rock (Rock do Camelo). Gravou ainda cerca de 300 canções de outros autores. Mas foram os clássicos Rabo do Jumento, Xodó do Motorista, Na Sombra do Juazeiro, Filho de Goiamum, O Burro e Forró da Coréia e A festa do Senhor São João que o elevaram à condição de mito, tal qual o paraibano Jackson do Pandeiro de quem foi ritimista e amigo.
Nascido em Timbaúba dos Batistas, Seridó, em 13 de novembro de 1936, Elino Julião da Silva era filho de Francisca Augusta, uma lavadeira que ajudava a na criação de treze filhos. O pais, Sebastião Pequeno, era tocador de cavaquinho e concertina. Ainda criança trabalhou como carregador de água e alegrava os habitantes da fazenda onde morava cantando e batendo em latas as músicas que aprendia nas festas de Sant’Ana em Caicó.
Rádio Poti
Aos 14 anos veio para Natal de carona e foi morar com uma tia no bairro das Quintas. Logo estava participando do programa Domingo Alegre, apresentado por Genar Wanderley na Rádio Poti. Obteve reconhecimento. Na emissora, cantava Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro e outros. Padre Eymard Lérecat Monteiro, amigo da família, o ajudou nos estudos à noite no Colégio Marista
Foi também na Poti, segundo relatou à revista Brouhaha em sua última entrevista, que conheceu Jackson do Pandeiro, após apresentar-se no auditório da emissora. O paraibano convidou Julião para juntar-se ao seu grupo. O ingresso definitivo só se daria no ano seguinte após Elino cumprir o serviço militar. Foi para o Rio de Janeiro onde passou oito anos na banda tocando triângulo e pandeiro e percorrendo todo o país.
Incentivado por Jackson gravou o primeiro disco em 1961, na gravadora Chanticlê, que além dele, lançou à época Noca do Acordeon, João Silva, Geraldo Nunes, Mineiro e Teixeirinha
Despertou a atenção da Phillips/Polygram e posteriormente da CBS, nesta graças ao interesse do produtor Abdias Filho, marido de Marinez e sua Gente, responsável pelo cast nordestino da gravadora Foi aí que compôs os sucessos - Relabucho (interpretado por Sebastião do Rojão), A festa do Senhor São João, Xodó do motorista (‘‘não há quem resistas/ser motorista sem ter um amor’’) e Puxando fogo, as duas últimas o promoveram bastante como intérprete com presença freqüente em emissoras de TV e Rádio.
Em meio ao sucesso saiu do Rio e foi para São Paulo trabalhar com Pedro Sertanejo (pai de Oswaldinho do Acordeon), permanecendo por seis anos. Luiz Gonzaga estreou o show Chapéu de couro na TV Cultura e o convidou para trabalhar como ritmista. Nesse período o seridoense morou com o Rei do Baião e seu irmão Zé Gonzaga.
Homenagem ao Cantor do Seridó
Uma homenagem especial a Elino Julião marca o projeto Seis e Meia desta noite. O cantor Romil Soares, atração potiguar cantarça canções do autor de Rabo do Jumento. O último show do mês de maio do projeto Seis & Meia terá a cantora mineira Maria Alcina que interpretará sucesso nas décadas de 70 e 80
O show começa às 18h30 e os ingressos estão sendo vendidos na bilheteria do Teatro Alberto Maranhão ao preço de R$ 20,00 (inteira) e R$ 10,00 (estudantes e idosos).
Completando 25 anos de Carreira, o show de Romildo terá a participação de Pedro Mendes, Geraldo Carvalho, Valéria Oliveira, Khrystal. Na banda estão os músicos Paulo Brunis e Riva (guitarra),Ranier (baixo), Juquinha (bateria) e Gabriel Souto.
Maria Alcina é mineira de Cataguases. Foi para o Rio de Janeiro em 1972 decidida a seguir carreira como cantora, fazendo sua estréia no Maracanãzinho vencendo um festival com a música “Fio Maravilha‘‘, de Jorge Benjor. Com voz grave e estilo irreverente, chegou a ser comparada a Carmen Miranda pelo guarda-roupas escandaloso. Fez sucesso em 1973 interpretando “Alô Alô‘‘, samba de André Filho consagrado por Carmen.
Alcina sempre incluiu em seu repertório músicas dos ícones do rádio, como Marlene, Emilinha Borba, Aracy de Almeida, Bando da Lua, Lana Bittencourt e Carmen Costa. Outro de seus maiores sucessos, em 1974, foi “Kid Cavaquinho‘‘, de João Bosco e Aldir Blanc.
Depois de um período longe das gravações e palcos, gravou em 1992 o disco “Bucaneira‘‘. Mais tarde, em 1995, foi ao Estados Unidos participar de uma homenagem a Carmen Miranda.
Atualmente lançou um CD ao lado do Grupo Paulista Bojo e tem se apresentado com o show ôAlmas femininas‘‘, que é um homenagem as grandes intérpretes. Este será a base do seu repertório para a apresentação do Seis & Meia desta terça-feira, além de sucessos consagrados na sua voz.
No Forró da Lua, o último show
Baiano Fotografia/Divulgação
O último registro fotográfico de uma apresentação de Elino Julião foi realizado no dia 13 de maio no Forró da Lua
A lua tomava conta do céu quando Elino Julião subiu no palco pela última vez. O calendário marcava 13 de maio. Cheio de vitalidade, ele parecia estar adivinhando que seria a sua despedida. Em um momento de grande felicidade, tanto profissional quanto pessoal, a sua música convidou casais para lotarem o salão do Relabucho, construído em sua homenagem no conhecido Forró da Lua, na Lagoa do Bonfim. Quando entrava em cena ele voltava a infância, pulava, cantava e dançava muito. A sua maior alegria era ver o salão repleto de gente dançando. Depois de sua apresentação ele cedeu o palco para o amigo Dominguinhos. "Foi um sucesso", afirmou Marcos Lopes, proprietário do local.
"Naquele dia ele estava muito feliz. Todos os músicos se cansaram e ele não. Ainda voltou para o palco para fazer uma participação no show de Dominguinhos", acrecenta o periussinista de sua banda, Michel Artur de Miranda. Marcos Lopes lembrar de uma conversa com Dominguinhos, em sua casa, ‘‘ele lembrando que tocou com Elino no início de sua carreira. Eles eram amigos e quando liguei para Dominguinhos para dar a notícia ele se emocionou’’
Lopes, que é fã e conhecedor da obra de Elino, fará uma homenagem ao forrozeiro no próximo Forró da Lua, em 10 de junho. "Vou pedir aos sanfoneiros de Natal que façam um repertório em cima das músicas de Elino. Ele era uma pessoa muito humilde, muito simples. Uma pessoa excelente. Era a maior representatividade da música de raiz do nosso estado".
Grandes gravadoras e discos independentes
Elino Julião permaneceu 23 anos na CBS e seu contrato terminou devido a uma política da gravadora que passou a previlegiar cantores estrangeiros em detrimento dos artistas regionais.
A partir dos anos 80, já definitivamente consagrado em toda a região, passou a gravar num esquema independente, priorizando apresentações em cidades do interior do Nordeste, principalmente no período junino. Apresentou-se em todos os estados brasileiros divulgando a raiz da música nordestina. Nunca parou de compor.
Em 1997 voltou a se fixar em Natal em uma casa em Cidade Satélite. ‘‘Eu enjoei do Sul e descobri que poderia morar em qualquer lugar trabalhar’’. Costumava a dizer. Gravou dois discos - O canto do Seridó e Canto de Seridó , produzidos pelo Projeto Nação Potiguar com a presença de artistas como Marinês, Fagner, Dominguinhos, Tetê Spíndolla, Ná Ozetti, Lenine, Xangai, Oswaldinho do Acordeon, entre outros. Nos últimos anos sua produção alcançara dimensão internacional chegando a países de língua portuguesa como Portugal e Angola e também à Bélgica, graças a participação de Elino no evento Brasil 500 realizado em Lisboa em 2000.
Inúmeros artistas gravaram suas canções: Luiz Gonzaga (Meu Saudoso Ceará). Jackson do Pandeiro (Na Bodega do Expedito), Anastácia, Geraldo Correia, Abdias, Genival Lacerda, Inezita Barroso, Coronel Ludogero, Zé Gonzaga, Dodô e Osmar, Jorge de Altinho,Marinês, Trio Nordestino, Sebastião do Rojo, Marinalva, Capilé, Lenine, Elba Ramalho. Zeca Baleiro, Xangai e Fagner Chico César, Silvério Pessoa.
Entre a sanfona de Gonzaga e a poesia de Jackson
Elino Julião é daqueles artistas onde o destino parece ter assentado como sina em sua vida. Não por ser nordestino. Talvez por ser natalense. O que mais os artistas populares locais reclamam, muitos donos de talento digno de reconhecimento mundial, é a falta de bairrismo dos potiguares. Pernambuco fez conhecido Luiz Gonzaga: fez conhecido o nordestino. A Paraíba distribuiu a poesia de Jackson do Pandeiro, a voz "arrochada" de Marinês. No Ceará, uma "turma" de artistas também se projetou nacionalmente.
Em Natal temos Elino Julião. E se ele debandou-se para o sul logo cedo, ainda nos anos 50, não foi por causa da seca, mas por falta de espaço nas rádios locais. O reconhecimento de seu trabalho em sua terra natal foi tardio. Não tem 15 anos. E foi pouco para a grandiosidade de sua obra. São 48 LPs e nove CDs gravados. Quase 400 composições. Um de seus clássicos foi gravado por Jackson do Pandeiro (Na bodega do Expedito). Mas muitos foram os intérpretes – aqueles cantores que sabem reconhecer uma boa música – que adotaram suas composições: Chico César, Silvério Pessoa, Marinês, Zeca Baleiro, Dominguinhos.. a se perder de conta.
Seu último CD, ainda inédito, intitulado Dentro do movimento traz alguns desses clássicos, além de quatro músicas inéditas: Meu novo caso, Embalo pé de serra, O sapo e a faixa que dá nome ao CD. Todas composições próprias. Todas ainda fiéis ao ritmo que adotou em seus mais de 50 anos de carreira. Letras simples a contar causos, costumes, cenários, alegrias e tristezas de ser sertanejo; do ser nordestino. Em Embalo pé de serra, ele diz: "Eu vou voltar pra minha terra/ Meu pé de serra/ Onde eu tenho alegria/ Eu sempre gostei dessa cidade/ Mas nunca encontrei felicidade".
É que Natal não é mesmo bairrista (será mesmo defeito valorizar o talento local?). Quando da notícia de sua morte, ouvi muitos perplexos a perguntar: "Quem é esse?". E como Elino Julião ainda temos alguns ícones, dignos de melhor reconhecimento e incentivo. No forró pé de serra ele foi o último, talvez do Nordeste; uma linhagem de bambas que se encerra aqui, em Natal.
Cultura perde Elino Julião
Carlos Santos/DN
Fãs, amigos e familiares em oração
Morreu por volta das 21h30 de sábado, aos 69 anos, o cantor e compositor Elino Julião. Ritmista de Jackson do Pandeiro e parceiro de nomes como Luiz Gonzaga, Dominguinhos e Inezita Barroso, Elino Julião da Silva foi vítima de um aneurisma cerebral. A morte de um dos maiores ícones da música popular brasileira comoveu grande parte da cena cultural do Estado, que compareceu ao Palácio Potengi, durante a tarde e a noite de anteontem, onde foi realizado o velório do cantor.
Pai de 14 filhos e casado há 10 anos com Maria Veneranda de Araújo, Elino Julião teve como últimos trabalhos autorais gravados as canções Embalo pé de serra, Dentro do movimento, O sapo e Meu novo caso, que fazem parte do CD Elino Julião dentro do movimento, 49º disco do músico, que, em 53 anos de carreira, compôs mais de 400 músicas. Somadas às interpretações, esse número ultrapassa a marca dos 700 trabalhos, gravados, muitas vezes, em parceria de músicos como Joca Costa, Jubileu Filho, responsáveis pelo arranjo de obras de Elino Julião.
A última apresentação de Elino, foi no dia 13 de maio, no Forró da Lua, ao lado de Dominguinhos. Homenageado com o título de cidadão natalense, concedido pela Câmara Municipal, em novembro de 2005, Elino Julião morre em casa, quando assistia à TV. O cantor, segundo disse a viúva Veneranda de Araújo à reportagem do Diário de Natal, sentiu fortes dores de cabeça e caiu da cama, repentinamente.
"Ele teve uma reação súbita. Ele caiu da cama, aí levantou. Ele teve um dia muito alegre ontem, passou o dia todo cantando. Embalou uns 12 discos para entregar nas rádios. Em seguida, ele avisou que estava com muita dor de cabeça de ar. Fizemos massagem e respiração boca a boca. Ligamos para o 192, mas quando o Samu chegou ele já tinha morrido", contou Veneranda.
Nascido em Timbaúba dos Batistas, Elino Julião foi tema de dois cordéis: O forrozeiro do sertão, obra de Chicó Gomes; e Mil reis do forró, de autoria do poeta Bob Motta, integrante da Academia de Trovas do Rio Grande do Norte e um dos primeiros a chegar ao Palácio Potengi, para dar o último adeus ao "meu parceiro véi, que vi pela última vez em novembro". O poeta classificou o episódio que marca a perda de Elino Julião como 'inavaliável'. "Não dá para imaginar alguém, mesmo com tantos outros bons artistas, que ocupe o espólio cultural desse homem", comentou Bob Motta.
Em 13 de maio foi entrevistado no programa especial de aniversário de um ano do Toque de Rádio, veiculado na Rádio Poti. Bob Motta o conheceu em Campina Grande, nos idos da década de 1970, no Forró do Zé Lagoa, no Auditório da Rádio Borborema. "Meu pai tinha propriedade por lá e eu, que vivia mais no meio do mato, gostava também de ir ao Forró do Zé Lagoa", lembrou o poeta. Além dele, outro que chegou ao Palácio Potengi muito antes das 17h44 - momento exato da chegada do corpo -, foi o cantor e compositor Chiquinho do Acordeon.
Coincidentemente, ele tocou seis músicas de Elino Julião, na noite em que o mesmo morreu, em meio à uma apresentação realizada no Circuito Estadual de Exposições Agropecuárias, em Caicó. Dentre elas, estavam obras como Na sombra do juazeiro e Rabo do jumento. Elino Julião ainda compôs sucessos presentes no imaginário popular, como é o caso de Na minha rede não, Filho de goiamum e Forró da Coréia.
Em sua agenda, estavam previstos shows em Timbaúba dos Batistas, em 15 de junho, na Casa de Cultura Elino Julião; em Mossoró, durante o Mossoró Cidade Junina, no dia seguinte e em Campina Grande, onde há mais de 20 anos ele participa do São João. Em 22 do próximo mês, ele tocaria ainda em Sítio Novo, e, dois dias depois, em Natal.
VELÓRIO
"Elino de Natal, Elino do Rio Grande do Norte, Elino de Timbaúba, Elino do Nordeste, Elino do Brasil, Elino do Rabo do Jumento, Elino do Rela Bucho, Elino da Coréia. Elino não morreu, se transformou, se encantou!". Este foi o discurso feito por Francisco de Assis Nascimento, sobrinho de Elino Julião, por volta das 18h de domingo, durante o velório. Cerca de quatro horas, por volta das 14h, uma dúzia de pessoas já esperava a chegada do corpo.
A diretora do Teatro Sandoval Vanderley, Ivonete Albano, foi uma das primeiras a chegar ao Palácio Potengi, e, abraçada ao produtor cultural José Dias, chorou a morte de Elino Julião. "É uma perda muito grande por ele ter sido um ícone da MPB. Soube da notícia através de Beethoven (músico), 15min depois de Elino morrer. Depois disso, falei com Veneranda, que me na hora disse ainda não entender o que realmente estava acontecendo. Ela pediu o apoio dos amigos", disse Ivonete Albano. A Fundação Cultural Capitania das Artes homenageará Elino Julião neste São João.
Um dos mais emocionados no velório era José Dias. "Vai ficar uma lacuna grande. Elino era do nível de Jackson do Pandeiro, de Luís Gonzaga e o São João no céu vai ser arrebatador, o São João em Natal vai ser talvez o mais triste. Ele foi um grande artista". Um ônibus vindo de Timbaúba dos Batistas trouxe amigos e familiares de Elino Julião para o velório, que terminou por volta das 22h. A edição de hoje à noite do Projeto Seis & Meia prestará homenagem póstuma ao cantor.
Forró domina velório do artista
O semblante sério que exibia e o paletó com o qual estava no caixão, nem de longe lembravam a pessoa que foi Elino Julião, sempre sorridente e com a camisas estampadas para combinar com a alegria que ele tinha de viver. No Salão Nobre do Palácio da Cultura, seu corpo foi velado pelos irmãos, filhos, amigos, artistas e admiradores. Por volta das 8h30 de ontem o padre Antônio Murilo iniciou a celebração da missa de corpo presente. Antes, o grupo Os Meirinhos do Forró, acompanhados pela flauta de Carlos Zens e de Danúbio Gomes, regente do grupo Pau e Lata, foi prestada uma homenagem a Elino através de suas músicas.
Toda a missa foi no ritmo que ele tanto ajudou a divulgar, as músicas religiosas todas foram cantadas como um forró. Ao final, Isaque Galvão cantou diversas canções do compositor para dar adeus ao representante da cultura popular. Na ocasião, diversos filhos seus prestaram a última homenagem ao pai, comparecendo em seu velório e sepultamento. Do Rio de Janeiro veio Magnólia, irmã de Simone que mora em Recife e também esteve presente.
Filhos
Vindos de Campina Grande estavam presentes Elino Julião Júnior, seus irmãos André e Priscila, acompanhados da mãe Lucimar Costa da Silva que viveu com Elino 29 anos. "A gente estava tocando no sábado quando recebeu a notícia", contou André bastante emocionado. Junto com os irmãos, ele forma o grupo de forró Os manos. Elino Júnior durante vários momentos do velório permaneceu ao lado do corpo do pai e chorava muito, "Não vá meu pai. Você sempre foi o meu orgulho", dizia enquanto chorava. "Vai ficar todo mundo, não deixe a gente", dizia André, amparado pela irmã Priscila.
Também foi ver o pai pela última vez Marco Antônio, um caminhoneiro que mora em Santa Cruz e somente este ano conheceu Elino, "só vi meu pai esse ano, tudo o que sei dele é através do que me contam. Hoje também conheci alguns irmãos meus". Outro filho presente era Arakem, o único que morava atualmente com ele, filho da união com Maria Veneranda de Araújo, sua mulher. Os irmãos de Elino também estavam muito emocionados, alguns artistas não conseguiram conter as lágrimas.
Sepultamento
Depois das 10h, o cortejo partiu em direção ao cemitério Morada da Paz. Uma longa fila de carros tomou conta da BR-101. O corpo de Elino foi recebido ao som de sua música mais famosa O rabo do jumento, tocada pelos Meirinhos do Forró. E foi ao som do forró, como Elino gostava, que ele foi enterrado. Os artistas presentes, como Galvão Filho, Dimas Carlos, Valéria Oliveira, Fernando Luiz, Khrystal, Isaque Galvão, Roberto do Acordeon, entre outros, entoaram músicas conhecidas do forrozeiro como Forró da coréia, Na sombra do juazeiro, Cajueiro de Pirangi, Cofrinho do amor, O burro, entre outras.
Centro Cultural terá nome do cantor
O cantor e compositor Elino Julião, tinha uma identidade muito forte, com o município de Timbaúba dos Batistas, onde a Casa da Cultura, que está em fase de conclusão receberá o seu nome. O prefeito Ivanildo Filho, que ontem esteve em Natal, participando dos funerais do artista, lamentou sua morte. “Sem dúvida alguma é uma perda irreparável, não só para o município, pelo qual Elino tinha um carinho profundo, não tendo esquecido nunca a sua origem. A gente tem uma profunda gratidão, por Elino Julião, por tudo que ele representou e ainda representa, porque se foi o homem, mas ficou a sua obra”.
Como reconhecimento pelo que representava Elino Julião, no meio artístico do Rio Grande do Norte, o prefeito Ivanildo Filho já tinha decidido homenageá-lo, dando seu nome, à Casa da Cultura que será inaugurada no próximo mês.
“Creio que existem ícones nas nossas vidas e na nossa cidade, que a gente precisa dar uma maior relevância, ressaltar. Timbaúba dos Batistas é conhecida pelo bordado, a gente está fazendo um Centro de Artesanato e Timbaúba também é conhecida pelos seus artistas, notadamente pela pessoa de Elino Julião e a gente pretendia fazer uma homenagem em vida a ele”, declarou.
A obra está sendo edificada numa parceria da prefeitura com o governo do estado. “Elino Julião já havia agendado para fazer no dia 15 de junho, uma apresentação em Timbaúba dos Batistas, na inauguração da Casa da Cultura. Agora infelizmente a homenagem vai ser “in memoriam”, à sua imagem, à sua história e vamos trazer para se apresentar nesta data, o grupo de forró, que é integrado pelos filhos dele”, assinalou o prefeito Ivanildo Filho.
“Eu vou te esperar na sombra do Juazeiro”
João Maria Alves
ADEUS
No sepultamento, ontem, o adeus de amigos e o carinho dos fãs
Tribuna do Norte
23/05/2006
Rafael Duarte e Tádzio França
Elino Julião, 69 anos, trouxe o sertão nordestino para ver o mar durante o tempo em que danou a bandeira do forró no pé-de-serra mais autêntico da cultura brasileira.
E foi assim, na companhia da sanfona, da zabumba, de um triângulo, um pandeiro e um cavaquinho dos “Meirinhos do Forró” que Julião deixou as boas lembranças para os fãs, amigos e a família — que mesmo dividida pela fronteira física se uniu para prestar as últimas homenagens. O sepultamento do corpo da maior referência da cultura popular no Rio Grande do Norte ocorreu às 10h30 de ontem no cemitério Morada da Paz em meio à comoção popular e muito forró pé-de-serra.
Julião foi vítima de um aneurisma cerebral. Ele estava dormindo em casa por volta das 21h30 do sábado quando caiu da cama e foi socorrido pela esposa Maria Veneranda de Araújo. “Ele ainda disse que estava bem, mas reclamava de uma forte dor de cabeça. A mão dele estava contorcida. Em seguida, apagou. Ainda fizemos respiração boca a boca, mas não adiantou. Quando o SAMU chegou ele já estava morto”, contou emocionada logo que chegou ao velório realizado domingo no Palácio da Cultura.
O que mais surpreendeu parentes e amigos que conviviam com ele, foi a forma repentina como tudo aconteceu. “Ele estava com todas as taxas em dia, o médico disse que a saúde estava muito bem. Na manhã de sábado ele acordou cedo, saiu para caminhar, depois vendeu discos, distribuiu autógrafos, recebeu amigos... foi de repente. A gente ia começar a distribuir o novo CD “Elino Julião - Dentro do Movimento” esta semana para a imprensa. Ele ia trabalhar o disco no São João”, contou.
Através das canções consagradas na voz e no coração de gente tão grande quanto a obra que começou a montar ainda no lombo do jumento (antes do faca de Nascimento), na fazenda Toco, município de Timbaúba dos Batistas, região do Seridó, Elino Julião criou uma barreira contra qualquer estágio de tristeza.
Aos poucos, as lágrimas deram lugar à alegria das letras que deixou de presente na praça. Teve o brega “Cofrinho do amor”, os sucessos “Forró da Coréia”, “Rabo do Jumento”, “Coqueiro Pirangi” e a quase profética “Vá com jeito”, todas puxadas pelo músico Isaque Galvão - o “filho de Guaiamum” do forrozeiro. “Meus primeiros discos tiveram participação de Elino. No segundo cantei o repertório dele. Lembro que quando acabamos de gravar ele me chamou e disse que eu era seu filho de Guaiamum. Respondi que ele era o pai, nós rimos e me deu um grande abraço. É isso que fica”, conta.
Julião deixa uma obra intensa com mais de 700 composições, contando ainda participações nos trabalhos dos parceiros e de outros músicos. Ainda assim, existe um acervo guardado no baú da família. “Tenho que sentar com calma e ver quantas músicas inéditas ele deixou. Não posso dizer quantas são agora, tenho que esperar um pouco para me recuperar”, disse a companheira, amor e amiga Veneranda.
Julião também estava engajado no lançamento de um DVD e da própria biografia. O amigo e jornalista Alex de Souza afirmou que possui material suficiente, mas não sabe se terá condições de encampar o trabalho após a perda do músico. A criação da Fundação Elino Julião, no bairro Cidade Satélite, também era um sonho. Agora, os amigos prometem transformar a idéia num grande Memorial.
Elino Julião foi músico, representante da cultura popular brasileira, amigo, mas antes de tudo, foi pai e marido. Atualmente, morava na casa da esposa e do filho Araken Araújo, no bairro Cidade Satélite. Veneranda sempre foi tida por quem conhecia o casal como a fortaleza de Elino. Sempre presente, deixava tudo pronto. O filho mencionou a ausência paterna, mas definiu o momento com orgulho quando indagado sobre a importância do pai num dos depoimentos mais emocionados. “Como pai ele era um artista. Mas o importante é que ele sabia que eu o amava e eu sabia que ele me amava”, desabafou.
Elino se perpetua em sua obra
Tribuna do Norte
23.05.06
A primeira oportunidade da carreira de Elino Julião foi dada no início da década de 50 pelo radialista Genar Wanderley, que comandava o programa de auditório Domingo Alegre na rádio Poti. Na época, morava no bairro das Quintas com a família, onde ficou por 18 anos. Após o alistamento militar, voltou à rádio e conheceu o futuro parceiro Jackson do Pandeiro, que o convidou para integrar a banda dele no Rio de Janeiro. Mas acabou conhecendo o Brasil inteiro.
Desse tempo, dizia que cantava mais que Vicente Celestino, apesar da dificuldade em gravar. O trabalho autoral de Elino começou em 1961, na casa de Jackson, quando gravou o primeiro disco pela Chanticlê.
As decepções vieram quando Teixeirinha, que lançara o trabalho ao mesmo tempo que ele, fez sucesso primeiro. Mas Jackson o demoveu da idéia de abandonar a carreira. A mudança de gravadora surtiu efeito. Pela Philips/Poligran gravou os primeiros sucessos, como Puxa-fogo e Xodó do Motorista, que logo viraram hits. Em seguida, foi para a CBS, hoje Sony Music, onde ficou 23 anos.
Ainda no Rio, foi contratado da extinta Rádio Tupi e da Rádio Nacional. São Paulo virou casa por seis anos , quando conheceu Oswaldinho do Acordeon, Luiz Gonzaga e o irmão dele, Zé Gonzaga. O fim do casamento com a CBS, que chegou a promover uma caravana com os músicos pelo Brasil, acabou em 1986, para dar lugar a Michael Jackson e Júlio Iglesias..
Mesmo assim, à essa altura do campeonato, onde se acende uma fogueira Julião tem que estar presente. Do sertão ou nas vilas suburbanas existe um pedaço de Elino. A irreverência e o humor das letras, espécie de crônicas sociais, chegaram a lhe render a alcunha de machista, como quando gravou, já em Natal, o CD “A mulher é quem manda”. Numa das letras, Julião retratava a realidade das mulheres que gostam de apanhar dos maridos. Sobre os anos de carreira, desconversava, como lembra a viúva Veneranda. “Ele só dizia que tinha 50 anos de Rio de Janeiro”, contou.
Um fervoroso torcedor do América
Elino Julião colecionou paixões arrebatadoras na carreira. “Caba invocado” quando o assunto era o coração das donzelas que passaram feito cavalo celado em sua frente, o peito do forrozeiro também ardia por um outro encantamento.
De acordo com o sobrinho Francisco Nascimento, Julião balançava pelo América. O que pouca gente sabe é que dentro daquela máquina de produzir sucessos populares havia um torcedor vibrante daqueles que se descabelam quando o time vai mal e enchem o peito para contar vantagem com o maior rival. “Ele torcia mesmo. Quando ele estava em Natal a gente ia muito para o Machadão ver os jogos do América. Meu tio torcia muito, adorava futebol”, conta.
Francisco lembra de uma história passada em 1997, quando o Mecão figurava entre os principais clubes do país, na série A do campeonato brasileiro. “Não lembro agora qual foi o jogo, mas cheguei na casa dele e foi logo dizendo: `Meu sobrinho, vamos ao estádio? ´ Sim senhor, respondi. Lembro que ainda falei que a vitória daquele dia seria dedicada a ele, que riu antes da gente ir. Foi bom porque conseguimos ganhar o jogo. Ele teve até um desentendimento com um pessoal na emoção da vitória, mas conseguimos contornar a situação. Elino era assim, quando o América entrava em campo era daquele tipo de torcedor que vibrava muito”, disse.
Durante o sepultamento, o sobrinho sentiu a falta da bandeira do clube do coração no caixão. “Acho que ele deve estar reclamando em algum lugar do céu”, afirmou.