"Ouvi [do senador Renan Calheiros] que seria muito difícil ter candidato por conta da verticalização. Saio magoado porque achei que podíamos sentar para conversar. Ele está inflexível."
Senador Pedro Simon, tentando construir sua candidatura à presidência pelo PMDB
Alex Gurgel
Fábio de Ojuara, depois do Salão da Capitania,
criou o movimento “Toda Merda Agora é Arte”
VIA DOLOROSA
Há dias
Que a inércia
Vence,
Me leva, me traz
Me abandona, me convence
Há dias
Que a iniciativa
Chama
Me assedia, me acorda
Me sacode, me reclama
Há dias
Que a realidade
Machuca
Me afronta, me encanta
Me saboreia, me espanta
Há dias
Que a hostilidade
Inspira
Me satura, me instiga
Me fatiga, me atormenta
Há dias
Que a inocência
Aparece
Me surpreende, me entende
Me alerta, me compreende
Há dias
Que o silêncio
Provoca
Me engole, me domina
Me vicia, me ilumina
Deborah Milgram
Caro Eduardo,
Vejo que o forró Eliniano está sempre pegando fogo. Que Bom!
Estou aqui na Itália, gravando mais um CD. Se chama “Mar”. Estamos em curso: violinos, violas, cello, baixo, percussão, coro, eu e o violão.
Canções minhas adormentadas nos cadernos que vou enchendo diariamente com notas e letras. Adotei a regra de pescar tudo. Às vezes, até cai peixe bom. O pessoal gosta e me anima a sair da minha rede em Cidade Verde, pra tocar aqui nos teatros de Trento, Roma, Nápoles, Riva del Garda e, logo em seguida, Nova Iorque, aonde me espera um lançamento de outro CD, que quase ficou na sucata das torres. Aquela estória: lagartixa adora escombros.
Reapareceu com direito a lançamento no Joe's Pub, em NY, e tour em agosto, em alguns estados dos Estados Unidos. Vamos lá: rede é bom, mas tem que trabalhar também, um pouquinho, noutros balanços ritmados pelo business, o qual, cada dia, me independentizo mais para poder voar e cantar realmente feito passarinho. Vou porque, afinal, os produtores rendem contas com as Cias. distribuidoras. Contudo, agora tô comendo macarrão do bom e vinho do bótimo aqui em Roma, que também é minha casa.
Este e-mail tá ficando ridiculamente grande e babado de babados chovinistas. Abraço procê. Obrigado pela new do beco.
Tico da Costa
CAR(NA)TÉIS
Alguns amigos, transeuntes
(e até personas de relação intermediada pelas parassimpáticas)
têm me perguntado por que não apresentei o MPBeco.
Declinei respondendo que nem sequer pude
comparecer a primeira classificatória
ou mesmo a posse dos confrades.
O fígado acusa esbórnias, boemias e farras homéricas (e precoces).
Assolado por cruel ressaca e delirium tremens
amarrei o bode e a dor-de-cotovelo da ausência.
Em verdade, não fui convidado pelo dileto amigo Dorilima
e acho que o brother Abadon
dá plena e performaticamente a conta do recado
ele, discípulo do poeta da praça (do poeta) Antônio Short
e cúmplice de histórias mis na Natalvesmaia.
Se convidado, também não sei se toparia.
Como ágora, desejo o Beco sem responsabilidades
ou preocupações organizacionais
out side levitante na lama.
Soteropolitanamente, seu Silvasaura Jabaquara Ululante matou a charada,
o apresentador foi imposição da Destaque
única exigência dos meninos do staff da governança
era essencial haver no palco a presença
de no mínimo um baiano.
Plínio Sanderson
O ROCK DOS GROGS, A BABA DO BÊBO E O MPBECO
Sábado, 19 de maio. Boquinha da noite. 2ª eliminatória do primeiro festival de Música Popular do Beco, o MPBeco. Pelo palco, estrelas regionais distribuíram brilhos e acordes. Sou suspeita para falar. Claro que os do peito ganhariam ovações. Mas, como não pude prestigiar as apresentações, não posso falar de preferências ou deferências. Apenas de encerramento.
E ele foi em alto estilo. O bom e velho rock and roll e seu antecedente e ainda vizinho blues agitaram a multidão que fez as estreitas adjacências do Beco ficarem mais estreitas ainda. Num cálculo aproximado, 2 mil pessoas compareceram e deram vida às velhas ruas do centro da cidade, causando um movimento completamente atípico para o dia.
Jovens de todas as idades, crianças, adultos, idosos, todos compartilhavam de uma alegria esfuziante, anárquica até. O território era liberdade. O passaporte poderia ser escolhido ao bel prazer: cerveja pra animar, pinga pra aquecer, meladinha pra lembrar Nasi, água pra naturalista, drink para a turista, coca-cola pra meninada, guaraná pra comemorar. E fumaça, muita fumaça: dos churrasquinhos de gato, dos cachimbos da paz, do cigarro cheiroso do rapaz, do cubano e do pernambucano. Os bares mostraram sua culinária pratodomundo. Som, risos, gritos, muita alegria, quase euforia. Todos se divertiam ao som d'Os Grogs. O casal maduro rebolava indiferente ao calçamento irregular; outro, mais verdoso, beijava-se com sofreguidão. Olhares cruzavam a distância qual flecha certeira, e, mesmo no meio de tantas luzes, o brilho do olhar conseguia distinção.
O Bêbado, anestesiado e desnorteado por tantos alcalóides, babou ao ver a moça bonita. A saliva escorreu reluzente e gosmenta no exato momento em que um raio de luz denunciou sua transparência. Num lapso de lucidez, olhou para os lados, conferindo se alguém percebeu. Ninguém viu, imaginou ele. Feliz por livrar-se do flagrante, caiu no rock, para, depois, muito doidão, cair no chão.
Jimmy Hendrix, Janis Joplin, The Doors e outros contemporâneos fizeram-nos fechar os olhos e lembrar de Woodstock. Epa! É apenas o Beco da Lama em dia de festa.
E que festa!
O poeta subiu ao palco e derramou poesia. Não foi entendido. Não é fácil entender poeta. Ora, e poesia numa hora daquelas? Difícil entender tais questionamentos.
Deus é denunciado por fumar seu baseado. Alguém sabia? Alguém viu? Claro. O sol é a ponta do seu baseado. Apologia? Não! Simples liberdade de expressão que não agradou aos cristãos presentes. A mesma liberdade que se revelou através das escolhas, dos estilos, das tribos reveladas numa noite colorida e repleta de sons e cheiros delirantes.
Que venha o sábado decisivo, com sua alegria e loucura ambulante. Das janelas do infinito, Raul, Cazuza, Bob e outros queridos participantes invisíveis assistirão extasiados a festa. Ao nosso redor, seres mil de universos paralelos vibrarão ao som da música e se alimentarão da nossa energia. Que ela seja da melhor qualidade!
Ana Cristina Cavalcanti Tinôco
RELAÇÃO DAS MÚSICAS CLASSIFICADAS PARA A FINAL DO I MPBECO - FESTIVAL DE MÚSICA DO BECO DA LAMA
(POR ORDEM ALFABÉTICA)
01 - A Filha da Lua (Yrahn Barreto)- Sueldo Soares
02 - Anglicana (Clésio Torres/Yrahn Barreto) - Lene Macedo
03 - Cultura (Neguedmundo)- Neguedmundo
04 - Jesuíno (Zé Fontes/Tertuliano Aires) - Zé Fontes
05 - Natália (Tertuliano Aires/Nagério) - Khrystal
06 - Ninguém Merece (Marcondes Brasil) - Michelle Lima
07 - O Exterminador de Sentidos (Romildo Soares/Lupe Albano) - Rodolfo Amaral
08 - Santa TPM (Franklin Novaes) - Franklin Novaes
09 - Tarde (Tertuliano Aires/Nagério) - Carlos Bem
10 - Volta (Simona Talma/Khrystal) - Simona Talma
Barrados: crítica da crítica II
O Beco da Lama é realmente uma escola. Foi de lá que veio estímulo, para rabiscar estas palavras mal rabiscadas (tá parecendo carta para namorada).
Lá no Beco, a galera dá uma corda amuada. Por isso, engoli corda. Não devia. Mas, agora, prova maior de nossa independência, devo um botijão de água mineral à Pinacoteca.
Mas, falando sério, Barrados, meu jovem, é, acima de tudo, uma mágoa. Porque quando, espontaneamente, o povo protesta, é vulgar ou magoado? Pensamento elitista Hein! Companheiro? Protesto soa melhor do que mágoa. Sabemos da independência e imparcialidade das comissões julgadoras do Salão de Arte de Natal. Artistas conceituados também sabem: por isso, também não participam.
A crítica maior dos Barrados (temos que explicar tudo) é a respeito do pequeno número de Salões oficiais oferecidos pelo “Estado” na cidade do Natal (dois). Essa foi nossa motivação maior. Pode ler no impresso da apresentação, no documento (ficha de inscrição) do Salão.
Pois bem, muito bem, nunca mais vi Carlinhos Bem: polêmica que não é alimentada pela imprensa, só a do casal que engatou no parque industrial. Discussão elegante (Hein!). É bom ser elegante, mas, a deselegância da Funcart enfureceu a todos. Nos dias de hoje, um órgão de cultura vergonhosamente empreendeu uma censura, no melhor estilo “ditadura militar”, contra um bando de pobres coitados.
O Napoleão III daqui ainda disse, na imprensa, que no seu “jornal” não saía nome da oposição. Mas, tudo isso, é pouca bobagem. Muita bobagem é comparar (pensando-se todas as circunstâncias?) Barrados com o “Salón des Refuses”.
Pra início de conversa, nos incluídos, também, Não tinha nada, nem de longe, que se comparasse a um “O Ateliê” de Gustave Courbet: dois pesos, duas medidas.
Ainda assim, nobre Vitoriano, não podemos analisar os Barrados no Salão 2006 sob pressupostos e contexto do século XIV. Aqueles dias eram dias de um mundo pré-industrial. Aqui, vivemos numa província de um mundo moderno, onde mais vale um vitoriano que um vitorioso. Brincadeirinha, não resisti ao trocadilho fulo. Refiro-me, mesmo, sobre àquela velha história do “QI” (quem indica).
Por tudo isso, valeu o Salão. Foi um pé no saco. Incomodou muita gente, que viu os proletariados excluídos, a classe poetaria, fazendo arte. No mundo de Velázquez, de Rembrandt, o vassalo também fazia arte ou não?
É isso aí: talvez no futuro, a exemplo dos excluídos de Paris, que só foram reconhecidos 200 anos depois, a gente também possa ser reconhecido como marco na História da Arte. Todavia, o futuro de nosso legado é duvidoso. A única certeza que temos é a de que os críticos do “Salón des Refuses”, esses, ninguém, nem mesmo o homem que sabe de tudo, sabe quem foram.
Além do mais, rapaz, no ano que vem, tem mais. Até lá, como tudo não é perfeito, vamos tentar corrigir os erros. Falhamos feio, pois a intenção pictórica era a de que figurasse, principalmente, “o mínimo de bom senso” e não a quantidade de artistas consagrados, que lá, na Pinacoteca, figuraram.
Franklin Serrão
CANÇÃO DO DESESPERO
Rasgaram a fantasia de menino e eu não posso mais voar com asas nos olhos. Retalharam-na sem dó nem piedade em tiras transversais no peito da esfinge. Logo essa à qual eu tanto amava e que me caía perfeitamente. Estou seminu, perambulando nas vagas da histeria, apanhando trapos entre sombras que me apontam o dedo, riem das minhas vergonhas expostas e gritam: "Idiota! Idiota! Idiota! Mil vezes idiota!".
O bodoque se quebrou, arranharam o disco de rock, Neruda sumiu na poesia do caos, sufocaram o sorriso de Eurídice nos lábios enrugados da falsidade. Tudo isso enquanto me arrancavam das entranhas da primeira e derradeira estrela - a fórceps - e o desprevenido Orfeu olhava para trás em desobediência aos deuses. Depuseram-me do trono na porrada. Perdi a coroa. Em vez dela, toneladas de silêncio no juízo.
Guardem os conselhos e as certezas num bornal de couro de lacraia prenha. Soquem-nos, se necessário, nas coxas dum buraco negro. Não me venham com ilusões vestidas de diamantes, esmeraldas, rubis ou luas cretinamente cheias que nascem nos braços da serpente, pois tudo é mentira. Enjoei, não cabem mais pedras na boca do meu estômago. Preciso de paz e tempo para digeri-las nos subúrbios do desespero.
Na madrugada de Pasárgada, somente putas tristes feridas na face pela gilete das horas desfilam nas ruas do Alto do Louvor reacendendo pegadas ancestrais de outras damas. Momento infértil para a traição, para a vingança. Possuir a mulher que eu quero na cama que escolherei é metáfora do desejo impossível porque o desejo tornou-se matéria morta na consciência do pobre anjo barroco que despencou do céu.
Doido ao mar! Lancem a bóia de fantasias! Desistam, talvez seja tarde para o resgate. Parece que a treva venceu a última canção na luta contra o fogo. Triste fim da alma no oceano habitado pelo mostro de olhos verdes. Apesar da alegre menina na radiola de ficha do convés, a tristeza é maior que o perdão. Se há brecha no orgulho, o amor não a encontrou e também morrerá na tempestade do velho copo d'água.
A noite embarcou nos braços do pesadelo, mas a memória das estrelas continua a correr em veias de PVC. Criaturas ainda guardam mistérios entre as pernas, a espera de alguém capaz de desvendá-los. Ainda há cadeiras nos bares, garçons amigos chorando uísque no copo nosso de cada dia e garçonetes videntes, tradutoras de corações, afirmando que "nasci para pregar o amor, não para vivê-lo cem por cento".
Cid Augusto