quinta-feira, novembro 02, 2006

HONREM-NOS

Marcus Ottoni


"Sem farinha, homem não vive. A farinha é a camada primitiva, o basalto fundamental na alimentação brasileira. Todos os elementos são posteriores, assentados na imobilidade do uso multicentenário, irredutível, primário, instintivo."
Luís da Câmara Cascudo

Karl Leite
Image Hosted by ImageShack.us
De 4 a 25 de Novembro, III Festival Gastronômico do Beco da Lama e Adjacências - PRATODOMUNDO

VAMOS AOS PRATOS, TODOMUNDO?


E serão muitos, variados, suculentos, caprichados. Agora diversificados, estarão passando das tradicionais buchadas, rabadas, favadas e outras coisas danadas de boas, para pratos mais elaborados, globalizados. Xiiiiii! Aqui estou eu rimando de novo. Falar do Beco é isto: uma inspiração; um rebuliço. Mas, é justamente isto que os idealizadores querem. Então, desde ontem, e durante os próximos sábados de novembro, estará acontecendo o 3º Festival Gastronômico do Beco da Lama e a premiação "Pratodomundo ".

O Festival, que tem como foco principal apresentar o roteiro gastronômico dos bares e restaurantes do Centro da Cidade, é uma realização da Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências e vem sendo viabilizado em parceria com instituições culturais governamentais e não-governamentais do RN, através do esforço conjunto da sua diretoria oficial, outra designada para tal, a substituta, a eleita e afeita a este pleito.

Mas, não será só de pratos feitos o Festival. Estarão acontecendo, nos dois dias que antecedem cada sábado, oficinas, exposições, lançamentos de livros, mostras de vídeos, intervenções poéticas, algumas loucas, devassas, outras com belas métricas; gente bonita, cervejinha sabiamente gelada, luz, câmera, ação, amores, vida. É esta a pretensão do Pratodomundo. Tudo bem juntinho, como o nome sugere, trazendo animação, novos ares e resgate de um passado, não tão distante, onde as pessoas conviviam e celebravam a vida no coração da cidade.

E, se depender da galera que já participou dos anteriores, certamente teremos, nesta edição, muita movimentação. Estarão participando, direta e indiretamente do evento, cerca de... impossível precisar. O povo do Beco é mesmo de veneta e sempre que vem, consegue adeptos e anexos para acompanhar.

Nas mesas, estarão desfilando aos olhos e paladares mais exigentes, pratos da culinária regional, tais como: arrumadinho, vaca atolada, feijoada, peixe e galinha preparados como a vovó sempre fazia. Para os mais curiosos com novos sabores, vale uma degustada nas costelinhas de porco ao molho Samba; na língua ou cupim ao molho Beco; no pato com laranja, no Churrasco com carne de Caicó.

Para os ouvidos, sons para todos os gostos. O melhor da música popular potiguar, com Khrystal, Rodolfo Amaral, Geraldo Carvalho, Romildo Soares, Carlança e Pedro Mendes. As guitarristas virtuosas do bendito Raul da Alcatéia e d'Os Grogs; as batidas energéticas do Folia de Rua, Congos de Calçolas, Caboclinhos de Ceará Mirim e a dancinha maneira do Boi de Manoel Marinheiro.

O final do ano se aproxima. Já estamos chegando ao limite máximo da saturação. Acordar cedo, enfrentar trânsito, chefe mau humorado, cliente estressado, salário defasado, paletó apertado, confusão para todos os lados... Ufa, precisamos urgentemente de festas, gente, conversas, calor humano. E isto não falta no Beco. São pessoas de todos os credos, cores, preferências de amores. Mil odores se espalham pelo ar. Sons naturais, de vozes agradáveis falando palavras gentis; outros estridentes, gasguitas, que se elevam exponencialmente proporcional ao volume de mililitros alcoólicos ingeridos. Pipocas nos carrinhos, nos cabelos das meninas e meninos que participam despreocupadamente das festas, sabendo que estão em território de paz. Crianças que celebram a liberdade juntas aos seus pais num ambiente festivo, descontraído. Senhoras e senhores maduros, quase passando do ponto, devidamente monitorados para estarem bem assistidos.

O Beco é isso. Vale conferir.

Ana Cristina Cavalcanti Tinôco



ODE AO INDÍGENA NORTE-RIO-GRANDENSE


A poeira do tempo vai aos poucos cobrindo a memória indígena do Rio Grande do Norte.
Quem lembra das orgulhosas tribos que dominavam essas vastidões encandeadas de sol?
Quem lembra dos indígenas como eles gostariam de ser lembrados: senhores de si, plenos de vitalidade, valentes no domínio de seus chãos, grandiosos na peculiaridade de suas culturas?
Quem guarda seus sonhos? Quem cultua seus nomes para a posteridade? Quem zela pelos lugares que lhes foram sagrados? Quem lhes garante a eternidade através da lembrança de suas façanhas? Quem marca, em honra deles, um só lugar onde viveram?
Quem recorda as vitórias que tiveram e as glórias que conquistaram?
Quem ensina às crianças o valor de seus costumes, a dignidade de suas lutas, a virilidade de suas resistências, a fidelidade de suas alianças, o direito de suas opções?
Quem as ensina que o sangue e a cultura indígena não se esvaíram, mas estão em nós e em nossos atos, pois eles também são nossos ancestrais e avoengos, como os outros que costumamos lembrar?
Onde existe um memorial que lhes faça homenagem, um monumento que lhes assegure o crédito da parte que lhes toca na formação histórica e social desta terra?
Por que estão na história como figurantes, se foram seus agentes? Por que estão sempre como pano de fundo dos atos europeus, se foram seus altivos autores?
Somos um povo miscigenado, fruto de uma simbiose cultural e biológica, acontecida na terra dos brasis. Povo único e diferenciado. Como esquecer a parte da herança que nos faz diferenciados?
Como tirar a dignidade de uma parte de nós mesmos, seja esquecendo-a, seja negando-lhe, através de utopias deformantes, a realidade que tiveram?
Se tanto foi perdido, há muito que recuperar. Mas há que se recuperar primeiramente a realidade histórica do indígena, para que a memória dele possua a altivez que sempre demonstraram, e não a comiseração que nunca suplicaram. Há que se recuperar a dignidade de que sempre se revestiram, como seres reais, e não inculcar-lhes ingênuos valores e virtudes advindos do imaginário europeu ou das frustrações da sociedade moderna.
Escutemos com atenção, pois das planícies sertanejas, dos serrotes empedrados, das serras que balizam as solidões, ergue-se um grito de séculos: NÃO SE ESQUEÇAM DE NÓS! HONREM-NOS!

Walner Barros Spencer




POTI OR NOT TUPI?

Índios, sim! A recente audiência pública realizada na Assembléia Legislativa do RN, sob o auspício do mandato Fernando Mineiro e a batuta do Grupo Paraupaba de estudos da questão indígena, propicia uma pertinente reflexão na área de memória e patrimônio cultural, enfocando a identidade das populações indígenas remanescentes no estado.

Do paraíso à quase extinção. Em 1500, quando Pindorama foi invadida pelos lusitanos, estima-se que cá habitavam cinco milhões de indivíduos em harmonia com o meio ambiente. Na égide e usura do capitalismo comercial, o colonizador empreendeu uma das maiores barbáries da humanidade, quando em 1978 restavam apenas 210 mil pré-colombianos. As causas de cruel depopulação foram: no passado (genocídio consciente), guerras de extermínios, expedições para captura de escravos; no presente (genocídio por omissão), massacres, impunidade de crimes contra índios, deportação para lugares inadequados, doenças contagiosas, subnutrição, redução de territórios abaixo do mínimo necessário. Os índios sofreram colonialismos externo entre 1500 - 1822 (português) e interno a partir de 1822, pelos brasileiros.

No decorrer do processo de produção do espaço geográfico, o estado brasileiro tem expropriado e expulsado os nativos de suas terras sempre alegando a cantilena da segurança e do desenvolvimento nacional (exploração de minérios e madeiras; construção de rodovias, barragens e hidrelétricas; ou implementação de projetos agropecuários).

No RN, a realidade foi mais obscura. Os livros didáticos afirmam que apenas dois estados da federação não possuem população indígena, aqui e no Piauí - curiosamente onde o índio Poti/Puti é reverenciado como herói... A nossa proto-história é marcada pela presença de duas vertentes silvícolas: no litoral, os Tupis (Potiguares, Guaraíras, Paiguás, Jundiás), já os Tapuias/Carriris (Caicós, Pegas, Icós, Janduís, Moxorós) nos sertões, cenário de um movimento nativista emblemático, a "Guerra dos Bárbaros", o "Levante do Gentio Tapuia" perdurou por décadas.

Na verdade, deveria se convencionado "guerra dos civilizados", pois estes, movido na ganância por terra e mão-de-obra escrava (proibida desde 1537 pela Bula Veritas IPSA), deflagraram o processo de extinção através do subterfúgio da "guerra justa", instigando os índios para o combate inglório. O colonizador utilizou-se inclusive das bandeiras (terço dos Paulistas) de Domingos Jorge Velho e Navarro Moraes.

Sanguinária e tenebrosa a história provincial. Sorobabé, Jaguarari, Camarão, Clara, Potiguaçu, Mar Grande, Pau Seco, Paraupaba, Pedro Poti, Janduí, são nomes tremulantes no espólio fantasma. Vae Victis (ai dos vencidos)!

No entanto, concomitante à política oficial de extermínio, mediante a ideologia da integração, há um reaparecimento sócio político dos povos indígenas. No nordeste, 50 comunidades com 110 mil indivíduos. O Censo de 2000 revela que no estado três mil pessoas se auto-proclamaram índios, negando a generalização residual de pardo ou cabloco. Instigando um embate antropológico: povos emergentes ou ressurgentes? Muito além dos (pré)conceitos, são resistentes aos impiedosos processos de aculturação e etnocídio. Quatro comunidades almejam reconhecimento: os ‘’Mendoças do Amarelão", (João Câmara, com dois mil membros; os "Eleotérios do Catu", em Canguaretama, com 600 pessoas; os "Banguê", da Lagoa do Piató/ Assu, de 300 indivíduos; e, a comunidade dos "Caboclos do Riacho", em Assu, com 200 membros. Arregimentando forças as comunidades reinvidicam a legitimação de suas identidades indígenas. Relutantes, celebram suas pertenças e memórias ancestrais pulverizadas na tradição, mas latente no orgulho, impregnado no código genético.

O problema comum a todas as comunidades é a carência social (não física) da terra. A estrutura fundiária brasileira, das Capitanias Hereditárias (Sesmarias e Datas) à Lei de Terras de 1850, é matriz de todos os males nacionais. No modelo cultural herdado de uma mentalidade euro-ocidental, o território é interpretado sempre pelo prisma pragmático, como fonte de lucro e/ou medida do poder aristocrático-oligarca.

Chega de etnocentrismo ufano. Abominemos o narcisismo das últimas diferenças - "que acha feio o que não é espelho". "Brancos, índios, pretos, mulatos não há nada de errado em nossa etnia /o meu e o seu são iguais". Comungar a certeza mitológica da imortalidade dos filhos no seio da própria terra. Inclusão e pertencimento cultural fundamentam uma luta urgente e de toda sociedade - principalmente, quando esta se reconhece POTlGUAR!

Plínio Sanderson

por Alma do Beco | 12:59 PM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

.. .. ..

.. .. ..

Recentes


.. .. ..

Praieira
(Serenata do Pescador)


veja a letra aqui

.. .. ..

A imagem de fundo é do artista plástico e poeta Eduardo Alexandre©

layout by
mariza lourenço

.. .. ..

Powered by Blogger

eXTReMe Tracker