sábado, julho 22, 2006

RIBEIRA DOS LIVROS

Marcus Ottoni


“A resolução do caos transformaria o Brasil num tedioso inferno de problemas resolvidos.”
Josias de Souza



GRAFITE

Imprimindo sua doce voz
Para suprimir minha confortante dor
Comprimindo seu prazeroso grito
Para restringir meu calado choro
Resistindo à sua explícita indiferença
Para afagar a minha estimada existência
Quase desistindo,
Declaro
Aqui e agora,
Gloriosa independência

Deborah Milgram



O caminho de comprar livros

Ainda lembro, no encantamento de minha juventude, de quando descia para a Ribeira em busca das novidades da Livraria Clima. Saía do colégio de bolsa nas costas e sol a pino. Descia a ladeira do Baldo embalado pelos gestos falsos da gravidade que mostrava a sua verdadeira intenção quando eu passava por baixo do viaduto e subia pela Rio Branco.

O cansaço esticava em légua e meia a ladeira ingrata. A calçada da esquerda era a que me proporcionava a melhor visão do majestoso e esquecido prédio da TVU. Dava uma paradinha no Cinema Nordeste para ver os cartazes das matinês e encontrava, vez por outra, alguma loira de olhar sedutor em uma posição meio desinibida que escondia seus fartos seios com as mãos, resguardando-se por trás do vidro da vitrina.

Voltava a Rio Branco e aproveitava para cortar caminho pelas ruas posteriores ao Churchill para ouvir a melancólica poesia que as pedras desalinhadas dos antigos calçamentos me segredavam. Atravessava correndo a Junqueira Aires até parar na calçada da Capitania. As brechas da velha fachada sem cor, juntamente com os restos das pequenas construções que se avizinhavam, deixavam-me encarar, do outro lado do nada, o rio Potengi.

Num pulo já estava no pátio da rodoviária. O ruge-ruge de pessoas e ônibus era o prenúncio do partir e do chegar. Velhos, crianças, feirantes, cestos de frutas, feijão, galinhas amarradas pelos pés, vendedores de amendoim, cobradores e seus trocados por entre os dedos, motoristas e seus cafés, apitos de fiscais. Era um sem-fim de imagens em breves segundos. Ônibus de porta de manivela esperavam malas, bagagens e bagulhos que se entocavam um a um em seu subsolo.

Meu passo sem medo cortava as plataformas dos intermunicipais e dos interurbanos. Alguns homens e mulheres sem-destino olhavam aquele reboliço em busca de alguns trocados ou, com um pouco de sorte, um trago a mais.

Entrava na Dr. Barata em busca da Livraria Clima. Ainda na porta procurava as estantes do lado esquerdo. Lá findavam as minhas buscas. Cheguei a passar horas folheando os livros e procurando aqueles que se encaixavam com a mesada semanal.

Esbaldava-me com tantos livros. Foi lá que conheci as letras de Alex Nascimento (Quarta-feira de um país de cinzas) , Celso da Silveira (50 glosas sacanas), Tarcisio Gurgel (Os de Macatuba), Deífilo Gurgel (Os dias e as noites), Waldir Reis (Nós sofre, mas nós glosa), José Alexandre Garcia (Acontecência e tipos da Confeitaria Delícia) e tantos outros escritores.

Amealhei alguns trocados economizando no lanche escolar, para conseguir comprar alguns livros. Hoje, quando passo em frente da antiga Clima, sinto a saudade do trajeto Alecrim-Ribeira. Sinto que minha disposição já não é a mesma e não consigo mais ver as estantes do lado esquerdo onde me encantavam o buscar e o revirar livros. A velha rodoviária ainda permanece com aquele cheiro de esquecimento. Nunca deixará de ser velha. Talvez por já ter nascido assim.

Enfileirados em minha estante descansam os antigos exemplares. Guardam o meu carinho e alguns segredos em suas letras. As folhas soltas, marcadas, relidas, fazem um trajeto que nunca sairá de minhas lembranças. Uma lembrança que nunca será substituída...

José Correia Torres Neto

por Alma do Beco | 10:48 AM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

.. .. ..

.. .. ..

Recentes


.. .. ..

Praieira
(Serenata do Pescador)


veja a letra aqui

.. .. ..

A imagem de fundo é do artista plástico e poeta Eduardo Alexandre©

layout by
mariza lourenço

.. .. ..

Powered by Blogger

eXTReMe Tracker