" O poder não subiu à minha cabeça, e muito menos o poder fez com que houvesse o distanciamento dos companheiros que, no fundo no fundo, é para onde vou voltar quando sair daqui."
Presidente Lula
Karl Leite
Escultor Etewaldo
1º DE ABRIL
Vim para ficar
E no mais só deliciar
O choro calado
Desse poema desbotado
Instantâneo, decadente
Assim mesmo
Impertinente
Repete poeta
Que não haja dúvidas
Vim e só vou
Quando o último dos moicanos me levar
Deborah Milgram
Lendas e Mitos
Alta noite, beira mar,
ouço vozes, gritos, brados
— é Deus, Ele vem buscar
os meus sonhos afogados.
/ Afogados /
O feitiço e a macumba,
só quem trabalha pressente.
Macaco a dançar rumba?
É a inveja dessa gente ...
/ Feitiço /
Segundas-feiras, provava
o mingau que as almas comem.
Às sextas-feiras, uivava,
transformado em lobisomem.
/ Lobisomem /
Encosto em espiritismo
vem do sobrenatural,
aprendi no catecismo:
é o homem quem faz mal.
/ Espiritismo /
Assombros, encantamentos,
as estórias do lugar,
são causos, são passatempos
— ninguém vê: ouve falar.
/ Estórias /
Tentei olhar o meu rosto,
vi somente escuridão ...
O rosto era puro encosto,
a rolar de mão em mão.
/ Escuridão /
Vela branca singra o mar
em noite de assombração:
lentos ventos a levar
a alma do bravo Gangão.
/ Gangão /
Dou o dito por não visto,
sem nenhuma ilusão:
quem anda com Jesus Cristo
tem medo de assombração?
/ Medo /
Do passado, do destino,
as histórias do vovô
contadas para o menino,
são tradições do nagô.
/ Nagô /
Frio correndo pela espinha,
o boêmio quase entala,
ao ouvir uma voz, baixinha:
“Sou o fantasma que fala”.
/ Fantasma /
O aluno leva pito,
professor quer ensinar:
Câmara Cascudo, mito
da cultura potiguar.
/ Cascudo /
Na porta do cemitério
crescem ramagens de horto
e ouve-se a voz do mistério
— “estou morto, estou morto”.
/ Cemitério /
Lendas, mitos brasileiros,
possuem um valor infindo:
são estudos verdadeiros
do professor Gumercindo.
/ Gumercindo /
Rangem portas com ferrugens,
sombras povoam os momentos,
assombrações vêm das nuvens,
os fantasmas são os ventos.
/ Assombrações /
Veríssimo professor
ensina antropologia,
no folclore é doutor,
da vida sabe a magia.
/ Veríssimo /
Encontrei, num arco-íris,
botijas que botam ouro,
acendi vela no pires
para afastar mau agouro.
/ Agouro /
Preto velho e inhansã,
num ebó aos orixás,
ofertavam a manhã
a oxóssi e oxalá.
/ Ebó /
Acendo vela a São Jorge,
ogum, o santo guerreiro,
minha fé é meu alforje,
prece melhor que dinheiro.
/ Prece /
Cantadores e vaqueiros,
as alegrias do sertão,
são cantares brasileiros
que nascem do coração.
/ Sertão /
Sozinho faço da vida
a vitória de quem ganha,
nessa estrada percorrida
só o bom Deus me acompanha.
/ Deus /
Ao morrer ficou no limbo
o diabo quase estupora
saci acendeu o cachimbo
pediu fumo a caipora.
/ Limbo /
À beira-mar, com encanto,
aos deuses faz oferendas,
de branco, o filho de santo,
lançando n’água suas prendas.
/ Oferendas /
Dobram sinos encantados,
acordam dentro de nós
lendas e mitos sobrados
dos extremos de Extremóz.
/ Sinos /
É um pranto de saudade
a cruz na estrada erguida.
Além disso, é a verdade
que nos conduz pela vida.
/ Cruz /
Encantos dos meus amores,
ouço o canto da sereia,
vendo os bravos pescadores
na força da maré cheia.
/ Sereia /
Era um grande vencedor,
só apostava na sorte.
Seus planos de jogador:
derrotar a própria morte.
/ Morte /
Nas estradas ou na igreja,
nas quebradas do sertão,
ouço cantar a peleja
dos cabras de Lampião.
/ Lampião /
Já começa a anoitecer
e a lua com tanta mágoa
ficava triste por ser
o reflexo da “mãe d’água”.
/ Anoitecer /
Ao voltar de uma caçada,
o caçador, se perdeu
— ouviu, bem perto, a passada
do morto que não morreu.
/ Caçador /
Rei de paus: é madrugada,
e o carteado continua ...
Vem, da noite assombrada,
o grito da “mãe da lua”.
/ Madrugada /
As lendas, os folclorismos
— tradição universal —
os mitos, os misticismos,
são coisas de Portugal.
/ Portugal /
Em todo o mundo é assim:
há muitas bruxas malvadas,
procurando dar um fim
à eternidade das fadas.
/ Bruxas /
Na escola foi reprovado,
do serviço foi deposto,
ouviu ao ser consultado
— só pode ser encosto.
/ Encosto /
Menino, cuspindo a papa,
levava um beliscão ...
Babá dizia, dando tapa:
“Lá vem o bicho papão”.
/ Papão /
Velas figas, oferendas
ao preto velho em agosto,
são o princípio das lendas
— só pode ter sido encosto.
/ Encosto /
Almas vestem puros linhos,
das alvuras do algodão,
são visagens, são anjinhos
em fila na procissão.
/ Almas /
Desde os tempos de Jesus,
os ladrões têm seu lugar:
os bons são presos na cruz,
os maus tentando salvar.
/ Ladrões /
O povo diz: “Virou anjo
a moça que a lua comeu ...
De noite, ouve-se um banjo” ...
Quem toca o banjo, sou eu.
/ Anjo /
Derramo um gole no chão,
antes de um trago tomar,
só faz bem ao coração
e aos deuses faz alegrar.
/ Gole /
O negrinho do pastoreio
ilumina o caminhante.
Hoje, fruto do que leio,
é uma lenda ambulante.
/ Caminhante /
João Gualberto Aguiar