sexta-feira, dezembro 23, 2005

RÉVEILLON DA RUA DA PALHA

Marcus Ottoni


"Encontramos evidências de que pagamentos foram efetuados pontualmente em períodos de aprovação de certos projetos. O mensalão é difícil negar.”
Deputado Osmar Serraglio (PMDB/PR), relator da CPI dos Correios

HOJE, A PARTIR DAS 19 HORAS, NO BAR DE NASI


CONFRATERNIZAÇÃO DOS AMIGOS DO BECO DA LAMA
FALAS E CANJAS
MARCELO TINOCO E BANDA CORDAS DE VIOLA
ESQUINA 16

Ilustração: Assis Marinho
Foto: Candinha Bezerra / Arte Final: Valdelino


Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Capitania das
Artes realizam o I Réveillon do Centro Histórico de Natal

Com apoio da Prefeitura Municipal do Natal e Sectur, a Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências - SAMBA e Capitania das Artes realizam, a partir das 22:00 horas de 31 de dezembro deste ano até às 06:00 horas do dia 1º de Janeiro de 2006, na rua Vigário Bartolomeu (antiga Rua da Palha, onde foram realizados os primeiros carnavais da cidade) o I Réveillon do Centro Histórico.

A festa começará com a apresentação do Boi de Reis do mestre Manoel Marinheiro, seguindo-se a apresentação de Os Grogs, ainda no dia 31. À meia-noite, haverá queima de fogos e logo após toma o chão do Beco da Lama e Adjacências a banda de frevos Demalaecuia, do maestro Gilberto, que percorrerá bares e pontos históricos da Cidade Alta. Enquanto a Demalaecuia percorre as ruas do centro histórico da cidade, a programação de palco segue paralela com a apresentação da grande revelação da música natalense de 2005: Khristal e Banda.

Previsto para início às 03:00 horas da madrugada do primeiro dia do ano, seguir-se-á show de Elino Julião, com 15 músicos acompanhando o consagrado cantor/compositor norteriograndense. Elino promete um grande show aos presentes, relembrando grandes sucessos do seu conhecido repertório. Às 05:00 horas da manhã, fechando a programação elaborada pela Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências, o popular Cabrito e a Balalaika Brega Band levam o melhor da música romântica para o público que prestigiar o evento.

Foi na antiga rua da Palha, hoje rua Vigário Bartolomeu, onde foram realizadas as primeiras festas de passagem de ano e os primeiros carnavais de Natal. Para o diretor executivo da Samba, Eduardo Alexandre, “é uma honra imensa para a Samba trazer de volta ao centro o antigo glamour das festas que animavam ‘os cantões’, como eram chamados os pontos de convergência social da cidade.” Para ele, relembrar que a Praça Padre João Maria chamou-se um dia Praça da Alegria; que a rua da Conceição chamou-se Rua do Caminho de Beber Água e Rua Direita; que a atual avenida Câmara Cascudo chamou-se Rua 25 de dezembro e; lembrar aspectos de uma cidade hoje esquecida, é trazer de volta esse passado bonito que não quer morrer.”

A parceria ora firmada entre Samba, Capitania das Artes, Prefeitura Municipal e Sectur será mantida para festas pré-carnavalescas e carnavalescas do centro do cidade, e a Prefeitura já garantiu para 2006 obras de infra-estrutura no Beco da Lama e Adjacências para tornar aquele ambiente melhor urbanizado, seguro e limpo, tornando possível melhor aproveitamento cultural do centro da cidade. Para depois do carnaval, a parceria será também mantida, já havendo discussões de como fazer-se o Dia Nacional da Poesia, comemorado a 14 de Março.


O carnaval na Rua da Palha

Quando comecei a me entender de gente, o carnaval de Natal era na rua da Palha (hoje Vigário Bartolomeu), no trecho compreendido entre a rua Ulisses Caldas e a praça do padre João Maria. Instruirei os que não conheceram Natal desse tempo. Era um trecho de uns 300 metros, em moderado declive, as casas todas residenciais, distendidas inteiriçamente no alinhamento da rua.
As janelas numerosas, à razão de cinco ou mais por casa, eram observatórios privilegiados e ficavam sempre repletas. À calçada, punham-se cadeiras que dilatavam a área de conforto dos moradores da rua da Palha...
E, assim, brincava-se uma brincadeira quase inocente, que consistia em circular rua acima, rua abaixo, distribuindo confetes e seringadas de lança-perfume. Quase todos procuravam acertar o jato de lança-perfume na vista uns dos outros, pelo que as crianças se apresentavam em geral protegidas com uns óculos tipo aviador.
Havia abundância de mascarados com a preocupação do engraçado. Podia ser que nem sempre despertassem o nosso riso abundante, mas bem que mereciam uma comovida admiração esses bravos foliões. Como deviam padecer sob as cômicas caracterizações que escolhiam: às vezes, conduziam objetos mortalmente incômodos; outras vezes, afivelavam máscaras martirizadoras como enormes cabeças de bichos; por vezes, ainda, enfiavam roupas antigas, pesadas e sujas, sob as quais suavam em profusão. E havia, também, os que adotavam disfarces raciais e, então, se tisnavam densamente.
Sinceros e resolutos foliões! Para eles, o carnaval era uma breve oportunidade em que podiam dar vazão a sua sopitada vocação crítica.
O que havia, porém, de mais expressivo no carnaval de Natal ao meu tempo de menino, era o misterioso “Zé Pereira”. Misterioso, sim, porque provinha de um clube de rapazes da sociedade, os quais saiam à rua uma única vez por ano, no sábado de carnaval, à meia-noite. Partiam do Natal Clube e percorriam toda a cidade num bonde especial, que, àquela época, os automóveis eram raros e precários.
Lá em casa, os meninos eram postos a dormir na hora do costume, às 7 horas, mas, em verdade, ficávamos numa vigilante excitação íntima. Até meia-noite, todavia, o sono já nos havia vencido, de sorte que quando estalavam os clarins do “ Zé Pereira” e o bonde se movimentava na nossa rua, bem perto do Natal Clube, éramos levados à janela tontos de sono, olhos pesados, mente turva.
O “Zé Pereira” passava rapidamente, era uma imagem breve e confusa. O que se prolongava era o ressoar da sua música; era, sobretudo, o bombo predominante. E durante os três dias, todos entoavam os versos do “Zé Pereira”:

“Viva o Zé Pereira,
Que hoje à rua sai.
Quem não come, cheira;
Quem não tomba, cai:
Zimbararal! Zimbararal!
Viva o carnaval!

Umberto Peregrino
In Crônica de uma cidade chamada Natal. Editora Clima. Natal/RN, 1989.





À sombra de frondosas árvores, os Cantões

Os costumes de uma época enraízam-se de tal modo no espírito humano que se tornam uma característica.
Somente a evolução através do tempo poderá tornar-se agente transformador, substituindo os antigos por novos hábitos, na sociedade.
Em sua residência, o Vigário Bartolomeu costumava receber os amigos, à tardinha, na calçada, à sombra da própria casa, segundo hábito daqueles tempos em Natal, cidade provinciana. Ali, eram dispostas cadeiras constituindo as tradicionais “rodas” para as “prosas”, hoje denominadas “bate-papos”, as quais se prolongavam até certas horas da noite.
Essas “prosas” eram comuns nas calçadas das principais residências da cidade, ou à sombra de frondosas árvores existentes nas praças, destacando-se a do “Cantão da Matriz”, sob majestosa gameleira da Praça da Alegria, hoje padre João Maria, próxima à Matriz, e a da “Botica”, situada à rua do Comércio, hoje rua Chile, formada na farmácia do Dr. José Gervásio de Amorim Garcia, político em evidência naqueles tempos. Eram elas os pontos de reunião dos principais da terra, onde se tratava de assuntos de interesse político-sociais.
No “Cantão”, reuniam-se os que obedeciam à chefia política do padre João Manoel de Carvalho, sendo freqüentadores assíduos, além de outros, o comendador Joaquim Guilherme de Souza Caldas e o coronel Felinto Elísio de Oliveira Azevedo. O da “Botica” era chefiado pelo Dr. Tarquínio Bráulio de Souza Amaranto. Nele, encontravam-se os Garcia – José Gervásio de Amorim Garcia, proprietário da farmácia e parentes, inclusive Francisco Amintas da Costa Barros.
Nessas “rodas”. passavam-se em revista os acontecimentos da cidade e do país, sociais e políticos, quando não constituíam mero passatempo entre amigos, no relato de anedotas, na decifração de charadas ou tornando-se oportunas para as partidas do jogo de gamão ou de dama.
Os casos políticos eram nelas ventilados, analisados, discutidos e consertados os planos, enquanto (...) surgiam os planos para os conluios político-partidários. Dir-se-ia que elas bem sintetizavam a vida social da cidade. (...)

Antônio Fagundes
In O Vigário Bartolomeu (Traços Biográficos). Natal, 1976.




HISTÓRIA DA CIDADE DO NATAL

A Praça André de Albuquerque
Viu a cidade criança.
A Catedral sabe histórias
que nenhuma História conta.

Caminhos de buscar água
- rua Santo Antônio antiga.
Na margem verde do Baldo
Dorme a Santa Cruz da Bica.

Xarias e Canguleiros
Descansam no chão da História,
depois de tantas batalhas
e tantas perdidas glórias.

Itajubá, nas serestas,
incendiava o luar,
com seus versos delirantes
de vento leste e de mar.

Auta de Souza morrendo
na Avenida Rio Branco,
Lírio moreno, entre rosas
Sangüíneas e lírios brancos

Praieiras de Othoniel
tiritando na alvorada,
entre acordes e soluções
de violões em serenatas.

No velho Paço da Pátria,
de patrióticas feiras,
a manhã passa lenta
sobre as louças das louceiras.

O trem passando na ponte,
Sobre o rio Potengi.
Natal, perdi-me ou achei-me,
Depois que te conheci?

Os limites da cidade
eram quatro: balaustrada
de Petrópolis, Ribeira,
Alecrim, Tirol. Mais nada.

Na calçada do Rosário,
Cascudo e Sílvio Pedroza
colhiam o sol do crepúsculo
como alguém colhe uma rosa.

A cidade era uma Festa,
No Natal e no São João,
entre os sonhos a igualdade
De Djalma Maranhão

O bondinho do Tirol
Cochilava em cada esquina.
Numa delas, descobri
Teu sorriso de menina.

Depois, o tempo passou,
o bonde não voltou mais
não voltou mais a cidade
do meu tempo de rapaz.

Agora, a cidade antiga
cresce no tempo e no espaço
e o progresso a moderniza
a cada dia que passa.

Mas os sonhos continuam
os mesmos sonhos de outrora,
acalentando a esperança
que renasce a cada aurora.


Deífilo Gurgel
Natal – maio de 1989.
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Quarenta anos depois

Foi bonita a festa. Dos 25 alunos da turma de 65 da Faculdade de Direito de Natal, dois faltaram por motivos particulares e oito porque levados definitivamente pela Indesejada das Gentes. Revi colegas, amigos, amigas que eu não via desde o final do curso, ou desde 1968, quando me fui para o Rio de Janeiro, fugido e mal pago.

Uma tarde de mesa farta: comida para um batalhão de infantaria, bebida para saciar a sede de todos os freqüentadores do Beco da Lama e adjacências. Mas não foi isso o que mais me impressionou. Passando os olhos pela mesa animada, verifiquei que na minha turma de Direito não havia um só mau caráter, dela não saiu nenhum Josef Dirceu, nenhum juiz ou promotor desses que se vestem com a capa suja de Torquemada e usam o cargo para contrariar até as causas mais justas. Nenhum arrogante, dono da verdade, desses que têm a satisfação psicótica de perseguir, prejudicar, destruir.

Mas, tudo bem, deixemos que os Torquemadas continuem defendendo suas teses no círculo mais infernal do poeta Alighieri. Falemos da alegria do reencontro. Alegria de ver que todos os meus colegas se saíram bem na vida, uns ainda atuando em escritórios de advocacia, a maioria no bem-bom de confortáveis aposentadorias. Todos foram vitoriosos na carreira jurídica, com exceção de um aprendiz de poeta meio rebelde, meio maluco, que tentava afogar nos copos a angústia de ter casado aos 21 anos de idade, no 1º ano da faculdade, com uma mulher de quem nunca gostou. E olhe que a mulher não era rica, não era fácil e não tinha nenhum traço de Gisellinha Bündchen.

Bom, mas falemos de alegria. As colegas de turma estão ótimas – uma delas entrou para a Ordem das Carmelitas Descalças, sua vocação desde os tempos da faculdade. Está feliz, radiante. Outras estão casadas com os mesmos maridos há 40 anos e ainda acham graça, quer dizer, estão muito bem. Uma outra morou nos Estados Unidos, onde ensinou os ianques a fazer cuscuz, tapioca, grude e munguzá; passa as férias na Bélgica e qualquer dia quer casar de novo e morar na Austrália. Tem peito para isso. Ah, sim, havia uma musa vertical, bela, caicoense, cobiçada e inalcançável até nos meus sonhos mais ousados. Eu sempre quis erguer em sua homenagem uma estátua maior do que a de Augusto Severo, ela com um decote generoso e uma braçada de margaridas. Todos os dias, antes da chatice das aulas de Direito, eu beijaria o colo do monumento e acariciava as margaridas de bronze. Ah, a mulher cobiçada revelou na festa que só por timidez não devolvia os olhares com que os colegas da faculdade a bombardeavam minuto a minuto. E se soubesse que eu queria erguer uma estátua para ela, com certeza teria sorrisos e desejos voltados para mim. Essas palavras, ditas 40 anos depois, ainda conseguem alterar o meu ritmo cardíaco.

E mais não falarei. Apenas peço um minuto de silêncio em homenagem aos ausentes: Claudionor de Andrade Júnior, Gilka Farkat, João Cantídio, João Neto, Juvenal Barbosa, Maria Senhorinha, Pedro Camilo e Perceval Amorim. Todos, como no poema de Manuel Bandeira, dormindo profundamente.
Nei Leandro de Castro
Tribuna do Norte

por Alma do Beco | 7:21 AM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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