quarta-feira, junho 21, 2006

ALEGORIA DA VEZ

Marcus Ottoni


“O Brasil não pode ver a repetição do filme O Exterminador do Futuro no ano que vem.”
Deputado Roberto Freire



O TIRANETE E A ALEGORIA DA VEZ

"O pezinho de laranja que nós plantamos já não está apenas no brotinho: as laranjas já começaram a aparecer, já estão maduras, a gente já pode chupá-las. Muito mais do que chupá-las, a gente já pode distribuir essa laranja para uma parcela muito grande da população."
Lula

Traidor, não se poderia mesmo esperar um discurso revolucionário deste aprendiz de tiranete. Mas a alegoria da vez — pífia e medíocre como as demais — diz mais do que aparenta dizer: revela o ainda deslumbramento e a crença cega da origem messiânica do títere despótico — essa, a pior mistura: não tendo o novo para apresentar, arrima-se na falácia que lhe mandam (subliminarmente) dizer: toma-a para si, como se de si fosse e cega-se para o contraditório (por quê? Porque é vazio de Discurso — o “D” aqui, maiúsculo).

Mas, a alegoria. Fosse aquele que pensávamos, diria: “Plantamos a laranja; já madura, chupê-mo-la!”. Mas, não. O “nós” do déspota não inclui nós outros, cara pálida. O “nós” são (é) eles (ele). O individualismo mostra a sua cara aqui: “O pezinho de laranja que nós plantamos...” e desemboca na apropriação da coisa pública, aqui: “a gente já pode chupá-las...”, para cair (repare que, até então, o povaréu nem lhufas) no messianismo/paternalismo descarado:“a gente já pode distribuir essa laranja para...”. Ah, bom; agora, sim.

É esse o senhor que se aboleta no poder e quer dizer nossos destinos. Que arrota que não há nesse país ninguém mais ético do que ele. Alto lá, meu rei! Olhe primeiro para o vosso rabo! Repare no que faz os seus sob a sua complacência.

Falto de projetos (onde o Projeto para esse país? Alguém dá notícias de algo que se assemelhe a um PPA?), só lhe resta as inaugurações de pedras fundamentais. Obras para o devir — se vier.

Humilhando a escumalha, ao mesmo tempo em que dela recebe os louros, esmola-a com bolsas disso e daquilo, neologismos para as cestas básicas da Emergência de antanho.

E acha que é exemplo para o Mundo.

Onde as Reformas Estruturantes ? Estaria de bom grado apenas a “reforma” da Previdência — nada além do que um saque ao bolso do trabalhador, uma vez que as outras (Reformas Política e Tributária, principalmente; além da Trabalhista, Sindical, etc, prometidas), como diria um jornal argentino aborbando o futebol da Seleção Canarinha, “Fica pra próxima”?

Enquanto isso, temos que aturar o discurso alienado e alienante dos dois extremos, respectivamente: da choldra e da turma da boquinha. Sim, porque fora disso não há salvação: não há explicação plausível.

E segue o “Nosso Guia” na interminável cantilena desvirginante: “Nunca nesse país, etc, etc,”, ou: “Pela primeira vez nesse país, etc, etc...”. Cabral que se cuide.

O Partido que lhe sustenta (sustenta?), de lideranças degoladas pela corrupção, só não está na lama porque é a própria lama. Lama cercada de outras lamas, diga-se.

Antoniel Campos



Retirantes do Pajeú

O manto da noite faz sombras no sertão,
Acompanhado dum terrível vento forte,
Que mostra o véu da assustadora escuridão
E solta gritos parecidos com o da morte.
Sob um casebre construído de argamassa,
Mulheres magras, meditando, fazem prece,
Com temor da morte que por a porta passa,
Trazendo o medo que o candeeiro estremece.

Vendo, na tela do sertão, macabras cenas,
Velhas beatas rogam a Deus num só lamento,
Como se fossem condenadas Madalenas,
Derramam prantos, se afogando no tormento.
Mesmo de longe, são ouvidos os louvores,
Cheios de rezas, choros, súplica e oração,
Vendo o sol que já secou o "Pajeú das Flores"
E sugou toda a água que tinha no chão.

Assim que à noite com o véu desaparece
O "Rei do fogo" surge de forma inclemente.
E a escuridão perde a roupagem e fenece,
Para nascer o dia com o seu clima quente.
De longe, o vento traz um sórdido calor,
Dando impressão que vem do fundo dum vulcão,
Pra exalar sobre a terra um lúgubre ardor,
Num prenuncio que vai pegar fogo o Sertão.

O pajeusense ver murchar toda a esperança
Diante da cena que surge na alvorada,
E diz pra esposa que prepare a criança,
Pra começar, em breve a triste retirada.
Ergue o olhar, desfalecido e sem ter brilho,
Tendo, no corpo, pendurado um matulão,
No qual só tem como alimento para o filho,
A rapadura, a farinha e o feijão.

Da porta, ele olha pra lagoa calcinada,
Onde o cascalho se parece com uma brasa,
Fazendo crer que toda terra ressecada
Recebeu o forte calor que no inferno abrasa.
Sobre um curvado e ressequido umbuzeiro,
Um urubu, com paciência aguarda a morte
Do pajeusense, que parece um marmeleiro,
Quando outrora, foi um vaqueiro bravo e forte.

Sentada no banco, padecendo de miséria,
A sua esposa se parece com um graveto,
Que de tão magra, sente na frágil matéria,
O braço da morte, mostrando o traje preto.
O decaído seio, sem ter leite e mole,
Com aparência duma velha fruta murcha,
O qual, a magra filha lânguida se bole,
E, tremendo de fome, com os lábios puxa.

Mas, ao invés de encontrar leite, é o sangue
Que aparece do magro seio como alento,
Pra alimentar o esquálido corpo langue,
Que sente na alma profundíssimo tormento.
De coração seco e nos olhos a lágrima,
Sente um vazio no peito e na vista um véu,
Fazendo o íntimo sentir mórbida lástima,
E, dentro da boca, um amargoso fel.

Os pajeusenses partem, dando adeus a terra,
Tendo a saudade como a sua companhia,
E olham pro vale, pra campina e pra serra,
Vêem abutres que chegam pra vil profecia.
Uma criança fraca chora, bem baixinho,
Levada pela mãe, agarrada ao vestido,
Cambaleando sobre o tortuoso caminho,
Entre as juremas, sobre o solo ressequido.

Pela caatinga, não escutam a passarada,
Só os gemidos que ecoam no deserto,
Soprando sobre outra casa abandonada
Onde o fantasma da morte esteve perto.
Pelas estradas, xiquexiques, marmeleiros,
Mandacarus, coroa-de-frade e jurema
São parecidos com ignotos guerreiros,
Sobre a película dum estranho cinema.

Se arrastando, passam pelo leito do rio,
Onde existiam correntezas, em outras eras,
Que, esbravejando, enchiam secos baixios,
Com a voraz valentia de mil panteras.
Agora, só vêem esquálidos garranchos,
Cada um preso entre as brechas dum lajedo,
Tendo seus galhos estendidos como ganchos,
Parecendo homens condenados ao degredo

A infindável procissão dos retirantes
De pés descalços, sobre os duros carrascais,
Dá gritos de dores, de agruras e de ais;
Sofrendo quedas, andando cambaleantes.
Magras mulheres, pais famintos, tristes filhos,
Mostram a ausência duma Nação indiferente,
Que não enxerga os sertanejos maltrapilhos,
Onde o poder é um governo sempre ausente.

Sentindo a pele ressecada pelo o sol,
Os pajeusenses sofrem o peso do verão,
Onde a esperança é um cinzento arrebol
Anunciando uma vida de escuridão.
Ontem, aurora de velozes cavaleiros,
Que, na caatinga, laçavam o valente touro.
Hoje, crepúsculo de condenados vaqueiros,
Perseguidos pela morte, com seu agouro.

Só deixaram para trás decrépitas casas,
Onde brincava a criança enternecida,
Agora, só sentem a companhia das asas
Dos urubus, como uma lúgubre guarida.
Em vão, buscam encontrar algum aposento,
Mas só encontram algumas árvores nuas,
E, cabisbaixos num tristonho andar lento,
Vão mastigando amargosas raízes cruas.

De vez em quando, olham para o horizonte,
Dando mil passos, tortos e desconjuntados,
Mas só enxergam a sequidão atrás do monte,
E, lá em baixo, os descampados roçados.
O pai olha o filho que está magro de fome,
Tão desnutrido e fraco que o faz tremer,
E nem botou sequer um apelido ou nome
Porque sabe que em breve o filho irá morrer.

Ao lado da mãe, uma esquálida menina
Como um graveto duma árvore quando seca,
Que de tão fraca o pequenino corpo afina,
Conduz nos braços uma risonha boneca.
Para o humilde e confessionário brinquedo,
Fala baixinho, prometendo uma comida,
Na intimidade de um inocente segredo
Onde a esperança, no coração, é sentida.

Sob o sol, que derrama o raio abrasador,
A procissão, sem rumo, de magros famintos,
É cruelmente trespassada pela dor,
Numa confusa estrada, com mil labirintos.
Os pajeusenses olham as casas sem portas,
Por onde a fome já abriu cruéis caminhos,
E assistem um cenário de vacas mortas,
Caídas sobre carrascais, entre os espinhos.

A companhia, que a pobre família tem,
É uma nuvem de famintos urubus,
Que, parecidos com fantasmas, vêm do além,
Pra rondarem os magros corpos quase nus.
Gritos, revoltas, choros, dores, maldições,
Súplicas, rezas, ladainhas e lamentos,
Se misturam com longos prantos e orações,
Numa tragédia dantesca de mil tormentos.

Passando num vale, onde tinha uma fonte,
A procissão, fantasmagórica e sofrida,
Olha perdida, procurando um horizonte,
Onde, talvez, encontre algum traço de vida.
Mas só enxerga uma cinzenta sequidão
Sobre a planície, sobre o vale e sobre a serra,
Onde o ardente sol causticante do verão
Deixa uma marca de tragédia sobre a terra.

Os pajeusenses, com sede procuram água,
Mas encontram desertos e vazios poços,
Que inunda os corações com um rio de mágoa,
Secando as almas de corpos que só têm ossos.
Com as mãos, buscam água no chão ressequido,
Ouvindo som, que sai da agourenta acauã,
Que, sobre um toco, solta um funesto gemido,
Profetizando que a busca por água é vã.

Sem casa, sem terra, sem pátria ou nação,
A multidão de homem, mulher e menino,
Vai tropeçando nas pedras do seco chão,
Dando mil passos para um confuso destino.
A procissão dos famintos mostra um País
Que é tão grande, mas é dividido pra poucos;
Enquanto um grupo de ricos canta feliz,
A multidão de famintos chora como loucos.

Gilmar Leite



Professor Napoleão - VIII

Eu pensava sobre isso quando Serginho voltou a perguntar sobre a nossa História.

- Professor, e depois de Gaspar de Lemos, que registros históricos nós temos sobre a presença de europeus em terras potiguares?

- Registros, mesmo, não se tem. Sabe-se que franceses, holandeses e ingleses aqui aportavam e levavam grandes quantidades de pau-brasil, muito procurado na Europa, pois servia para tingir tecidos, dar cor às roupas das ricas cortes dos reinos europeus. Quando o Brasil foi loteado em capitanias, o Rio Grande do Norte era a maior delas, abrangendo terras hoje pertencentes a Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí, Maranhão e até uma parte do Pará. Mas os seus donatários nunca se preocuparam em colonizá-la devido a belicosidade dos índios potiguares, que viviam no litoral. Como os piratas chegavam para levar o pau-brasil e ir embora, sem demonstrar interesse na terra, os índios os tratavam bem e até os ajudavam no corte e transporte da madeira até os seus navios, em troca de qualquer bugiganga que os fizessem felizes. Os portugueses se sentiam os donos da terra e por isso tratavam os índios com desrespeito, querendo subjugá-los, maltratá-los, escravizá-los. É claro que eles reagiam e tornaram-se inimigos mortais dos portugueses. Tanto que eles, os portugueses, só começaram a habitar a terra quase cem anos após a descoberta de Cabral.

- Cem anos, professor? Indagou Thyago Cortez, espantado com tanto tempo.

- Cem anos, meu filho. Natal é uma cidade que nasceu cidade. Como era um ponto estratégico do litoral e os piratas viviam por aqui ameaçando a posse da terra, o então rei de Portugal e Espanha, Dom Felipe II, que era espanhol e herdara, por parentesco, também o trono de Portugal, deu a ordem de se construir um forte na foz do rio Grande, chamado de Potengi pelos nativos, para garantir a segurança da população que habitaria terras mais seguras, rio a dentro, elevadas, que lhe garantiria maior segurança.

- Onde professor, onde eram essas terras, em Macaíba? Perguntou Serginho pensando fazer alguma brincadeira com a cidade vizinha. Mas ninguém nem deu bolas para a referência que parecia gaiata. Napoleão, sério, sem perder o seu ritmo, simplesmente continuou:

- Vocês sabem onde fica a antiga Catedral, ali, na praça André de Albuquerque, na Cidade Alta?

- Ali, onde tem o Memorial Câmara Cascudo, professor? Perguntou Margarida, moradora da rua Santo Antônio, ali no centro, onde tem a Igreja do Galo.

- Sim, minha filha. Exatamente por ali. Em torno daquela área, foram construídas as primeiras casas de Natal, fundada em 25 de dezembro de 1599, e que, por isso, por ter sido fundada no dia em que se comemora o nascimento de Jesus Cristo, é que se chama Natal.

A aula já passava do tempo normal e ninguém percebera que o toque para a seguinte já havia sido dado havia cinco minutos.

Napoleão se despediu da turma prometendo voltar dali a dois dias, e se dirigiu para a 7ª D.

© Eduardo Alexandre

por Alma do Beco | 7:24 AM


Hugo Macedo©

Beco da Lama, o maior do mundo, tão grande que parece mais uma rua... Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.

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A imagem de fundo é do artista plástico e poeta Eduardo Alexandre©

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